Skip to content

BOI CORAÇÃO (*)

I

Meu São João, meu São João, nosso São João,
põe fora o cinza-escuro deste dia:
o mundo, a Ilha do Amor, o Maranhão
são cores, são cantos, são alegria!...

Que as nuvens de chumbo se tornem vida!
Que a vida seja em toadas e terreiros!
Zabumba, matraca, orquestra – a partida,
pra dança, o toque, o som, bens brasileiros.

O sol, ciclópico, abre seu imenso olho.
As casas, os prédios abrem janelas.
Gente em ruas e praças, saindo do molho
... E viva o bailado das índias belas!...

Penas e penachos, chapéus e fitas...
Máscaras, mulheres, homens, meninos...
Coisas, corpos dançam dança bonita
– e o boi baila e volteia, e os cantos são hinos...

Catirina, Pai Francisco, esta voz
é amor, é fé, esperança – força do coração.
O boi não morre porque vive em nós:
a ressurreição do boi é a nossa ressurreição.

II

Nuvens descolorem o dia e a noite.

O cinza-escuro espicha-se pelas ruas, espraia-se pela orla, invade as casas, escala os prédios e, sem bater, instala-se em nós.

Rostos se desbotam, chapéus e máscaras perdem luz e, com ela, a cor, o brilho.

Penas e fitas pendem e também perdem beleza, maciez.

Pernas não bailam, braços não se dão, troncos não coleiam, rostos não se tocam, olhares não se cruzam...

Mas eis que a luz novamente se faz.

De uma corda cardíaca extrai-se um acorde córdio que parecendo acalmar quer despertar para o baticum da vida. Som da vida. Ávida vida. Ave da vida.

Ao fundo, matracas anunciam a marcação dos passos devidos, entoam um ritmo de resistência. É a volta. É a vinda. É a vida.

O chapéu, como coroa solar, é minivulcão regurgitando cores, expelindo brilhos, convergindo olhares.

Agora tudo é movimento. Rostos riem. Mãos se dão. Braços abraçam. Olhos se olham. Passos em compasso. O boi volteia. Meneia. Negaceia. Faz que vai, e volta. Faz que volta, e vai.

E em um desses vais... não volta.

Pai Francisco não nega Catirina.

E pega do boi a língua.

Que nos diz que escuridão se acaba com cores.

Que o amor é a cura para as dores.

Que a vida está em um sorriso de criança.

E que tudo faz sentido e vale a pena – se houver esperança.

Esperança – trilha sonora da vida.

III

O cinza-escuro estava nas nuvens, estava nas ruas -- mas não era das nuvens, não era das ruas.

O silêncio da orla e até da onda do mar não era silêncio da orla, da onda, do mar.

A solidão das praças, a descor das faces fêmeas, o desbotamento dos olhos, o sem brilho dos chapéus, penas, fitas e máscaras não eram isolamento das pedras, mudez das gentes, desluz de adereços.

O não som dos tambores, o sem ruído das matracas, o sem zoeira, sem zunido e sem zum-zuns das vozes não eram calmas de instrumentos nem desfala de pessoas.

Tudo o que era lá fora era o que estava lá dentro. Dentro das pessoas dentro das casas. Dentro de nós.

Mas – fiat lux! – o Sol se faz dentro do ser. E o ser faz ter cores claras, cores lindas nos céus, companhia nas ruas, alvoroço nas praças, cores nas faces, barulho no mar, brilho no olhar, nas fitas e chapéus, nas penas e penachos.

E há som nas matracas, e bomba o bumbo, e ribomba o zabumba. E pessoas cantam e dançam. E pés passeiam, e bailam, e volteiam. E bumbuns bambas bambeiam.

O bumba meu boi vive porque vive no coração.

**

E mais u’a vez canto, bailado, encantamento;
se ouve, se vê, na praça, terreno, terreiro,
história, alma, humor, desejo, drama, tormento,
Catirina, Francisco – povo brasileiro.

* EDMILSON SANCHES

(*) Textos produzidos a convite do produtor musical Chiquinho França, de São Luís. A linha temática é o silêncio e a descoloração dos tempos pandêmicos de confinamento e o desejado futuro pós-pandemia, com o ressurgimento da alegria, dos sons, do canto, da dança, das cores – elementos presentes no bumba-boi.

A mostra competitiva do 48º Festival de Cinema de Gramado, na Serra Gaúcha, começa hoje (18), às 20h. Devido à pandemia da covid-19, o evento será realizado, pela primeira vez, de forma “on-line” e sem atividades presenciais.

As exibições vão até 26 de setembro, quando ocorrerá a cerimônia de premiação e a entrega do Kikito, estatueta que ficou conhecida nacionalmente como o “Oscar brasileiro”.

Os filmes serão exibidos pelo Canal Brasil e pela plataforma de “streaming” da emissora. Durante a semana, debates sobre os filmes que estão na disputa serão transmitidos pelas redes sociais oficiais do evento. A programação completa está disponível no “site” do festival.

Na primeira noite da mostra competitiva, serão exibidos os curtas “4 bilhões de Infinitos” e “Receita de Caranguejo”, além dos longas “Por que você não chora?” e “El silencio del cazador”, da Argentina.

