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Hitler no Maranhão e o monstro de Guimarães*

Recebi do meu querido amigo Joaquim Itapary, pelas festas de um Natal já longe, com fraternal dedicatória, o livro “Hitler no Maranhão e o monstro de Guimarães”, publicado pelas edições da Academia Maranhense de Letras.

Confesso que a prosa de Joaquim Itapary me encanta pela sua magia, o que me fez, de logo, afoitar-me para este seu texto e lê-lo de um trago como se diz, e a fazer essas reflexões: todos nós, nascidos e vivido a infância nesse cenário de guerra, ouvíamos de nossos pais, professores e dos mais velhos, as terríveis histórias dessa guerra [1939-45], bombardeios, tomadas de cidades, campos de concentração... Tudo isso ficou no nosso imaginário, bem como aqueles símbolos diabólicos, cruz de ferro, SS, suástica, etc., Dentro dessa paisagem de horror, críamos, com certeza, que tudo vindo de Hitler poderia ser possível acontecer... Até ficção!

Com os traços dessas linhas, sinceramente, esse livro de Joaquim Itapary nos coloca em dúvida, se é realmente uma ficção, devido ao que acabei de dizer e se é apenas produto do seu grande talento criativo... Sabe-se que Hitler, de um simples aprendiz de pintor, numa Áustria culta e artística, envolta nos misteriosos bosques de Viena, chegou a Ministro do III Reich, para depois ser castigado dolorosamente pela sua própria insânia, vendo transformar-se em cinzas seu projeto “Mein Kampf” [Minha Luta], para depois ser fulminado pela lástima, a cometer ambicídio com Eva, com a ingestão de “cianureto de potássio”, nos subterrâneos da Chancelaria... Diante de tudo isso, nada mais se sabe o que pode ser real ou ficção!

Sobre esse assunto, diz o jornalista crítico de arte Salomão Rovedo, em “A Beira do Abismo”, belíssima apresentação do livro, “Hitler no Maranhão e o monstro de Guimarães”, de que “tudo é invenção e tudo também é verdade”.

E foi aqui, pelo que se sabe, numa noite de luar de agosto que, de repente, e não mais que de repente, entrou pela Baía de Cumã uma enorme cobra submersa que deixava às vistas, nas lâminas d’água, dos que juram que viram, fortes escamas como se de um lombo de uma enorme serpente... Nascia aí para os pescadores, o monstro de Guimarães, e para a História, o mistério, comprovado por fotografias de hidroavião.

Essa enorme serpente vista, nada mais era do que um submarino alemão, o famoso U-99 que partira do porto de Cuxhaven, a 100 quilômetros a Oeste de Hamburgo, sob o comando do Capitão Hans Kurt Öyster, um militar discreto e de alta confiança, encarregado de manter o Führer e sua mulher, Eva Brow, isolados em lugar seguro e desconhecido, num daqueles arrepios da guerra, como enredo de uma história fantástica, vez que estavam fugindo de um atentado em Berlim, deslindado pelo notável historiador Heine Krügger, decano da “Leipzig Universität” que num artigo na revista alemã “Der Spiegel” informa que, “ em 20 de julho de 1944, um grupo denominado ‘Círculo de Kreisan’, liderado pelo conde Von Moltke, contrário ao nazismo, perpetra um atentado à vida de Adolf Hitler. Houve o atentado e o almirante Karl-Jesco Von Puttkamer foi gravemente ferido, sendo o ditador advertido pelo ‘Sichereitsdienst’ [Serviço de Segurança], que havia fortes possibilidades de que novos atentados ocorreriam. Foi assim e por isso que Adolf Hitler e Eva Brow chegaram ao Maranhão, quem suspeitaria?”

Soube-se depois também que o U-99 passou pela Linha do Equador, adentrando o Hemisfério Sul às 22 horas do dia 3 de agosto de 1944, estacionando no dia seguinte ao meio-dia a 2° 07’ 57 de Lat. S e 44° 36’ 04 de Long. W – Coordenadas geográficas de Guimarães, no Maranhão, Brasil, segundo dados do diário de bordo, manuseado pelo venerando historiador Heine Krügger, de Leipzig, tendo o submarino ficado parado um tempão no lugar chamado ‘Guarita’, defronte da ‘Boca do Rio Pericumã’, registros estes comprovados pelas cartas náuticas da Capitania dos Portos de São Luís.

