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Sálvio de Jesus de Castro e Costa (SÁLVIO DINO)*

(Grajaú/MA, 5 de junho de 1932 – São Luís/MA, 24 de agosto de 2020)

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Faleceu na manhã dessa segunda-feira, 24 de agosto de 2020, em São Luís (MA), Sálvio de Jesus de Castro e Costa (Sálvio Dino), advogado, jornalista, orador, pesquisador, historiador, escritor, político e acadêmico.

Nascido em Grajaú (MA), em 5 de junho de 1932, Sálvio Dino tinha 88 anos, 2 meses e 19 dias. Morava em João Lisboa (MA), município do qual foi prefeito duas vezes. Ele já havia apresentado problemas nos pulmões e no coração. Tempos atrás, haviam-lhe colocado dois “stents” – os revolucionários microtubos que foram aperfeiçoados e postos nas artérias coronárias, pela primeira vez no mundo, pelo médico José Eduardo Moraes Rego Sousa, maranhense nascido em Pedreiras.

Internado em hospital de Imperatriz (cidade vizinha a João Lisboa), Sálvio Dino parecia ter se recuperado dos males, ... até ser infectado pelo coronavírus, com progressão para a doença covid-19. No dia 19 de agosto, meados da semana passada, tendo apresentado visíveis melhoras, já se cogitava de Sálvio Dino receber alta na sexta-feira, seguindo o que já ocorrera com a esposa, Dª Iolete Aranha de Castro e Costa, que recebera alta e estava de volta à residência no município joão-lisboense.

Tanto se sentia bem o Sálvio que ele pedira e recebera livros para leitura. Lamentavelmente, poucas horas depois, já no dia 20 de agosto, quinta-feira, um repentino agravamento no quadro de sua saúde levou-o a ser transferido via aérea para São Luís. Saiu do Hospital Macrorregional Drª Ruth Noleto, de Imperatriz, para o Hospital de Referência Estadual de Alta Complexidade Dr. Carlos Macieira, no Bairro Calhau, em São Luís (MA). Ambos os hospitais são estabelecimentos da rede pública estadual de Saúde.

Na capital maranhense, Sálvio Dino ainda recebeu mais “stents”, os microtubos revolucionários que facilitam o fluxo de sangue no coração. Seu corpo teria reagido bem – mas a agressividade da nova doença virótica ampliou o comprometimento dos pulmões e levou a um estado geral de agravamento da saúde do grande sertanejo grajauense.

Sálvio Dino, ao invés da noite, escolheu – pode-se dizer – o amanhecer do primeiro dia útil da semana, 24 de agosto, para dar início à sua jornada rumo à nova vida. E ainda, por assim dizer, “desmentiu” apressados escrevedores de notícia, os quais, antecipando-se a Deus e ao próprio Sálvio, (des)informaram milhares e milhares de pessoas com o registro de que o Grande Tribuno dos Sertões havia falecido na tarde de domingo, 23 de agosto.

Entre o fim e o começo de um período, o escritor Sálvio tomou a liberdade de resistir ainda mais, para somente entregar-se à Eternidade quando o rei Sol fizesse acontecer o raiar de um novo dia...

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Nascido em 5 de junho de 1932, Sálvio de Jesus de Castro e Costa era um dos três filhos do casal Maria José Barros de Castro e Costa e Nicolau Dino de Castro e Costa. Dos dois irmãos de Sálvio, colhi o nome de Nicolau Dino de Castro e Costa Filho, militar, da Intendência do Exército Brasileiro, que, em dezembro de 1970, era capitão e estava sendo promovido ao posto de major.

Do pai Nicolau Dino, nascido no Estado do Amazonas, é que veio o nome – incorporado oficialmente ou não – pelo qual Sálvio e seus descendentes são tão conhecidos. “Dino” é prenome e também sobrenome com origem na forma diminutiva, reduzida, popular ou coloquial com que, na Itália, eram tratadas pessoas que tinham prenomes ou sobrenomes como “Bernardino”, “Fernandino”, “Galdino”, “Ricardino”, “Ubaldino” etc., valendo também para o gênero feminino – Dina.