Neste ano, serão homenageados os atores Marco Nanini e César Troncoso, a diretora Laís Bodanzky e a atriz Denise Fraga.

História

A primeira edição do festival foi realizada em janeiro de 1973, a partir da iniciativa entre a prefeitura local e a Embrafilme, antiga empresa pública de fomento ao cinema nacional.

O Kikito, estatueta que é entregue aos vencedores, foi desenvolvida pela artista gramadense Elizabeth Rosenfeld.

(Fonte: Agência Brasil)

Antes das luzes se acenderem e as câmeras ocuparem o estúdio, a ansiedade tomou conta. Será que aquilo iria dar certo? Experiência, os profissionais tinham de rádio. Agora, a novidade era outra. Não bastariam os sons. As imagens também seriam transmitidas ao vivo, um desafio que deixava artistas, apresentadores, jornalistas e técnicos à beira de um ataque de nervos. Não daria, em tese, para cortar. Mas, começar de novo (quantas vezes fossem necessárias). Tudo com a luz ligada e o coração à boca, como revelam os documentos e pesquisadores da história da televisão no Brasil.

O dia 18 de setembro, uma segunda-feira, entrou para a história brasileira como a data da primeira transmissão da TV Tupi, de iniciativa do empresário Assis Chateaubriand (Chatô), em São Paulo. Setenta anos depois, a primeira década, uma era de experimentação, improviso e muita paixão, deixou um legado que excede o pioneirismo. Uma época de valorização da efervescência cultural que o país experimentava. Era a maior emoção daquele ano quando as três câmeras acenderam as luzes para as palavras do ator Walter Forster: “Está no ar a PRF-3-TV Tupi de São Paulo, a primeira estação de televisão da América Latina”.

Uma história diferente começaria ali naquela noite.

“Quando chega, a televisão tem a seu favor toda a infraestrutura das rádios que já existiam. Os funcionários também tinham a experiência de produção”, afirma o professor Flávio Luiz Porto e Silva, pesquisador de história da televisão no Brasil. Ele explica que foi o amplo conhecimento dos profissionais de rádio que viabilizou a experiência da televisão no Brasil. Naquela noite e todos os outros dias que marcaram aquele início de experiência. “Eles vão aprender fazendo”, afirma o pesquisador.

A programação do dia da inauguração incluiu apresentações como da artista cubana Rayito de Sol, da orquestra de Georges Henri, um número do ator Amácio Mazzaropi, e outro de canto de Lia Marques, as notícias de política com o jornalista Maurício Loureiro e até uma celebração com a “Canção da TV”, cantada por Lolita Rodrigues e Vilma Bentivegna. Os versos da música eram do poeta Guilherme de Almeida (No teu chão, Piratininga / A cruz que Anchieta plantou: Pois dir-se-á que ela hoje acena / Por uma altíssima antena / Em que o Cruzeiro poisou / E te dá, num amuleto, O vermelho, o branco, o preto / Das contas do teu colar / E te mostra, num espelho / O preto, o branco, o vermelho / Das penas do teu cocar). Hebe Camargo, originalmente escalada para cantar o hino, ficou afônica. Foi um sucesso, apesar de uma das três câmeras não funcionar na hora da inauguração.

Na prática, a experiência do rádio viabilizou as imagens em movimento. Um rádio com imagens, como salienta o professor e pesquisador Laurindo Leal Filho. “A respeito ao conteúdo, a televisão, quase que deu continuidade ao que se fazia no rádio. Eu tenho escrito que a televisão no Brasil teve implementação diferente. Foi o teatro que influenciou bastante o início na Europa. Nos Estados Unidos, a TV apoiou-se no cinema”, explica.

“A televisão brasileira, na década de 50, teve um caráter de aventura, com o pioneirismo de seus profissionais desbravando os mistérios do novo veículo”, afirmou o professor Edgard Ribeiro Amorim no livro “História da TV Brasileira”. Ele explica que os primeiros anos foram marcados por uma “fase de aprendizagem” de como funcionaria aquela nova caixa mágica. Responsáveis pela parte técnica precisaram adquirir maior formação profissional na prática diante da novidade. Um tempo, aliás, sem recursos de buscas imediatas a outras referências, como ocorre no século XXI. No campo artístico, os profissionais tinham as práticas da época de rádio, cinema e teatro. “Os recursos técnicos eram poucos, com um equipamento mínimo para manter uma estação no ar”, pontua Amorim.

Uma característica dos trabalhadores brasileiros foi se multiplicar para dar conta do desafio que se apresentava. Entre um programa e outro, os radialistas da Rádio Tupi ocupavam o estúdio da recém-lançada PRF-3 TV Difusora, interpretavam cenas ao vivo e voltavam à sua função no rádio. Essa era a rotina de muitos pioneiros da televisão brasileira, que se iniciou em 1950. Xênia Bier, Alvaro de Moia, Vida Alves e tantos outros nomes dessa trajetória experimental da televisão brasileira já deixaram os palcos da vida.

E na rádio, os brasileiros já tinham os caminhos das ondas. Afinal, desde 1922, graças à iniciativa de Edgard Roquette-Pinto, artistas, jornalistas e outros profissionais conheciam o frio da barriga e a responsabilidade de entender o que era uma transmissão ao vivo. Até 1932, por exemplo, publicidade era proibida em rádio. Somente depois que o veículo se popularizou.

