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Caxias, 184 anos – única, ímpar, singular, exclusiva, simplesmente Caxias*

Bairro Tresidela à esquerda, o rio Itapecuru e parte da região central de Caxias ((imagem aérea do Google)

Em 10 de janeiro deste ano, um caxiense por adoção, nascido em Parnaíba (PI), escreve-me:

“Edmilson, você que já deve ter lido muito, adquirido muito conhecimento, tira uma dúvida de um curioso-teimoso, que não concorda com o Mílson Coutinho [desembargador e historiador maranhense, nascido em Coelho Neto], quando ele fala que a origem da palavra “Trizidela” [sic] é de 3 aldeias, que ficavam do outro lado do rio aqui em Caxias. Aí eu pergunto: Será que em Pedreiras, Codó, Coroatá, na Maioba, tinham 3 aldeias também? Aí já vi também que falam: “O que fica do outro lado do rio”. Mas como pode ser, se Caxias começou pela Trizidela? Aí outros falam: “A parte menos importante da cidade, a terça parte”; e eu pergunto: Índio sabia fazer cálculo matemático? Só não vejo uma Trizidela ficar do lado direito do rio, só do esquerdo. Há poucos dias, eu estava em Pedreiras e discutíamos sobre isso. O que você sabe sobre?”

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O fato de Codó, Coroatá, Pedreiras e até municípios brasileiros fora do Maranhão terem bairros, distritos, povoados ou outros lugares com o nome “Tresidela” apenas confirma a influência de Caxias na região, no Estado, no país.

A fundação oficial de Codó é de 1896, embora com registros de povoamento a partir de 1780. A fundação de Coroatá é de 1920, mas desde 1843 que fora desmembrada do território de Caxias. Pedreiras também foi fundada em 1920, mas há registros como vila desde 1889.

Portanto, o ano mais antigo entre os seis acima é o de 1780, início da chegada a Codó de portugueses, fazendeiros maranhenses, africanos escravizados, índios e imigrantes da Síria e do Líbano.

Por sua vez, a palavra “tresidela” tem primeiro registro documentado a partir de 1757 – pelo menos 23 anos antes de 1780 e dezenas (senão centenas) de anos antes de uma localidade codoense, coroataense e pedreirense ser batizada com o nome “Tresidela”.

“Tresidela”, afirmo (até provas em contrário), é nome, é palavra genuinamente caxiense, pois Caxias tem história cujo início vem da segunda década de século XVII, lá por 1612, mais ou menos.

Como havia três aldeias na área da hoje Tresidela, o caxiense Gonçalves Dias, grande estudioso de etnografia, tupinólogo, pesquisador, autor de dicionário de língua indígena, foi o primeiro a afirmar e registrar que a palavra “tresidela” é corruptela da expressão “três aldeias”. Grandes dicionários, como o brasileiro “Houaiss” (o maior da Língua Portuguesa), também creditam essa etimologia à palavra “tresidela”, cujo significado é sempre relacionado a uma posição geográfica, um aspecto topográfico, ou seja, uma localidade, uma povoação, um bairro, situados em um dos lados de um rio e próximos a um lugar maior, geralmente uma cidade, a sede de um município. O “Houaiss” define o substantivo comum “tresidela” como “localidade ribeirinha vizinha à cidade mais importante, na margem oposta do rio”.

Desconheço qualquer registro que ligue a palavra “tresidela” à expressão fracionária “terça parte”, ainda que, epidermicamente, uma ou outra pessoa queira relacionar a uma fração as letras iniciais (“tres-”) ou a sílaba equivocadamente grafada “tri-”. Nesse campo da imaginação e da superficialidade nem é bom entrar...

Também, a palavra “tresidela”, como denominadora de bairro ou povoação (e, no Maranhão, nome até de município – Tresidela do Vale), nada tem a ver com a localização de uma ou da outra margem de um rio, se direita ou esquerda.

Como está nas definições, “tresidela”, além de um localismo (vocábulo próprio de um lugar), é palavra de indicação geográfica, geoterritorial.

Nascido em Caxias, o termo “tresidela”, até pela baita influência econômica e sociocultural – mas sobretudo econômica – da cidade, migrou para outros municípios e territórios, onde também deu nome, por identidade geográfica, à região na outra margem de um rio e contígua, fronteiriça ao local sede do município, assemelhado ao que era/é na terra caxiense onde teve origem a palavra.