A mãe de Sálvio, Maria José, era maranhense, descendente de família de quatro costados do Grajaú, como ele, Sálvio, filho, conta em seu livro ainda inédito – que o próprio Sálvio, premonitoriamente, chamou de “meu canto do cisne” (a última obra), cujos originais foram a mim confiados, em maio passado, para fazer a revisão, prefácio e edição. Nesse livro, cujo projeto gráfico-editorial já está pronto e foi entregue em sua residência, escreveu Sálvio Dino sobre o casamento de seus pais:

“Outra personagem marcante: Nicolau Dino de Castro e Costa, magistrado-poeta, que deu singular brilho à sua atuação no terreno da magistratura e da nossa vida social e cultural. Diga-se, ‘en passant’, aqui, neste histórico casarão [o atual prédio-sede da Academia Grajauense de Letras e Artes, presidida por Sálvio], ele casou-se no civil e no religioso com a jovem Maria José, filha de uma das mais tradicionais famílias grajauenses, a família Barros. E quem fez esse casamento foi o então juiz de paz Gustavo Santos, também do mesmo naipe de conceituada família de nossa terra”.

Além do singular e forte nome “Dino”, também vieram do pai Nicolau para o filho Sálvio e seus descendentes o gosto pela leitura, o exercício da escrita, a atuação na Imprensa e o pendor para as Ciências Jurídicas, o Direito, a Magistratura, a Justiça: todos os quatro filhos de Sálvio Dino têm formação em Direito.

O amazonense Nicolau Dino, pai de Sálvio, nasceu em 16 de maio de 1900 e faleceu em 1976, em São Luís. Estudou em Belém, onde foi redator do jornal “Folha do Norte” e onde se diplomou bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, em dezembro de 1920. Vindo para o Maranhão, teve sólida e ascendente carreira jurídica: foi promotor público na Comarca de Grajaú, na qual, a partir de 1926 e por quase duas décadas, foi juiz de Direito, transferindo-se, em 1948, para São Luís. Na capital maranhense, em 1950, foi nomeado desembargador do Tribunal de Justiça do Maranhão, desempenhando seguidamente as funções de corregedor, vice-presidente e presidente. Também foi presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão (1955) e membro do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão. Publicou diversos livros no campo jurídico, literário e histórico, entre os quais: “Da Inseminação Artificial Humana”, “Magistrados Poetas” e “O Visconde Vieira da Silva”.

Sálvio Dino é pai de quatro filhos, todos nascidos em São Luís, os três primeiros (Nicolao, Flávio e Sálvio Junior) com Dª Rita Maria dos Santos Castro e Costa, advogada, e o quarto, Saulo, em segundas núpcias, com Dª Iolete Aranha de Castro e Costa, que foi secretária municipal de Desenvolvimento Social e de Saúde de João Lisboa:

– Nicolao Dino de Castro e Costa Neto, nascido em 25 de agosto de 1963. É mestre em Direito, professor universitário, subprocurador-geral da República e foi vice-procurador-geral eleitoral do Brasil (2016/2017);

– Flávio Dino de Castro e Costa, nascido em 30 de abril de 1968. É advogado, mestre em Direito, professor universitário e ex-diretor da Escola de Direito de Brasília, do Instituto Brasiliense de Direito Público. Exerceu funções nos três Poderes da República: no Judiciário, foi juiz federal (1994/2006); no Legislativo, foi deputado federal, de 1º de fevereiro de 2007 a 1º de fevereiro de 2011; e, no Executivo, foi presidente do Instituto Brasileiro de Turismo (Embratur), de junho de 2011 até março de 2014, e governador do Maranhão, eleito e reeleito (2014 e 2018), exercendo a função há seis anos, desde 1º de janeiro de 2015;

– Sálvio Dino de Castro e Costa Junior, nascido em 1º de fevereiro de 1975. É advogado, especialista em Direito Processual Civil, professor universitário e sócio-fundador da Dino, Figueiredo & Lauande Advocacia e Consultoria, em São Luís. Foi secretário estadual de Justiça e Cidadania (2005/2006) e presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente do Maranhão;

– Saulo Aranha de Castro e Costa (Saulo Dino), o mais novo, nascido em 13 de dezembro, é bacharel em Direito, empresário e ex-atleta de basquetebol. Foi secretário de Esportes e Lazer do município de Imperatriz (MA) e secretário municipal de Infraestrutura e Urbanismo em Açailândia (MA).