Quando a TV foi ao ar, um novo caminho se iniciava para uma moçada arrojada, já acostumada, por exemplo, em apresentações, jornalismo e radionovelas que encantavam a audiência. Segundo os pesquisadores entrevistados, havia empolgação, mas também dúvida do que a rádio se transformaria ou qual o tipo de impacto teria com a concorrente com imagens. O rádio já era realidade em 80% das casas brasileiras.

Quando a TV chegou ao país (depois da leva dos 200 primeiros aparelhos importados por Chateaubriand), o aparelho estava longe do acesso à população, tanto pelo alcance dos transmissores não irem além de 50 quilômetros, como pelo preço, de cerca de US$ 700. Ainda mais quando foi a própria televisão ter alguma popularização, principalmente depois de 1955. Conforme registra o professor Flávio Luiz Porto e Silva, um aparelho, no começo, custava o equivalente a 30 salários mínimos.

“Com o crescimento nas vendas e a possibilidade de crediário, o número de aparelhos foi crescendo. O próprio processo de popularização aumenta à medida que a década de 1950 avança. Quando chega 1959, o número de aparelhos já é muito grande. E esse número de aparelhos significa também audiência. Uma maior popularização vai ocorrer mesmo nos anos 60”, afirma o professor. No começo da década seguinte, já eram 700 mil aparelhos nas casas das pessoas. Era um tempo em que o vizinho ou familiar com televisão chamava a turma para dividir os cantinhos da sala.

As novelas nessa década já eram queridinhas da audiência. Entre o fim de 1951 e início do ano seguinte, “Sua Vida me Pertence”, com o galã Wálter Forster e a estrela Vida Alves, deixou o público curioso em frente ao novo aparelho. “A telenovela, apesar de constante no ar desde 1951, não tinha a duração nem a importância popular das atuais”, explica Edgard Amorim.

Nas artes, atores e cantores experimentaram, a partir de 1952, um momento singular de profusão cultural. O programa “TV de Vanguarda”, na Tupi, estreou no dia 17 de agosto (um domingo), como aponta o professor Flávio Porto. “Era o maior de todos os programas de teatro, que ia ao ar às 21h sempre com atraso e se estendia por duas, três horas e, às vezes, até avançava madrugada adentro. Este programa foi o grande laboratório da televisão”, afirma o pesquisador. Ele explica que produções dos principais nomes da dramaturgia mundial eram encenadas ao vivo pelos atores brasileiros, o que exigia uma “performance” e estudo inesgotável.

Os diretores inspiravam-se na estética cinematográfica para adequar o conteúdo. O diretor Cassiano Gabus Mendes foi um dos criadores com Dermeval Costa Lima. Dionísio Azevedo fazia também parte da direção de espetáculos de autores como Shakeaspeare e Dostoiévski. Em cena, o talento de atores como Bibi Ferreira, Vida Alves Fernanda Montenegro, Fernando Torres, Lima Duarte e Laura Cardoso. As imagens, claro, ainda em preto e branco carregaram novas cores ao público e à arte brasileira há 70 anos. A década deu um novo sentido ao “está no ar”.

(Fonte: Agência Brasil)

O Festival Favela em Casa oferece “on-line” e gratuitamente, a partir de hoje (18), em São Paulo, 30 apresentações de arte das favelas: música, dança, teatro, cinema e literatura, além de debates sobre a cultura nas regiões periféricas das cidades. O festival, que vai até o próximo dia 20, é realizado pelo Serviço Social do Comércio (Sesc).

Ao todo, mais de 180 pessoas participam do projeto, entre artistas, pensadores e equipes de produção e de apoio, em sua maioria moradores da periferia da Grande São Paulo. “Criamos um festival para ser gerenciado e produzido por uma equipe composta, majoritariamente, por pessoas periféricas, pretas e independentes, protagonistas e responsáveis pela condução da narrativa que queremos compartilhar”, disse uma das idealizadoras do Favela em Casa, Andressa Oliveira.

Entre os músicos que participarão estão Caue Gas, Emcee lê, Jota Pê, Os Ferrais, Marabu, Ôbigo, Tasha e Tracie, Red Lion, Bia Doxum, e Xote das Mina. No campo da literatura, estarão presentes Felipe Marinho, Kimani, Jessica Campos, Roberta Estrela D'Alva/Slam Blues; e na dança, Aline Constantino, Afrobreak, Babiy Quirino, Djalma Moura, Vanessa Soares, Keyson Idd e Débora Regi.

O festival ocorre na sexta e no sábado, das 19h às 23h e, no domingo, das 15h às 19h. As apresentações poderão ser vistas no Facebook Festival Favela em Casa, no canal Festival Favela em Casa no YouTube, e no Facebook do Sesc SP.

(Fonte: Agência Brasil)

**

Lembrando o dizer horaciano do primeiro século antes de Cristo, não é sem razão que as guerras são abominadas pelas mães. Claro, as guerras matam os filhos e filhas delas – e os irmãos uns dos outros, amigos, conhecidos e, sobretudo, desconhecidos, mas todos que nem nós, com direito a viver uma vida em paz e positiva.

