Um maranhense-caxiense considerado “a pedra angular do teatro paranaense”, e que estudou com os grandes mestres do Cinema (Luchino Visconti, Federico Fellini, Roberto Rosselini, Michelangelo Antonionni, Lawrence Olivier)
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José Armando de Almeida Maranhão (Armando Maranhão) nasceu em Caxias (MA), em 18 de junho de 1929. Ele se tornaria, décadas depois, “A Pedra Angular do Teatro Paranaense”, em Curitiba (PR). No exterior, foi aluno de grandes nomes do cinema mundial.
Armando Maranhão era filho de Dª Alzira Carvalho Maranhão, a Ziroca, irmã do empresário caxiense Nachor de Araújo Carvalho (1893-1962) e de José Fonseca Maranhão, o Zeca, irmão de Carlos Maranhão, pai, entre outros, dos irmãos Raimundo Albuquerque Maranhão Neto, mais conhecido como Caju Maranhão (1949-2020) e José Fonseca Maranhão Sobrinho, que me repassaram algumas informações.
Esse maranhense caxiense era e é o orgulho de diversos de seus conterrâneos, sobretudo de familiares. Ainda em 2019, instiguei o Caju Maranhão para colher ou (re)lembrar o máximo possível de informações sobre Armando Maranhão. Lamentavelmente, o áudio com as falas do Caju Maranhão, que conviveu momentos com Armando, foram apagados pelo próprio sistema do telefone antes de sua transcrição. Ainda me recordo das informações sobre as viagens de Armando Maranhão para Caxias, com a família, em visita à terra natal e aos demais familiares. Portanto, mesmo sem Caxias saber, o filho, no caso, um ilustre desconhecido da terra mãe, não deixava de, vez ou outra, tornar aos pagos em que nasceu.
Armando Maranhão é autor de, pelo menos, três livros: “Caricaturas – Teatro”, de 1990; “Caricaturas”, de 1998; e, o mais antigo, “O Cântico das Criaturas”, da coleção Encenações Franciscanas, em parceria com Frei Agostinho Salvador Piccolo, publicado pela Editora Bom Jesus, do grupo educacional de mesmo nome, de Curitiba. Seu último livro, de 1998, é dedicado ao seu primo e grande caxiense Jadihel José de Almeida Carvalho (12/4/1920-5/2/1997), graduado em Engenharia Elétrica e Mecânica, gestor de vários órgãos públicos de Caxias, do Maranhão e do Brasil), professor universitário e candidato a prefeito e a senador, sem êxito. Armando Maranhão abre sua obra com o desenho que fez do “primo, irmão, amigo Jadihel”. Segundo o advogado e escritor caxiense Frederico Brandão, Armando Maranhão era praticamente irmão de criação do primo Jadihel Carvalho, e todos tinham muito orgulho do parente que se destacava no Teatro e na Cultura em Curitiba.
Ainda em “Caricaturas”, de 1998, Armando Maranhão revela: “Criança, em Caxias – Maranhão, nasci na terra de Gonçalves Dias. Aos seis anos, desenhava – foi o começo. Minha família sempre me incentivou”.
Ator e professor de atores, o caxiense Armando Maranhão teve, entre seus alunos, nomes que se destacaram na cena teatral e cultural do Brasil e além. Entre esses nomes, cite-se Denise Stoklos, atriz, dramaturga, encenadora, mímica, autora de mais de trinta peças e de, pelo menos, sete livros, além de filmes e novelas. Armando Maranhão recebeu prêmios ao lado de Paulo Autran e Dulcina de Moraes. Foi amigo do conterrâneo maranhense Ferreira Gullar e do escritor paranaense Dalton Trevisan, do urbanista Jaime Lerner (ex-prefeito de Curitiba e ex-governador do Paraná) e diversos outros nomes do mundo cultural, político e empresarial.
Em 1947, Armando Maranhão foi para o Rio de Janeiro (RJ), a convite de seu tio, João Castelo Branco, funcionário do Banco do Brasil, escritor de peças teatrais (inéditas e extraviadas) e amigo do grande ator Procópio Ferreira, pai da atriz e cantora Bibi Ferreira.
Após alguns dias com seu tio, Armando vai para Curitiba. Queria realizar seu grande sonho – ser arquiteto. Na capital paranaense, na ausência do curso de Arquitetura, decide matricular-se em Engenharia. Mas, no meio do caminho, havia uma pedra... pedras de esculpir. O caxiense inscreve-se, junto com mais oito alunos, no curso de Belas Artes da Escola de Música e Belas Artes do Paraná, a Embap, que havia sido recentemente fundada. Fez Pintura e Escultura.