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Sálvio Dino teve uma vida onde seu talento precoce e sua coragem cívica foram revelados, ampliados e postos à prova. Ao longo da sua vida, e desde a minoridade, assumiu – e desempenhou – diversos cargos e encargos; não negou sua participação, envolvimento, luta em nome de coisas e causas coletivas.

Depois dos primeiros estudos na terra natal, Grajaú, Sálvio Dino foi para São Luís, fazer o curso secundário, ou 2º grau, hoje ensino médio. Depois, ingressou no curso de Ciências Jurídicas e Sociais, da Faculdade que hoje integra a Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e sobre a qual Sálvio mais tarde escreveria e publicaria o livro “A Faculdade de Direito no Maranhão”, prefaciado pelo médico e professor Natalino Salgado, reitor da UFMA.

Na vida ESTUDANTIL, logo se tornou referência. Foi ativo membro da União Maranhense dos Estudantes Secundaristas (Umes). Líder estudantil, integrou o Parlamento Escola da Faculdade de Direito e foi eleito orador oficial do Centro Acadêmico Clodomir Cardoso, da mesma Faculdade. Na EDUCAÇÃO, como vereador na capital, foi autor do projeto de lei que criava o Colégio Municipal de São Luís.

Na IMPRENSA, foi revisor e repórter dos Diários Associados, em São Luís. Colaborou por décadas como articulista e cronista do jornal “O Estado do Maranhão”, além de contribuições variadas para outras publicações, inclusive o jornal “O Progresso”, de Imperatriz.

No mundo do DIREITO, como ressaltou em nota oficial a Ordem dos Advogados do Brasil no Maranhão (OAB-MA), “foi um profissional atuante e que muito contribuiu para a advocacia maranhense”. Foi um grande advogado criminalista e júris de que participava tornaram-se famosos, tanto na capital do Estado quanto nos demais municípios maranhenses. Foi, por vários anos, chefe da assessoria jurídica da Federação dos Municípios do Estado do Maranhão (Famem). É da autoria de Sálvio Dino a proposição para a criação da subseção da OAB em Imperatriz, considerada a primeira do interior da extensa Amazônia Legal. Foi conselheiro da OAB-MA e editor-geral da revista científica da Ordem, tendo sido homenageado por essa Entidade com o Diploma de Honra ao Mérito pelos 100 anos do Curso de Direito da Universidade Federal do Maranhão, em 2018.

Na POLÍTICA e ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, foi eleito vereador de São Luís em 1954 e reeleito em 1958. Em seguida, foi eleito deputado estadual em 1962, cujo mandato foi cassado, em 1964, por alegadas atividades subversivas. Foi reeleito para a Assembleia Legislativa em 1974, exercendo o mandato de deputado estadual de 1975 a 1979. Chegou a ser considerado o melhor deputado do ano de 1977, pelo Centro Social Estudantil Maranhense. Foi eleito prefeito de João Lisboa por dois mandatos: de 1988 a 1991 e de 1996 a 2000. Foi presidente da Associação dos Municípios da Região Tocantina (AMRT) e da Associação dos Municípios do Sul do Maranhão (Amsul). Ocupou e exerceu diversos cargos de relevo no governo estadual maranhense.

No campo das LETRAS, da HISTÓRIA e da CULTURA em geral, Sálvio Dino deu exemplo de iniciativa e participação, como membro da Academia Maranhense de Letras, da Academia Maranhense de Letras Jurídicas, da Academia Imperatrizense de Letras, da Academia João-lisboense de Letras e da Academia Grajauense de Letras e Artes, da qual era presidente. Também fundou e foi presidente da Federação das Academias de Letras do Maranhão.