Os números de guerra são assuntos com que trabalham, mais, estatísticos e belicistas. São números tão grandes que o escritor russo Ivan Bunin (1870-1953) arriscou-se a prever: “Milhões de homens tomam parte nas guerras atuais; daqui a pouco toda a Europa será povoada apenas de assassinos”.

Resta aos familiares e amigos dos mortos a dor, o choro, o luto, a saudade, a irresignação; e resta-nos a nós humanistas também dor solidária, a perplexidade, a não concordância, a indignação – e, quase sempre, a impotência, a incapacidade senão a impossibilidade de fazer algo que não seja a expressão de não aceitação da bestialidade humana, a não tolerância, transposta pela voz e pela escrita e por sadios atos de inconformação e rebeldia.

E, já que toda vida importa, independentemente da origem do conflito, do país estimulador ou invasor, ou se é guerra covarde, declarada, ou impensada, civil, vamos juntar os quase QUATROCENTOS MIL sírios. Vamos somar os africanos. Sim, os africanos; quem se lembra deles?

De 1995 a 2015, em “apenas” vinte anos de conflitos, na África só crianças mortas foram CINCO MILHÕES todas elas com, no máximo, CINCO anos de idade, e TRÊS MILHÕES delas com, no máximo, UM ANO de idade. É um morticínio, genocídio, são assassinatos e outros crimes sem fim, com violências que vão dos massacres, extermínio de comunidades e estupros em massa, seres humanos barbarizados e mortos com machados e facões, além da formação de exércitos de crianças, que mal podem com a arma que carregam. Só em um ano (2008), na chamada segunda Guerra do Congo, morreram, pelo menos, CINCO MILHÕES E QUATROCENTAS MIL pessoas, grande parte, senão a maior parte, da fome que os conflitos acentuam ainda mais. Em Ruanda, em três meses (abril, maio e junho) de 1994, foram mortas nada menos de OITOCENTAS MIL pessoas. Em Darfur, região do país Sudão, outros QUATROCENTOS MIL seres humanos foram mortos desde 2003. A África, mãe de todos os povos, é o ambiente de uma das mais sangrentas, violentas mortandades do planeta, as quais não despertam semelhante preocupação e furor na comunidade internacional, ante a menor importância econômica e geopolítica mundial de suas 54 nações.

O vale de lágrimas e sangue e pedaços de carnes e ossos das guerras já trucidaram de DUZENTOS E SESSENTA E DOIS MILHÕES, no mínimo, a SEISCENTOS E SESSENTA E CINCO MILHÕES, no limite, em apenas TRINTA guerras e conflitos entre nações ou internas, fratricidas – a guerra civil, lembrando o Marquês de Maricá, é quando uma nação inteira comete suicídio.

A diferença de ataques chamados terroristas para situações de guerra é que, com o horror que ambas as situações despertam em pessoas e delas se apossam, o primeiro caso tem como elemento de distinção a surpresa, o inesperado, o imprevisível. No estado de guerra, há uma previsibilidade, um anúncio, espécie de “permissão” para que tudo possa acontecer, inclusive com civis, por mais desiguais e covardes que sejam os atos dos diversos lados (citando apenas Pearl Habor, pelos japoneses; Hiroshima e Nagasaki, pelos norte-americanos).

Ao final de contas, repito o que escrevi há anos em meu livro “Do Incontido Orgulho de Ser Caxiense”:

**

– “Não se sintam desconfortáveis nem olhem para os lados, mas em volta de cada um de vocês gravitam 16 fantasmas.

É essa exatamente, segundo estudos demográficos internacionais acreditados, a quantidade de pessoas que já morreram para cada um dos 6 bilhões e 700 milhões [atualmente, segundo o WorldMeter, 7 bilhões 811 milhões] de seres humanos ainda vivos na face da Terra – entre os quais, nós. Já existiram cerca de 107 bilhões de pessoas no planeta [atualizando: já morreram 125 bilhões de seres humanos].

Cabe-me, senão por obrigação formal ao menos por praxe institucional, cabe-me, aqui, agora, dar visibilidade a um desses fantasmas, dar contorno a um grande espírito, falar de uma venturosa e aventureira alma. Evidentemente, nada a ver com sessão mediúnica ou tambores e terreiros – todos estes e tudo isto respeitadas manifestações de religião enquanto religação com os mundos etéreos, com os universos multidimensionais que nós, enquanto seres humanos, a eles ora buscamos (para superar a ignorância que é incompletude de conhecimento) ou deles ora desdenhamos – em nossa ignorância que é grosseria, egoísmo, incivilidade de sentimento”,

**

Triste, mais, é confirmar-se que, muitas das vezes, senão quase sempre, a origem primeira, a causa e coisa inicial de um conflito mortal está ligada a PODER e DINHEIRO (“Follow the Money”, dizem os promotores de Justiça americanos). Padre Antônio Vieira, atual, afirmava ser “a guerra aquele monstro que se sustenta das fazendas, do sangue, das vidas, e quanto mais come e consome, tanto menos se farta”.

E pensar que, no estourar dos morteiros (para citar só o armamento que desde o nome leva morte com ele), uma guerra quase sempre é decisão de só duas pessoas...

Uma lástima que, se a vida é curta demais para ser miúda, os belicistas escolham ou aplaudam exatamente a forma mais destruidora e desumana de todas para amiudá-la ainda mais.