Pois bem, à noite de 4 de agosto daquele ano da graça de 1944, o casal de psicopatas [Adolf e Eva], longe dos olhos do mundo [?] e da tripulação foi visto a tomar banhos de mar, talvez comparando a beleza e as temperaturas das águas de Cumã com as do Báltico... E os dois brincavam como crianças inocentes, enquanto o sargento da Armada Klauss Shöenner, que falava um pouquinho de português, negociava com o pescador José Inácio Coutinho e com um outro conhecido por João Pontes que, com seu barco ‘Nazaré’, levavam mantimentos de boca para a tripulação alemã, alimentos como camarões e peixe seco, ovos, açúcar, mel, feijão, enfim, acepipes, e mais doces e frutas da terra, como cajus e cocos, e mais água potável, para variar com o que estava estocado no submarino ali escondido do mundo; da velha Europa, dos Estados Unidos e do Japão que pegava fogo...

De fato “há mistérios no universo, incógnitas tão grandes e desafiadoras que nosso imaginário leva ao desconhecimento e não logra sondá-los ou conhecê-los”, diz Itapary, talvez em dúvida do que estivesse escrito, se era mentira ou verdade, o que também se pergunta Salomão Rovedo... Se era ficção ou realidade, ambas foram geniais, ou no mundo real, ou no mundo de polichinelo...

Eu, ao ler o livro e a rascunhar estes apontamentos, confesso também a minha enorme dúvida, sem saber se estou a escrever sobre um fato real ou se um sonho em cores. Só sei dizer que a história é cheia de aventuras e de romantismos, e as provas de sua veridicidade são incontestáveis... E agora?

Fica aqui, portanto, a “certeza da dúvida” com o jornalista e escritor Benedito Buzar ao confessar depois ao autor: “Melhor do que você fez, só dinheiro achado!”

Sintonizado com o ditado de que “matos têm olhos e paredes têm ouvidos”, o escritor Joaquim Itapary, autor do livro, aproveitando os dias de folga de um período de Carnaval, foi à cidade de Alcântara, onde vivia [ou vive] o médico Airton Viegas, seu ex-colega de colégio, e ex-prefeito da cidade, já sendo esperado em casa deste, pelo mateiro Benedito Leodônio Leite, alcunhado por “Zé Pato”, para levá-lo até a Vila de “Urubuoca”, uma ilhota a três léguas de Alcântara, onde residia a professora aposentada Afonsina Goulart Coutinho, filha do pescador Inácio Coutinho, aquele que era intermediado pelo sargento da armada, o marujo que falava um pouquinho de português... Joaquim Itapary, nas muitas conversas [todas gravadas] que teve com Afonsina, nesse retiro do Carnaval, tomou conhecimento dos presentes que foram dados ao pescador, como uma pistola “Luger”, um fuzil “Mauser”, um par de binóculos, caixas de biscoitos, várias fotografias, pulseiras com símbolos nazistas e bilhetes de agradecimentos de Eva Brown que falava em nome de Hitler e de toda a tripulação, traduzidos ali, para Afonsina, por ele, Itapary, graças ao tanto de alemão que aprendera com o professor Germano, o misterioso mestre do tabocal... E a professora aposentada Afonsina Coutinho, depois de toda essa conversa investigativa que ambos encetaram durante sua temporada ali, despediu-se do escritor Joaquim Itapary, dizendo: “Doutor Itapary pode ficar certo da verdade que lhe contei, e escrever sem susto, que o casal Adolf Hitler e Eva Brown tomava banho à noite nas águas mornas da praia da Baía de Cumã...”

Pelo que vimos, o exposto vem a dar azo, naturalmente, de que tudo pode acontecer numa fresca madrugada.

* Fernando Braga, in “Conversas Vadias” [Toda prosa], antologia de textos do autor.

Ilustração:
Capa do livro comentado e foto de Joaquim Itapary.