Dos nove alunos matriculados, seis não aguentam o exigente professor e grande escultor Erbo Stenzel. Mais: dos três alunos “sobreviventes”, um vai ser pintor e gravurista, e o outro, arquiteto. Só o caxiense recebeu o diploma de escultor do primeiro e único curso (que foi desativado) daquela arte ministrado pela Embap. Sobre o curso de Escultura, ele mesmo confirma: “[...] fui o único formado com registro no MEC [Ministério da Educação e Cultura, na época]”. Armando cursou também Filosofia, na Faculdade Católica, em Curitiba.
Armando Maranhão ainda estudou até o 3º ano de Engenharia na Faculdade de Engenharia do Paraná, mas formou-se em Didática, licenciado pela Faculdade Católica de Filosofia.
A partir daí e durante 20 anos, trabalha como desenhista do Instituto de Geografia Terras e Colonização do Paraná. Paralelamente às suas atividades universitárias e profissionais, dá vazão aos seus pendores e valores artísticos. Em 1948, um ano após a sua chegada ao Paraná, já havia fundado, junto com os amigos Glauco Flôres de Sá Brito e Lauro Gonçalves, o Teatro do Estudante do Paraná (TEP), do qual se tornou diretor-presidente a partir de 1949 e até o final da existência do grupo.
“A partir daí – ressalta Secretaria Estadual de Cultura do Paraná, em texto em seu 'site' na Internet –, começou a construir um dos mais vastos currículos do teatro brasileiro, nas mais diversas funções: ator, diretor, produtor, cenógrafo e figurinista, além das atividades como docente em Teatro, Desenho e História da Arte, entre outras disciplinas. Atuando com quase todos os grupos e artistas do Paraná, sempre respeitado pela sua postura ética e pelo grande conhecimento de tudo que dizia respeito a Teatro, viu surgirem e desaparecerem dezenas de grupos e acompanhou e participou, ativamente, das transformações da vida cênica no Paraná”. Continua o texto: “O Teatro do Estudante do Paraná, por sua iniciativa, percorreu 18 Estados brasileiros e apresentou-se ainda na Argentina, no Paraguai e no Uruguai, fato pioneiro”.
Em 1952, Armando Maranhão, por indicação de seu amigo Paschoal Carlos Magno, vai para o exterior, com outros estudantes de teatro, entre os quais Tereza Rachel e Othon Bastos. Passa seis meses na Europa. Estuda na Alemanha, Inglaterra, França, Itália, Portugal, Espanha, Suíça, Bélgica, Holanda e outros onze países da Europa – ao todo, vinte, como o próprio Armando Maranhão registra no texto “50 Anos Dedicados às Artes do Paraná”, no seu livro “Caricaturas”: “[...] ganhei bolsa de estudos para a Europa, estudei em vinte países [...]”. Tem aulas com nomes notáveis do Cinema e das Artes Cênicas, como Luchino Visconti, Federico Fellini, Roberto Rossellini, Michelangelo Antonioni, Laurence Olivier, Jean Vilar, Giorgio Strohler, entre outros.
Armando Maranhão participa dos festivais de teatro e recebe um grande número de premiações. De 1956 a 1959 ensina História do Teatro, Dramaturgia e Cenografia na primeira escola de teatro de Curitiba, a Escola de Arte Dramática do Serviço Social da Indústria (Sesi), da qual foi secretário e diretor.
“Por essa época – diz o texto da Secretaria Estadual da Cultura –, havia um grande incentivo do governo do Paraná ao desenvolvimento do teatro no Estado. Vários cursos de verão foram organizados com nomes nacionais como Cláudio Corrêa e Castro, José Renato, Paulo Goulart e Nicete Bruno. Nesses cursos, Armando Maranhão foi sempre responsável pelas disciplinas de História do Teatro e Dramaturgia”. “Sempre pioneiro, Maranhão montou, em 1953, um elenco permanente de teatro para a Biblioteca Pública do Paraná, que se dedicava ao teatro infantil e que, até o ano de 1960, lançou um número considerável de artistas.