Humanos, lobos – vorazes – de humanos...

Hobbes, citando Plauto, tem razão...

**

“Deve o mortal sensato detestar a guerra;
se ela todavia for inevitável,
os louros não serão de quem morrer lutando
por causa ignóbil, que afinal só traz desonra”.
(Eurípedes, século V antes de Cristo).

Aos mortos, Eurípedes, até os louros se lhes negam...

Aos mortos, as lágrimas.

Pelo menos.

Antes que nos sequemos todos...

* EDMILSON SANCHES

Foto do Museu de Imagens (Brasil): “Jan Rose Kasmir, uma jovem norte-americana, confronta a Guarda Nacional do lado de fora do Pentágono com uma flor nas mãos, durante uma marcha contrária à Guerra do Vietnã em 1967. Esse ato ajudou a colocar a opinião pública em desfavor da intervenção americana no Vietnã”.

Andréa Oliveira

O amor aos livros e ao conhecimento pode ajudar a vencer o ódio e a ignorância em tempos tão difíceis como os dias atuais. Esta é a aposta da jornalista e escritora Andréa Oliveira, que participa do bate-papo semanal do Inspire e Comunique na noite de hoje, às 19h30. A “live” realizada pelas jornalistas Franci Monteles e Yndara Vasques será transmitida pelo Instagram @franci_monteles.

Formada em Comunicação Social/Jornalismo pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e especializada em Jornalismo Cultural pela Pontifícia Universidade Católica de são Paulo (PUC-SP), Andréa Oliveira é apaixonada por jornalismo e literatura. Na “live”, ela falará de suas experiências em redações de jornais e revistas, como assessora de comunicação, escritora e, também, de seus projetos.

A escritora e jornalista já trabalhou nos jornais “O Estado do Maranhão” e no “Jornal da Tarde” (SP). Tem três livros publicados (“João do Vale – mais coragem do que homem”); “Nome aos bois – tragédia e comédia no bumba meu boi do Maranhão” e “João, o menino cantador” (biografia de João do Vale para crianças) e integra algumas coletâneas, como “Maranhão Reportagem” (Clara Editora) e “São Luís em palavras” (Aquarela Brasileira Livro).

Atualmente, Andréa Oliveira trabalha na Gerência de Comunicação da Empresa Maranhense de Administração Portuária (Emap) e concilia suas atividades como jornalista e assessora com a paixão pela literatura.

Em 2019, lançou o “Palavra Acesa”, um “talk-show” onde conversa com pessoas das mais diferentes áreas para falar sobre memórias e histórias de leitura. “Convido pessoas que têm em comum o amor aos livros. A ideia é acender uma chama. Em lugar do ódio e das armas, declaramos o amor aos livros e ao conhecimento como ferramenta para vencer a barbárie”, diz a escritora.

Serviço:
Live: Inspire e Comunique com a jornalista e escritora Andréa Oliveira
Quando: 17/9 (quinta-feira)
Hora: às 19h30
Onde: Instagram @franci_monteles

(Fonte: Assessoria de comunicação)

O prefeito de São Paulo, Bruno Covas, autorizou a retomada das aulas do ensino superior na cidade a partir do dia 7 de outubro. Nessa data, também poderão ser retomadas as atividades extracurriculares das escolas públicas e particulares.

Covas disse que a decisão foi tomada após avaliação da disseminação do novo coronavírus (covid-19) na capital paulista, que está sendo acompanhado por pesquisas com testagem da população. “Não tem mais sentido, com os dados que nós temos, continuar a proibir o ensino superior na cidade de São Paulo”, disse.

A volta às aulas nas faculdades e universidades deverá seguir as normas que foram estabelecidas no plano de flexibilização gradual da quarentena do governo estadual. “O ensino superior está muito mais relacionado ao ensino dos adultos. Nós temos um protocolo feito pelo governo do Estado de São Paulo para a retomada das aulas do ensino superior, respeitada a autonomia de cada universidade”, disse o prefeito.

A volta às aulas das escolas públicas e particulares ainda não tem data definida. O prefeito disse que está sendo avaliada a possibilidade de os estudantes voltarem à sala de aula a partir de 3 de novembro.

Contaminados

Foram divulgados, nesta quinta-feira (17), os resultados do inquérito sorológico que investigou a disseminação do coronavírus entre os estudantes das redes pública e privada. Na média, o estudo, que testou 6 mil alunos, aponta que 16,5% dos 1,5 milhão de estudantes matriculados em escolas na cidade já tiveram a doença, aproximadamente 244,2 mil jovens.

O estudo mostrou uma grande diferença entre a contaminação dos estudantes das redes públicas e privada. Entre os alunos da rede municipal, 18,4% já foram contaminados pelo vírus, e, na rede estadual, o percentual ficou em 17,2%. Porém, entre os que estudam nas escolas particulares, o índice de contato com o vírus é quase a metade, 9,7%.

O número de jovens que não apresentaram sintomas da doença, apesar de terem desenvolvido anticorpos contra o vírus, ficou em 70,3% entre os estudantes da rede privada de ensino. Para os estudantes da rede estadual, o percentual cai para 64,1%, e 66,4% na rede municipal.