Em sessenta anos de vida política e de pesquisas históricas e culturais, publicou diversos livros e deixou, pelo menos, um inédito e praticamente pronto para impressão. Suas obras publicadas têm início em 1959, com “Um Moço na Tribuna”; depois, seguiram-se: “Trilogia da Emoção” (1964), “Raízes Históricas de Grajaú” (1974), “Nas Barrancas do Tocantins” (1981), “Semeando Manhãs” (1985), “Quem Passar por João Lisboa” (1989), “Luzia, Quase Uma Lenda de Amor” (1990), “Onde é Pará, Onde é Maranhão?” (1990), “O Perfil Histórico do Rio Tocantins” (1992), “A Faculdade de Direito do Maranhão: 1918-1941” (1996), “Clarindo Santiago: O Poeta Maranhense Desaparecido no Rio Tocantins” (1997), “Leões: Um Palácio de Histórias, Lendas, Mitos & Chefões” (1997), “Verde, Sertões e Vidas” (1999), “Parsondas de Carvalho: Um Novo Olhar Sobre o Sertão” (2011), “Do Grajaú ao Cume da Intelectualidade” (2014) e “A Coluna Prestes a Exilar-se – Passagem pelo Sul-maranhense” (2016). Inédito, deixou “Louvação a Grajaú”, considerado por ele seu “canto do cisne” (última obra), conforme declarações ao jornalista, escritor e editor Edmilson Sanches, escolhido por Sálvio Dino para fazer o prefácio (já lido e aprovado por Sálvio) e mais a revisão e edição da obra.

Permanentemente ativo e criativo, Sálvio Dino alimentava outros projetos literários, entre os quais uma segunda edição, revista e ampliada, do livro sobre a Coluna Prestes, de 2016, e um livro sobre o militar e escritor maranhense Augusto Tasso Fragoso, que, em 1930, foi da Junta Governativa do Brasil. Sálvio estava em fase de leituras sobre o possível biografado, conforme conta Agostinho Noleto Soares, advogado, escritor e colega de Sálvio na Academia Imperatrizense de Letras.

O advogado e escritor Fernando Braga, residente em Brasília (DF), amigo e contemporâneo de Sálvio Dino, ouviu o ilustre grajauense referir-se a um terceiro projeto, um livro sobre a tradicional família Barros, de Grajaú, da qual descende Dª Maria José Barros de Castro e Costa, mãe dele, Sálvio. Aliás, Sálvio Dino tem praticamente pronto o material para esse livro “post mortem”: a série de crônicas sobre a família Barros, que ele escreveu e que, parte delas, foi publicada em jornal e em espaço virtual da Academia Maranhense de Letras. É só reunir e dar o tratamento gráfico-editorial necessário, realizando mais esse desejo e premiando mais esse esforço genealógico e historiográfico do grande pesquisador.

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Conheci Sálvio Dino na década de 1970, mas as referências mútuas e a amizade consolidaram-se nos anos 1980 e, em especial, no início da década seguinte, quando, em 27 de abril de 1991, fundei a Academia Imperatrizense de Letras (AIL), para cuja constituição o convidei, junto com outros doze humanistas, totalizando catorze membros fundadores: Adalberto Franklin, dom Affonso Felippe Gregory, Edmilson Sanches, Eucário Rodrigues, José de Sousa Breves Filho, José Geraldo da Costa, Jucelino Pereira da Silva, Jurivê de Macedo, Lourenço Pereira de Sousa, Lourival de Jesus Serejo Sousa, Neneca Motta Mello, Sálvio Dino, Tasso Assunção e Vito Milesi. Logo após a fundação, ainda em 1991, trouxe até Imperatriz os escritores Jomar Moraes e José Chagas, da Academia Maranhense de Letras. Sabendo que Sálvio tinha, em São Luís, interlocução com aqueles acadêmicos, convidei-o para a mesa diretora dos trabalhos, nós quatro, no concorrido evento realizado no auditório da Associação Médica de Imperatriz.

