Skip to content

LEMBRANÇAS…*

Na efervescência daquele decênio de luz [lê-se 1960], apareceu o movimento literário Academia Maranhense dos Novos (Amano), composta por Carlos Cunha, Fernando Sá Vale, Américo Azevedo Neto, José Maria Nascimento, Marconi Caldas, Murilo Sarney, Edson Vidigal e Fernando Braga....

Discutíamos nossos projetos editoriais para o futuro, declamávamos poemas nossos e dos outros, a trocar ideias sobre os últimos livros lidos ou ainda em leitura. A exemplo do Cenáculo Graça Aranha fundado pela juventude maranhense de 30, pelo Grupo Ilha e pelo Centro Cultural Gonçalves Dias, já submetidos a um estudo socioliterário pelo nosso ensaísta Rossini Corrêa, em seu fantástico livro “O Modernismo no Maranhão”, São Luís, UFMA, 1982. 108 p.

Nesse meio tempo, acontecia, em São Luís, a “Exposição Eleuteriana”, nome em homenagem ao mecenas português Eleutério da Silva Valério, fundador do Teatro União, depois São Luís e hoje Artur Azevedo. Essa exposição foi uma criação imortal do professor, poeta, historiador e grande animador cultural Carlos Cunha, um movimento sem precedentes na História Literária do Maranhão.

**

A seguir... Artigo de José Chagas – “Vá à Exposição”, “Jornal do Dia”, 15/7/67.

Quero hoje pedir aos meus leitores que façam uma visita ao “hall” do Teatro Artur Azevedo, onde foi, anteontem, inaugurada uma exposição de arte e que, sem dúvida nenhuma, constitui um dos fatos mais importantes para nossa vida cultural. Começa por ser algo diferente de tudo quanto já se fez aqui no Maranhão nestes últimos anos. Qualquer coisa que vale a pena ver, não apenas por curiosidade, mas para sentir de perto a verdade clara de que uma nova mentalidade congraça todos os intelectuais da terra, para um movimento digno de situar-se no plano de nossas melhores tradições.

A exposição que já agora tomou o nome de “eleuteriana”, o que, no caso, significa conciliação, harmonia, uma homenagem ao fundador do Teatro União, que hoje se chama Teatro Artur Azevedo. O português Eleutério da Silva Varela é o homenageado. Evocando a figura quase nunca lembrada desse luso empreendedor, e, ao mesmo tempo, o velho nome do teatro que ele fundou, os nossos artistas procuram, assim, buscar, no passado, inspiração e estimulo para as suas manifestações atuais. E por isso, pondo de parte escolas e pontos de vista diferentes, deixando de lado as divergências improdutivas, uniram-se agora, naquele mesmo teatro, velhos e novos, passadistas e modernistas, acadêmicos e não acadêmicos, todos sob o empenho de corporificar o espírito de nossa gente, dando forma definida ao conjunto de nossas atividades tão dispersas antes.

Que ninguém deixe de visitar a exposição onde poetas de todas as escolas, pintores de correntes diversas, escultores em madeira e em gesso, estão ao alcance do povo, que tem, agora, feliz oportunidade de contemplar, de uma só vez, os nossos principais artistas e ter uma ideia bem aproximada do que se está fazendo em São Luis, dentro do setor cultural.

Lá, você terá poesias de Assis Garrido, de Fernando Viana, de Paulo Nascimento Moraes, de Bernardo Coelho de Almeida, de Nascimento Moraes Filho, de Arlete Nogueira da Cruz, de Antônio Almeida, de Nauro Machado, de Jomar Moraes, de José Maria Nascimento, de Carlos Cunha, o idealizador da exposição, de Bandeira Tribuzi, de Jamerson Lemos, de Fernando Braga, de Américo Azevedo Neto e muitos outros entre os quais também estou.

Lá, você verá as esculturas em gesso do garoto Santos Neto, uma revelação, e as esculturas em madeira do nosso já conhecido Luís Carlos Santos, que, desta vez, se apresenta com esplêndidos trabalhos.

Lá, você verá a pintura de Garcês, surpreendentemente evoluída, numa prova de que o moço reafirma o seu talento já demonstrado numa exposição outra realizada neste ano, e também verá a pintura de Virgínia Eftimie, artista romena, que se acha em São Luís, há mais de seis anos, e só agora encontrou ambiente para chegar ao conhecimento de todos nós. Ela está prestigiando, com seu talento, a exposição e é uma descoberta de Maia Ramos, que, desta vez, expõe trabalhos em raízes, diante dos quais você terá ensejo de deleitar-se com verdadeiros achados, autênticas maravilhas de formas a que a sensibilidade do artista soube tão bem dar vida. E, coroando a exposição, você encontrará o talento maior de Antônio Almeida, apresentando, ali, alguns desenhos cuja expressividade artística e verdade estético-formal revelam, mais uma vez, a consciência absoluta do pintor mais seguro que São Luís tem atualmente. Os desenhos são esboço de um painel que Almeida está pintando em um dos nossos bancos.