Violência doméstica

O prefeito Covas disse ainda que, durante a quarentena, foram recebidas 5 mil informações de violência doméstica contra jovens em idade escolar. Por isso, serão abertas 14 mil vagas para atendimento socioemocional nos Centros para Crianças e Adolescentes.

(Fonte: Agência Brasil)

E OS PAIS, E A FAMÍLIA, COMO FICAM?

Sou desses homens tolos que se preocupam mais com os outros do que consigo mesmo. O advogado e escritor Ulisses de Azevedo Braga (“in memoriam”) escreveu uma vez: “– O Sanches é mais dos outros do que de si”. Pago um preço alto por isso... Mas vamos ao que interessa.

Toda vez que vejo ou leio uma notícia sobre um político corrupto, um bandido, um assassino, enfim, gente que, pelo visto, não presta, fico pensando nas vítimas que eles fazem e, também, penso muito nos pais desses marginais. Como fica uma mãe e que vergonha deve sentir um pai, os irmãos, filhos, familiares, amigos, colegas, vizinhos?!...

Sei que tem muita gente cínica, hipócrita, insensível, gente que acha que a vida é para “se dar bem” e os outros, que se... lasquem. É, tem gente assim porque o Diabo tem os deles (a Bíblia chega a dizer que o mundo é do Capiroto...).

Pois bem, insensibilidades e hipocrisias, cinismos e egoísmos à parte, os pais, filhos, irmãos e familiares e amigos VERDADEIROS, como ficam ante a repetida e repetitiva notícia (falada, impressa, visual) sobre uma bandidagem de alguém que é da família ou é / era do círculo de amizade?

Que vergonha sentem ao assistir ao noticiário e, toda vez que se refere, por exemplo, àquele político corrupto, a notícia vem acompanhada da gravação mostrando um homem pedindo dinheiro, ou correndo e carregando uma mala, olhando para os lados, culposamente? Como ficam? O que falam os pais e demais familiares, o que dizem os amigos, vizinhos, colegas e amigos de infância? Sentem vergonha também? Não sabem onde botam a cara, como se o malfeito tivesse acontecido com eles?

Fico pensando em pais e familiares de pessoas que não precisavam roubar, corromper ou ser corrompidas. Pessoas que não estavam passando necessidades, que não sabem o que é privação, que não têm carências primárias como grande parte – milhões – de brasileiros passam. Fico pensando na família Odebrecht e que vergonha não sentiria Emil Odebrecht, o engenheiro e cartógrafo que há 160 anos, em 1856, veio do Reino da Prússia para o Brasil (Blumenau, Santa Catarina) e aqui, até morrer em 1912, aos 76 anos, trabalhou infatigável, dura e arriscadamente e deu início à grande família empreendedora que, depois, iria para outros cantos do Brasil – incluindo-se o Marcelo Odebrecht, o jovem herdeiro de bilhões da construtora de seu pai, Emílio, e avô, Norberto, herdeiro que estudou na Suíça e hoje, há muito tempo, está na cadeia...

Fico pensando na família Batista, seja a do ramo dos moços Joesley e Wesley, os bilionários donos do Friboi e de tantos outros negócios, como as sandálias Havaianas, seja a família do igualmente rico (ainda) Eike Batista, cujo pai tem uma história até onde se sabe honrada em prol do país... Tem cabimento, em nome de quererem cada vez mais, esses moços – corruptos e corruptores – desonrarem pai, mãe, filhos, religião, história e a própria palavra e pose de gente séria e honesta que, certamente, propagandearam?

Fico pensando no Sérgio Cabral, o pai, jornalista, escritor, compositor e pesquisador brasileiro, muito querido no meio jornalístico e no seio dos grandes nomes da Música Popular Brasileira. Como é que o filho Sérgio Cabral herda o nome e despreza, em dado momento, as boas qualidades do pai, agora com longevos 80 anos de idade. O velho Sérgio Cabral foi um dos fundadores do famoso jornal “O Pasquim”. É autor de livros com biografias de valores musicais como Tom Jobim, Elizeth Cardoso e Pixinguinha. Em uma dessas maneiras certas de escrever por linhas tortas, Deus retirou um pouco do sofrimento possível de Sérgio Cabral pai: o velho Cabral está com mal de Alzheimer e não tem memória recente do filho e ex-governador do Rio de Janeiro, que estraçalhou a própria imagem e os cofres de seu Estado. A quem pergunta onde está o filho que recebeu seu nome, Sérgio Cabral, o velho, diz que Sérgio Filho morreu ainda criança... Meu Deus! Parece uma forma de o pai se esconder da vergonha que o filho lhe causou!... Seria trágico se não fosse tão dramático...

Por último – mas, infelizmente, não por fim –, fico pensando no Sr. Rodrigo Costa da Rocha Loures. Ele mesmo, pai de Rodrigo Santos da Rocha Loures, o “deputado federal da mala com propina de 500 mil reais”.

Conheci o Sr. Rodrigo Costa Loures, o pai. A cada ano, eu ia a Curitiba (PR) para a Conferência Internacional Cidades Inovadoras (Cici), promovida pela Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep) em sua grande, ecológica e agradável sede. A Cici reunia, anualmente, 4 mil prefeitos e outros gestores, além de técnicos e outros estudiosos do mundo inteiro para tratar de soluções já adotadas em muitas cidades do planeta e propor alternativas para a qualidade e sustentabilidade das cidades. A Fiep e a própria Cici eram presididas pelo Sr. Rodrigo Loures, o pai.