Tempos depois, após retornar de longos anos de estudo e trabalho em Fortaleza (CE), Brasília (DF) e São Paulo, eu voltei a me encontrar com Sálvio com mais frequência, sobretudo nas reuniões das tardes e noites das quintas-feiras na AIL. Um ano desses, um dia qualquer, antes do início da reunião, Sálvio diz-me que seu filho estava na Praça da Cultura (em frente à Academia) e ele, Sálvio, convidava-me para tirar uma foto com eles, antes de a reunião começar. Lembro-me de que perguntei: “Qual filho, Sálvio?”. Ele respondeu-me: “O Flávio”. Fomos à praça, e Sálvio, Flávio Dino e eu posamos para as lentes de um fotógrafo que ali já estava. Flávio, brincando, disse: “Essa foto é o futuro do Maranhão”. Talvez falasse por ele...

Sálvio manifestava espontânea e publicamente seu apreço pelas coisas que eu escrevia e falava e pelo ativismo cultural que eu desenvolvia, estimulando e/ou auxiliando na criação de entidades culturais, sindicais, profissionais, desde academias de letras em São João do Sóter ou em Buriticupu, em Santa Inês ou João Lisboa, Aldeias Altas ou Açailândia, a associações de quebradeiras de coco no Povoado Açaizal Grande, em Senador La Rocque, ou de produtores rurais no Olho d’Água do Tucum, no Tocantins, ou sindicato de bancários e de contabilistas, além de diversas associações de moradores em Imperatriz.

Por causa desse ativismo, certamente, Sálvio Dino me pediu para criarmos uma Federação das Academias de Letras do Maranhão. Fiz a pesquisa das entidades acadêmicas e assemelhadas existentes no Maranhão, elaborei uma minuta de estatuto, fiz um apanhado de documentos impressos sobre a existência de entidades federativas do gênero pelo país e passei tudo para o grande tribuno. Dito e feito: a Federação foi criada. Uma vez, em sua casa em João Lisboa, ele disse que seria realizado um congresso das academias de letras e que o evento se daria em Caxias, “em homenagem a Edmilson Sanches e sua contribuição para a Federação e para a criação de academias no Estado”. Claro, agradeci também bem-humorado. O congresso até que foi pensado, mas não se realizou.

Sálvio aqui e acolá telefonava e pedia para eu ir até o vizinho município – ele cuidava de pedir ao Nonato, motorista dele, para vir me buscar. Lá, na residência dele, conversávamos, eu levava livros para ele, e ele ofertava livros para mim. Há uns dois anos, mais ou menos, ele queria saber sobre um estudo meu, já concluído, acerca da autoria do livro “O Sertão”, atribuído a Carlota Carvalho. Essa autoria já foi tema de bons debates na Academia Imperatrizense. Sálvio estava particularmente interessado por algumas informações inéditas nos trabalhos sobre Parsondas de Carvalho, as quais localizei em obras em francês e em português – os dois volumes da raríssima obra “Le Brésil: Excursion a Travers ses 20 Provinces”, de Alfred Marc, publicada em Paris, no século XIX (1890), e o livro “Alcântara: Subsídios para a História da Cidade”, do maranhense Antônio Lopes, publicado pelo Patrimônio Histórico Nacional em 1957.

Por várias vezes, fui por surpreendido pelo Sálvio em cena pública com manifestações espontâneas e elogio e reconhecimento – como na noite de 6 de julho de 2019, no seu discurso na concorridíssima solenidade de inauguração da sede própria da Academia Grajauense de Letras e Artes, que ele .

No fim de 2019, Sálvio soube de um projeto meu – a “Enciclopédia Maranhense” – e, novamente, convidou-me para conversar lá em João Lisboa. Pediu-me que lhe levasse uma cópia – levei mais de uma... Ficou absolutamente extasiado com as centenas de nomes de maranhenses que tanto fizeram pelo Brasil em todas as áreas do Conhecimento (Agricultura, Artes, Ciências, Cinema, Cultura, Economia, Indústria, Medicina & Saúde, Música, Política & Administração Pública etc.). Nomes que o Maranhão ou não conhece ou, adequadamente, não reconhece. Ou os dois. Pessoalmente ou por telefone, Sálvio antecipava que, até o fim do ano (2020), iria me pôr frente a frente com quem pudesse se apaixonar por aquele projeto, e financiá-lo.