Assim, e finalmente, até provas em contrário:

a) “tresidela” (substantivo comum) ou “Tresidela” (nome próprio – topônimo e politônimo) é palavra com, pelo menos, 263 anos de existência documentada, pois há registro de uso dela desde 1757;

b) a etimologia da palavra “tresidela”, segundo registrou Gonçalves Dias, vem da aglutinação e corruptela da expressão “três aldeias”, que identificava uma região de aldeias próxima ao rio Itapecuru, no início de Caxias – “início” conforme a história contada e escrita por nós, os “brancos”, embora saibamos que naquele território bem há mais tempo viviam populações autóctones, indígenas. Ressalve-se que há quem discorde do processo de formação da palavra “tresidela” como oriunda de “três aldeias”, mas também não se propôs nenhuma alternativa etimológica;

c) para quem respeita a própria Língua que utiliza, a grafia da palavra deve ser, sempre, “tresidela” ou “Tresidela”, onde remanescem as letras do predecessor numeral “três”, da primitiva expressão com função toponímica “três aldeias”. A ideia da expressão “três aldeias” esteve em parte presente – sem o numeral – nos diversos topônimos e politônimos que nomearam Caxias ao longo de sua história: São José das Aldeias Altas, Freguesia das Aldeias Altas, Arraial das Aldeias Altas, Distrito de Caxias das Aldeias Altas (criado antes de 1735), Vila de Caxias das Aldeias Altas (criada por alvará de 31 de outubro de 1811) e, por força da Lei Provincial nº 24, de 5 de julho de 1836, apenas Caxias, cujo topônimo, pela importância histórica, cultural, social e econômica do município, foi escolhido para dar nome a títulos de nobreza (como o de Duque de Caxias) e a grandes cidades das regiões Sul e Sudeste: Caxias do Sul, no Estado do Rio Grande do Sul, e Duque de Caxias, no Rio de Janeiro.

A propósito, historie-se que a hoje gaúcha Caxias do Sul, que tanto quis ser só “Caxias”, chamava-se inicialmente “Campo dos Bugres”, nome que perdurou até 1877. A partir de 11 de abril de 1877, em homenagem ao militar Luís Alves de Lima e Silva, o Duque de Caxias, passou a chamar-se “Colônia de Caxias”, assim permanecendo até 1884.

Nesse ano, foi denominada “Santa Teresa de Caxias”, topônimo que ficou até 20 de junho de 1890, quando, na condição de vila, passou a chamar-se “Caxias”, nome que manteve em sua elevação à categoria de cidade pela Lei Estadual nº 1607, de 1º de junho de 1910. Trinta e quatro anos depois, com o Decreto-Lei Estadual nº 720, de 29 de dezembro de 1944, a cidade foi redenominada, passando oficialmente a chamar-se “Caxias do Sul”, não sem antes ter feito persistentes e infrutíferas tentativas para obrigar nossa Caxias, do Maranhão, a mudar de nome – o que, como se sabe, não aconteceu e o que, como também se sabe, seria um desrespeito a tantas lutas e conquistas históricas, culturais, políticas, econômicas etc. da cidade maranhense e seus filhos.

Por outro lado, fundada em 1943, a fluminense cidade de Duque de Caxias era um local de estação ferroviária conhecido até 1931 como “Meriti”, que integrava o 8º distrito do município de Nova Iguaçu. O governo do Rio de Janeiro, pelo Decreto nº 2.559, de 14 de março de 1931, criou, na antiga região de Meriti, o distrito a que se denominou “Caxias”. Doze anos depois, em 31 de dezembro de 1943, o Decreto-Lei nº 1.055 elevava o distrito de Caxias à categoria de município, com o nome de “Duque de Caxias”.

Lembre-se que, à época, havia norma legal no país que proibia que dois municípios tivessem o mesmo nome. Daí que tanto Caxias do Sul (RS) quanto Duque de Caxias (RJ), que originariamente chegaram a se chamar apenas “Caxias”, tiveram, eles, de mudar de denominação...

... pois, no Brasil, assim como a caxiensidade da denominação “Tresidela”, a única, ímpar, singular, exclusiva, só e simplesmente Caxias é a nossa cidade-mãe, cujo início de formação histórica remonta a mais de quatro séculos...

Como se dizia n’outros tempos: antiguidade é posto...

* EDMILSON SANCHES