Em função de minha participação e das intervenções nos muitos debates que se realizavam ali na Fiep/Cici, anualmente, durante uma semana, fui alcançado pelo engenheiro João, assessor do presidente da Fiep, e fui convidado a ir até o gabinete da presidência da entidade. Claro, eu já tinha visto e ouvido o Rodrigo Loures pai. Pelos discursos que fazia, pela história empresarial que tem, pela família tradicional paranaense de que descende, via-se que o velho Rodrigo Loures é uma dessas raridades empresariais que acredita e prega a Ética, a Visão Holística, a Sustentabilidade, o não egoísmo etc. etc.

Conversei longamente com Rodrigo Loures pai. Deixei, com ele, um exemplar da “Enciclopédia de Imperatriz”. Ele, confirmando ser um ser humano sensível, aproveitou para agradecer aos “irmãos de Imperatriz”, pois, disse ele, a cidade maranhense era o "portão de entrada" e a referência de uma região que estava acolhendo muitos dos conterrâneos dele, paranaenses, sulistas e sudestinos, sobretudo para o cultivo de grãos (soja, em especial). Falamos de coisas que são coisas de que normalmente não se fala nas rodas de conversa de hoje (muita gente preocupada só consigo mesma, com seus negócios, com suas "coisas", e que nada fazem para agregar algo de novo coletivamente).

Claro que fico pensando sobretudo nos milhões de pais, famílias e pessoas brasileiros que foram e são prejudicados pelas ações deletérias desses políticos e empresários e gestores públicos.

Fico pensando em como Educação e Saúde teriam qualidade se os políticos e governantes brasileiros também tivessem.

Fico pensando como Ciência e Tecnologia, Cultura e Esporte se desenvolveriam se o jogo desses malandros não fosse a cultura do Mal, do amor pelo dinheiro e pelo poder.

Fico pensando no sadio crescimento da Economia e do Desenvolvimento, com geração de empregos e tudo, se esses bandidos não empregassem parte de seu tempo, talento e outros recursos só planejando – e realizando – modos de se locupletarem, de terem cada vez mais.

Volto a pensar no Seu Rodrigo Loures, pai do deputado “da mala”. Pelo pouco que conheci dele (e nem quero imaginar que estou enganado) antevejo o velho Rodrigo sofrendo isolada ou explicitamente. Imagino-lhe a vergonha. O de como é mais difícil encarar a sociedade de que ele é filho e formador. Imagino o quanto ele pode estar pensando no paradoxo, na sensaboria, nos contrastes entre o que ele, idealista, pregava para cerca de 4 mil pessoas idealistas que, ano a ano, atendia a seu convite para discutirem pessoas e mundo melhores durante uma semana inteira, de manhã, à tarde e à noite.

Claro que, talvez (e não torço por isso), os pais, a família, os demais familiares, os amigos, vizinhos, colegas de infância podem até não sentir nada. Podem dizer que é um mal-entendido. Intriga da oposição. Jogo de poder. “Coisa” do Ministério Público”. “Frescura” da política. Armação da Polícia. Exagero da Justiça.

Podem dizer isso e mais. Mas nunca dirão tudo. E aqui é onde se inclui aquele momento, onde um pai, uma mãe, por exemplo, na solidão de seus pensamentos, individualmente se perguntam onde erraram, o que fizeram, por que isso aconteceu.

Esses pais sabem que fizeram o possível por aquele bebê fofinho, aquela criança peralta, brincalhona, estudiosa; sabem que deram para ela exemplo e oportunidades. Criaram o filho para o Bem – e poderia ser diferente? Então, por que será que os filhos se desviaram, por que viraram bandidos, corruptos, por que não pensaram nos pais quando decidiram cometer seus pecados penais?

Tantas perguntas... Aí, então, sem resposta, esse pai, essa mãe, com a alma contorcida de amor e dor, na solidão de um quarto ou um canto semiescuro, viram o rosto para cima buscando ar e, depois, sob o peso da dor, pendem a cabeça e facilitam, por gravidade, o caminho – e o cair – das lágrimas.

Esse pai, essa mãe... choram.

**

Todo filho é culpado do bem que, podendo fazer aos seus pais, não fez.

* EDMILSON SANCHES

Ilustração:
Homem velho em tristeza (pintura de Van Gogh, de 1890).

O Ministério da Educação (MEC) publicou nesta quarta-feira (16), no “Diário Oficial da União”, as regras para a ocupação de vagas remanescentes do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) para o segundo semestre de 2020. O número de financiamentos oferecidos, prazos e procedimentos para inscrição dos candidatos ainda serão anunciados pelo MEC.

No mês passado, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, adiantou que serão 50 mil vagas remanescentes para o Fies. As vagas remanescentes são aquelas que não foram ocupadas no decorrer do processo seletivo regular, por desistência dos candidatos pré-selecionados ou falta de documentação na contratação do financiamento, por exemplo.

Quando estiverem abertas, as inscrições, serão realizadas por meio da página do Fies, onde os estudantes também poderão conferir o cronograma do processo seletivo.