Mais recentemente, desde maio, Sálvio ligava duas ou três vezes semanalmente. Ele acabara de receber um livro prefaciado por mim e, ao ligar, disse: “Vou te enviar os originais do meu canto do cisne, meu último livro, e não posso publicar esse livro sem o seu prefácio”. Ainda “ralhei” com ele sobre aquela história de “canto do cisne”, de “último livro”, e ele ria...

Após receber o texto do prefácio que escrevi, fez dois telefonemas onde, por quase uma hora, ele demonstrava a satisfação com o prefácio. Depois, pediu: “Esse livro só pode sair se for com sua revisão e sua edição; faça o projeto editorial e me envie, para eu tratar das condições para publicá-lo”. Sálvio aceitou todas as ideias para o projeto gráfico-editorial do livro, a partir da sugestão de um nome mais curto e forte – “Louvação a Grajaú” –, além de ilustrações em cores, índices cronológico e onomástico etc. Ele queria que estudantes e pessoas mais jovens se sentissem atraídas para manusear e, claro, ler sua “Louvação” à cidade de que ele é orgulhoso – e ilustre – filho. Um exemplar do livro, que nas gráficas chamamos “boneco”, foi feito e foi levado à residência joão-lisboense do grande tribuno dos Sertões. Tomara que lhe tenha sido entregue e que ele possa ter visto, tão contente estava com seu trabalho...

O Sálvio aqui e acolá lembrava a coincidência – de resto trivial – de um de seus filhos e eu termos nascidos no mesmo dia e mês. Outro ponto de contato foi a eleição de Sálvio Dino para a Academia Maranhense de Letras Jurídicas, em 2014. A Cadeira que ele passou a ocupar ficara vaga com o falecimento, naquele ano, de um grande amigo meu e por muito tempo meu colega de república em Imperatriz: o itapecuruense Leomar Barros Amorim de Sousa (1955—2014), mestre em Ciências Jurídico-políticas em Lisboa (Portugal), que, à época, era advogado do Banco da Amazônia e depois, por concurso, tornou-se juiz federal, chegando a desembargador federal do Tribunal Federal de Recursos da 1ª Região, professor universitário e membro do Conselho Nacional de Justiça.

Para não alongar mais ainda este escrito – de qualquer forma pequeno para a imensidão multifacetada de Sálvio Dino –, relembro um recente episódio que tanto o alegrou: o reencontro com a filha de um amigo dele da distante primeira metade do século XIX – o jornalista e poeta Rogaciano Leite, nascido em Pernambuco mas radicado em Fortaleza (CE) e viajado por todo o país e exterior, fazendo reportagens que ganharam prêmios Esso e realizando apresentações culturais, com recitais poéticos Brasil adentro. Rogaciano Leite esteve em São Luís e em Caxias. Na capital, conheceu Sálvio Dino e tornaram-se amigos.

Coincidentemente, lá pelo ano 1995 ou 1996, quando eu morava em Brasília, recebi uma visita surpresa de Sálvio Dino ao meu local de trabalho. A satisfação ante o reencontro foi enorme. Aí, lembrei-me de que uma colega de trabalho, a engenheira civil e gestora Helena Roraima Iracema Cavalcante Leite, era uma das filhas do poeta Rogaciano Leite. Apresentei-a ao Sálvio Dino, oportunidade em que ele logo contou à Helena Roraima como conhecera o pai dela. Duas décadas e meia depois, agora em 2020, comemoram-se cem anos de nascimento do grande poeta nordestino. Helena Roraima, há anos morando em Madri (Espanha), realiza, de longe, um enorme, gigantesco esforço para coletar mais e mais informações sobre seu pai e fazer, ainda que de modo virtual (em razão da pandemia do coronavírus), uma exposição sobre ele. Helena Roraima pede depoimentos em áudio e vídeo e textos, solicita recortes de jornais que mencionem seu pai, fotografias, enfim, o que for possível. Pediu-me ajuda, queria um plano de pesquisa nos diversos Estados brasileiros, consulta a coleções de jornais em biblioteca ou nas sedes dessas publicações, gravação de entrevistas... Um mundo de coisas.