“Em 1963, Maranhão passou a ser funcionário da então Fundação Teatro Guaíra. Foi o que bastou para daí alçar voos maiores no campo das realizações teatrais. A seu pedido, o Guaíra criou o Curso Permanente de Teatro (CPT), e ele foi seu primeiro coordenador e professor de História do Teatro Universal e do Brasil e de Dramaturgia, além de lecionar Cenografia no primeiro ano de funcionamento. Para a fundação do CPT, contou com a colaboração efetiva de Paschoal Carlos Magno, de Fernando Pessoa (à época superintendente do Guaíra) e do governador Ney Braga. Foi a época em que Maranhão dedicou-se com afinco e definitivamente ao ensino do Teatro. Passou a ministrar cursos de teatro no interior do Paraná e Santa Catarina. Passou a fazer vários ciclos de palestras sobre História do Teatro e Dramaturgia em vários Festivais Nacionais de Teatro, tornando-o um nome bastante conhecido e respeitado no meio teatral. Nesse mesmo ano, o Teatro Guaíra cria o primeiro grupo oficial de teatro no Paraná. Para dirigi-lo, é convidado o diretor Cláudio Corrêa e Castro, que traz de São Paulo, Paulo Goulart, Nicete Bruno, Leonor Bruno e Sílvia Paredo, chamando, desde logo, Armando Maranhão para fazer parte do Teatro de Comédias do Paraná, tornando-se a realização que fincou as bases e desenvolveu o teatro paranaense, formando plateias e profissionais e abrindo, definitivamente, o mercado de trabalho para atores, diretores, cenógrafos, figurinistas e toda uma gama de outros técnicos.
“Como professor, Maranhão teve papel importante na formação teatral de alunos das escolas de 2º grau, lecionando, a partir de 1971, no Instituto de Educação do Paraná, no Colégio Bom Jesus, na Escola Experimental André Luiz e no conceituado Curso de Formação do Ator do Colégio Estadual do Paraná”.
“Durante um período de férias, foi convidado a integrar, como ator, a Companhia Procópio Ferreira, que havia, excursionando pelo Brasil com as peças ‘Deus Lhe Pague’, de Joracy Camargo, e ‘Essa Mulher É Minha’, de Raimundo Magalhães Junior”.
“Armando Maranhão acumulou muitos prêmios em festivais nacionais de teatro, nas diversas funções em que atuou. Recebeu, também, diversos prêmios como autor teatral”.
“Aproveitando sua experiência e talento de desenhista, em 1990, lançou o livro ‘Caricaturas – Teatro’, que reunia as caricaturas de figuras do teatro com quem tinha laços de amizade, feitas entre os anos 40 e 70”.
“Em 1984, por ocasião dos festejos do centenário do Teatro Guaíra, Armando Maranhão foi responsável pela criação do Setor de Preservação e Memória do Teatro Guaíra, primeiramente organizado de forma incipiente em uma pequena sala, e que é hoje a realidade que vem desenvolvendo-se e passa a ter o seu nome”.
“Maranhão orgulhava-se em lembrar que, na extensa lista de trabalhos em que atuou ou foi responsável, passou mais de uma centena de atores e atrizes, muitos dos quais são hoje nomes nacionais. Reconhecendo a importância fundamental do seu trabalho pelo teatro do Paraná, em 1988, a Câmara Municipal lhe conferiu o título de Cidadão Honorário de Curitiba. Em plena atividade aos 70 anos, Maranhão participou do filme ‘Onde os Poetas Morrem Primeiro’, de Werner e Willy Schumann, rodado no ano 2000”.
“Em 2004, recebeu do Centro Cultural do Teatro Guaíra a Medalha Comemorativa dos 50 anos de inauguração do Auditório Salvador de Ferrante (Guairinha), quando foram homenageadas as figuras que fazem parte e têm importância destacada no teatro do Paraná. A Classe Teatral Paranaense, em reconhecimento ao trabalho de Armando Maranhão, prestou-lhe uma homenagem no ano de 2006, concedendo-lhe o Prêmio Especial do Troféu Gralha Azul”.
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Armando Maranhão morreu de derrame às 6h30 de 11 de junho de 2007, em Curitiba. Estava adoentado havia cinco anos. Seu corpo está enterrado no Cemitério Parque Iguaçu, da capital paranaense.
O grande caxiense, que se dedicou aos paranaenses, escreveu:
“Tive uma carreira por igual. Tudo foi acontecendo sem atropelos. Também não alimentei grandes pretensões. O que eu queria, consegui: criar o teatro no Paraná. Para mim bastou”.
* EDMILSON SANCHES
Ilustrações:
Armando Maranhão; o primeiro e o segundo livro que publicou, de caricaturas; a charge que fez do caxiense e primo Jadihel Carvalho; e com Paschoal Carlos Magno (centro) e Aristides Teixeira (à direita).