O Fies é o programa do governo federal que tem o objetivo de facilitar o acesso ao crédito para financiamento de cursos de ensino superior oferecidos por instituições privadas. Criado em 1999, o programa é ofertado em duas modalidades, desde 2018, por meio do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e do Programa de Financiamento Estudantil (P-Fies).

O primeiro é operado pelo governo federal, sem incidência de juros, para estudantes que têm renda familiar de até três salários mínimos por pessoa; o percentual máximo do valor do curso financiado é definido de acordo com a renda familiar e os encargos educacionais cobrados pelas instituições de ensino. Já o P-Fies funciona com recursos dos fundos constitucionais e dos bancos privados participantes, o que implica cobrança de juros.

(Fonte: Agência Brasil)

Chegou a quarta-feira... E, para incentivar e despertar interesse pela leitura de textos, o BLOG DO PAUTAR abre espaço para o projeto LITERATURA MARANHENSE... Aproveite... Boa leitura!

PREFÁCIO

(Ao livro “Águas que Transportam Sonhos”, do professor e ex-militar da Marinha Ilnamar Felizardo Mourão)

**

Há biografias que mais escondem que revelam e há biografias que surpreendem e comovem. Aquelas podem até ser descartável diversão; estas, necessária reflexão.

A partir do título – “Águas que Transportam Sonhos” –, este livro de Ilnamar Felizardo Mourão é atestado e testemunho de superação.

Ilnamar Mourão tinha tudo para dar errado na vida: pobre, ribeirinho, sem pai, moradia precária, interior do Maranhão.

Ilnamar Mourão tinha tudo para dar certo na vida: irmãos unidos; mãe esforçada, trabalhadora, ciosa do amor e cuidados com os filhos; e um desejo dele – sabe-se lá vindo de onde – de ir além.

E ele foi além. Além de Imperatriz, além do Maranhão, viajou para os aléns do Brasil.

De menino a marinheiro, de nadador do Tocantins a navegador do Atlântico, de pixote com dificuldade de aprender as letras a professor com facilidade de ensinar números, Ilnamar Mourão escreveu sua história nas águas e a partir delas. Mais do que transportar sonhos, elas – líquidas e certas – lhe trouxeram concretude.

O Rio Tocantins desaguou um menino ansioso e frágil no Oceano Atlântico e este retornou um cidadão consciente e forte. E agradecido. Agradecido pela transformação lenta e segura que se processou no professor Ilnamar, a partir do menino malino, passando pelo marinheiro militar e solidificando-se no mestre militante.

Da nascente ao estuário, da cabeceira à embocadura, da fonte à foz, um bom exemplo do que podem fazer de bom a vida nas águas e as águas da vida. Pois, nas palavras de Shakespeare pela boca de Shylock no primeiro ato de “O Mercador de Veneza”, “os navios são apenas tábuas; os marinheiros, homens” (“ships are but boards, sailors but men (...)”).

**

Ilnamar Mourão escreve com a autoridade de quem é o maior conhecedor de sua própria vida. Seu livro não é para “pagar embuste” (contar vantagem, na linguagem marinheira). Mesmo passagens duras e difíceis não foram escamoteadas. Ao contrário, sem afetação nem academismos, foram trazidas e traduzidas em palavras diretas – como os vícios do pai, a separação do casal, as posteriores dificuldades materiais.

Muito antes de conhecer navios, Ilnamar já sabia o que era um mar... de dificuldades. Novas ondas assim não o mareariam mais. Como advertia Pietro Metastasio, escritor e poeta italiano do século XVIII, “não se faça ao mar quem teme o vento”. Desse mister o autor paraense entende, já que se fez homem embalado por águas e ventos oceânicos.

Menos pelo como está escrito e muito mais pelo que está escrito, este livro, repita-se, é um registro de superação, uma certidão de (re)nascimento humano. Seu autor sabe o que é tornar dificuldade em possibilidade, necessidade em oportunidade. Em certas pessoas, pessoas do bem, os problemas são transformados em equações e, estas, em soluções. E não é porque o autor seja professor de Matemática e Física..

**

Muito da infância do autor é característico de infâncias muitas do hinterlão maranhense: a casa humilde, de piso de barro batido (que, para evitar ou diminuir a poeira, eu na meninice tinha de “aguar” para varrer – ou barrer, como acertadamente também se dizia); a bilheira e seu pote; a lamparina (para subir a claridade, à noite) e a boia de câmara de ar (para descer o rio, de dia)...

Na escolinha também humildezinha, a cartilha de ABC e a tabuada, a palmatória e a palmatoada (os “bolos”, que se davam e se recebiam, dependendo do acerto das contas, dos exercícios de silabação).

“Águas que transportam sonhos” pode transportar muitos leitores para autorreencontros. Encontros com o passado infante e lutas adultas, com as certezas enfáticas e as dúvidas esperançosas.

Ilnamar Mourão soube, na Marinha, aproveitar o melhor, e sabe, no Magistério, dar o melhor. Seu livro é sua vida até agora.

De menino do rio a homem do mar.

Do militar que manobra o fuzil ao mestre que manuseia o giz.

Da continência ao conteúdo.

Da bala à fala.

Da arma (com sua munição) à armadura (da Educação).

A arma dispara. A Educação, protege.

Parabéns, Ilnamar. Professor. Protetor.

* EDMILSON SANCHES