Fiz o planejamento e o enviei para a Helena Roraima – e, “de quebra”, disse para ela que havia localizado alguns conhecidos de Rogaciano Leite ou apreciadores de sua obra. São os amigos escritores Arthur Almada Lima Filho, desembargador, e Frederico Brandão, advogado, que conheceram Rogaciano em Caxias; Edmilson Franco, advogado, que conhece de cor e salteado a cidade natal e diversos outros lugares por onde Rogaciano andou; Valdizar Lima, empresário, conterrâneo de Rogaciano... e Sálvio Dino, velho conhecido do poeta sertanejo. Da Espanha, Helena Roraima ligou para todos e, pela magia das telecomunicações, teve momentos emocionantes com pessoas que falaram, e falaram bem, de seu pai... Sobre Sálvio Dino, a filha de Rogaciano Leite enviou-me, nesse 24 de agosto, o seguinte depoimento:

“Foi em 1947 que ele [Sálvio Dino] conheceu o poeta Rogaciano Leite, meu pai. Cinquenta anos depois, o conheci, apresentado pelo meu amigo Edmilson Sanches, quando trabalhávamos no gabinete da presidência do BNB [Banco do Nordeste do Brasil], em Brasília.

Vê-lo lembrar-se tão bem do papai, depois de 50 anos, me pareceu fantástico! Recentemente, tive nova oportunidade de contatá-lo (encontro também facilitado pelo Sanches) e por telefone conversarmos prazerosamente por longo tempo e, por fim, pude convidá-lo para participar do documentário sobre papai... pós-pandemia... Ano 2020...

Vejam só... Já são 73 anos [do encontro entre Sálvio Dino e Rogaciano Leite] e 23 do nosso encontro... e mesmo assim, depois de tantos anos, sua memória [de Sálvio Dino] e energia de menino me impressionaram e me encheram de emoção e de carinho... por ele... por suas lembranças, dele e minhas, guardadas na sua bagagem de memórias de seus 88 anos.

Não pude deixar de me emocionar com sua internação, seguida de minhas preces... e meu desejo de voltar a conversarmos e rirmos juntos...

Sua ausência, agora, nos separa... mas levo comigo o vínculo que criamos, antes com o pai, agora com a filha. Sálvio Dino é marcante! Se sinto essa dor ao saber dessa notícia triste (pelo meu amigo Sanches), que me enche de emoção, fico a imaginar o sentimento de quem o conheceu faz tempo...

Solidarizo-me com o sentimento de todos os seus admiradores, amigos e familiares, desejando-lhes o conforto, sentindo a ausência física, mas crendo na vida espiritual, que sei que não morre!...

Os dois amigos [Sálvio Dino e Rogaciano Leite], a essas horas devem estar juntos, relembrando e contando suas histórias...

O meu adeus a Sálvio Dino! Gratidão por conhecê-lo.

Sanches, gratidão por ser o intermediário desses nossos felizes encontros que a vida nos proporciona”. (HELENA RORAIMA LEITE)

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A natureza das lembranças e impressões de Sálvio Dino em muitas pessoas pode ser aferida pelos comentários a partir de dois pequenos textos que fiz e coloquei dia 24/8 em página em meu nome na rede social Facebook. Lindalva Bastos Lopes escreveu: “Saudades eternas; eu admirava muito o intelectual Sálvio Dino. Um homem culto, um intelectual admirado e amado por muitos [...]”.

Francisca Carvalho Sousa, maranhense residente em São Paulo, solidariza-se na dor e relembra: “Meus sentimentos a todos familiares. O conheci demais, porque ele ia à casa de meus pais nos anos 1970. Eu votava nele e meu pai votou nele. Sinto muito; eu também o admirava muito”.

Nascida em Anápolis (GO), mas há muito radicada em Imperatriz e no vizinho Estado do Tocantins, onde é professora, Eunice Mendes dos Santos reconhece: “Um homem simples, mas de uma grandiosidade infinita! Muita Paz e Luz em seu retorno ao Lar original! Aos familiares, meus sinceros sentimentos!”

Bancário aposentado, João Silva Lima lamenta: “Foi-se um dos maiores intelectuais do Maranhão, político de renome e uma das maiores expressões do Direito Penal. Imortal da Academia de Letras, autor de vários livros. Que Deus o Tenha”.