Todos esses artistas estão à sua espera. Vá. Não custa nada. O teatro está aberto para você até quinta-feira.

**

Nesses apontamentos, o poeta Bandeira Tribuzi, em sua Coluna “Assim é, se lhe Parece!”, no “Jornal do Dia”, de 16 de julho de 1967, fala sobre os jovens talentos do Maranhão que expunham seus trabalhos na chamada “Exposição Eleuteriana”. Leia...

Note-se: não estou aqui comentando os artistas consagrados. Note-se: não estou, com isso, querendo dizer que os artistas consagrados não estejam bem representados. Penso, porém, que, quem já está consagrado menos precisa de encômios. E mesmo que iria eu aqui acrescentar a um José Chagas, um Nauro Machado, um Antônio Almeida?

Falo dos “novos” assim entendendo os que, há menos tempo, estão participando da vida intelectual e artística. Maia Ramos, por exemplo, que já se constituíra excelente surpresa na recente mostra coletiva, revelando um mundo de alegre cor em mistura sutil de inocência e malícia, volta agora e sobretudo com suas raízes-esculturas e consegue coisa de grande beleza e vigor.

Os escultores Luís Carlos e Santos Neto expõem trabalhos que merecem observação demorada, sobretudo o primeiro que está aprimorando rapidamente sua capacidade e já chegou a algumas formas bem modernas e puras. São aristas de inquestionável vocação, jovens ainda e com um extraordinário futuro.

Dois poetas, igualmente jovens, comparecem com boa poesia a revelar não apenas sensibilidade aguçada, mas até mesmo bom domínio do artesanato poético: Fernando Braga e Azevedo Neto.

Mas é, sobretudo para o exuberante talento de Antônio Garcez que desejo chamar a atenção. Participou ele, recentemente, da mostra coletiva de pintura e ali misturara, ao lado de exercícios bastante acadêmicos, experiências novas e pessoais que indicavam a abertura para o pintor, de um novo caminho. Chegou a ele já como se vê agora: perspicácia no uso da cor, coragem na modelação das formas, dando a seus trabalhos marcante plasticidade. É, sem dúvida, extraordinária vocação.

Estou certo de que todos estes nomes darão muito que falar no futuro.

**

Ainda sobre a “Exposição Eleuteriana”, Paulo Nascimento Moraes, no “Jornal do Dia”, de 23 de julho de 1967, voltava ao assunto. Leia...

Carlos Cunha leva, para o “hall” do Artur Azevedo (fato inédito na vida artística da cidade), uma admirável exposição de arte que honra e dignifica as nossas tradições de cultura e inteligência. O demolidor do histórico milagre teve como pretensão: demolir, por alguns instantes, as igrejinhas e unir os intelectuais e crucificá-los em painéis e paredes da nossa tradicionalíssima casa de espetáculos. E a exposição que já conquistou o nome de eleuteriana, pois ela significa uma homenagem ao fundador do Teatro União, hoje Artur Azevedo, o português Eleutério da Silva Varela, motivo e causa da realização da referida amostra de arte. A exposição marcou um acontecimento importante na vida artística e social da cidade.

E é preciso agora que o povo e que a sociedade prestigie a Exposição com suas presenças, visitando-a, tonando conhecimento da presença dos intelectuais e dos artistas maranhenses que lá estão com seus quadros e com suas produções poéticas. Sim. Isto é preciso. Que o povo vá ao Teatro Artur Azevedo e, lá, encontrará as poesias de José Nascimento Moraes Filho, de Arlete Nogueira da Cruz, de Nauro Machado, de José Maria Nascimento, de Lauro Leite Filho, de Carlos Cunha, de Fernando Braga e de tantos outros. Lá, encontrarão os artistas do pincel, trabalhos admiráveis, todos numa exaltação do que há em nossa terra, da grandeza intelectual, como Antônio Almeida, Ambrósio Amorim, Newton Pavão e tantos... Um grupo de valores mentais no cultivo da inteligência. E, diante de todos, estão ainda Garcês, com uma nova técnica, com uma nova expressão de arte. E, depois, entrará em contato com este fabuloso Maia Ramos, o poeta dos Noturnos, das cores, apresentando outro aspecto de sua capacidade artística, de criar, de produzir belezas. Com Maia Ramos, agora, os seus trabalhos em raízes. Aí, fica mais a descoberto a sensibilidade do artista português. (...) E a exposição foi uma consagração da vida artística de nossa terra.

* Fernando Braga, in “Travessia” [“Memórias de um aprendiz de poeta e outras mentiras”], livro em construção.