Funcionário da Caixa Econômica Federal e “designer” gráfico, Marcos David P. Almeida relembra: “Grande homem!! Conheci o Dr. Sálvio Dino quando eu trabalhava na Gráfica e Editora Brasil, em Imperatriz. Meus pêsames aos familiares!!”

Advogado e escritor, de tradicional família de Montes Altos (MA), Márcio Ferraz conta: “Desde quando eu era criança, já ouvia falar de Sálvio Dino, como advogado e ‘homem das letras’ do Estado... Pesquisou, resgatou e escreveu, por exemplo, sobre o Parsondas de Carvalho (persona que Sálvio tanto admirava) e é um dos símbolos culturais de Montes Altos (minha terra). Sem dúvida ficará uma lacuna imensa, mas ficará também tudo de excelência feito pela cultura do Maranhão pelas mãos deste ilustre filho de Grajaú”.

Homem do povo, que conhecia muito do futebol brasileiro, Sálvio Dino é lembrado por esse viés por alguns amigos, entre eles o empresário Newton Oliveira, de Imperatriz: “Mais um botafoguense nos deixa...”.

Meu amigo Fernando Mendonça, juiz de Direito, que bons serviços prestou à Justiça em Imperatriz e hoje está em São Luís, escreveu: “Muito querido e sempre atencioso com amigos e conhecidos! Os números da covid-19 transformados em pessoas amadas e exemplo de compromisso com a evolução da vida em sociedade. Pêsames à família enlutada!”

Nascido em São Paulo, mas definitivamente radicado em Imperatriz, José Emivaldo Carvalho Lima faz um “tour” pelas próprias lembranças: “Fazendo uma memória póstuma, lembro agora, também, desde meus tempos de criança, em Montes Altos. Sálvio Dino já fazia frente de movimentos políticos, nos meados dos anos 1970. [...] Tinha um ‘voz’ [sistema de som] que divulgava sua chegada na cidade. Se não me falha a memória, quem fazia frente desses movimentos era o ex-prefeito Adail Albuquerque de Sousa, a saudosa Laura Rocha e também o Sr. Mesquita. Enfim, só boas lembranças hoje do passado. [...]”.

Nascido em Carlos Chagas (MG), residente em Belo Horizonte e com negócios em Imperatriz, onde também mora, o médico-veterinário, consultor e empresário rural Mauroni Cangussú, um dos maiores especialistas mundiais sobre fome e alimentos, convidado pela ONU para os mais importantes eventos sobre esse tema, relembra: “[Sálvio Dino foi o] Primeiro político que conheci aqui no Maranhão. Andando pelas ruas de João Lisboa, me desejou boas-vindas ao Maranhão. Aqui estou há mais de 30 anos”.

Júlia Gomes, advogada e de tradicional família de Montes Altos (MA), servidora aposentada do Tribunal Regional do Trabalho e do Tribunal Superior do Trabalho, lembra-se de Sálvio Dino: “Meus sentimentos à família de nosso amigo ilustre Dr. Sálvio Dino. Tive a honra de atendê-lo muitas vezes na Justiça do Trabalho em Imperatriz, no exercício da advocacia. Guardarei sempre na memória uma ligação que recebi dele no primeiro semestre de 2017, me convidando para o lançamento em São Luís de um dos seus livros. Foi um homem notável, de grande inteligência e amor ao Maranhão. Deixou um grande legado. Que Deus o receba em Seus braços e lhe dê a salvação eterna!”

A médica Marilda Albuquerque Ferraz escreve: “Lamento profundamente a perda de um grande amigo do meu pai, Vanderly Ferraz, ex-prefeito de Montes Altos. Compartilhavam das mesmas ideias políticas e literárias! Que Deus o tenha entre os bons e os justos!”

O gerente comercial e escritor Humberto Barcelos, autor de livros de poesia e contos, relata: “– Um abraço, caro mestre. // – Igualmente, meu filho. Vou ficar aqui ao som dos meus passarinhos. // Estas foram as últimas palavras que troquei com o acadêmico Sálvio Dino, por telefone. Eu havia acabado de passar pelo doloroso processo de recuperação da covid-19. Falamos sobre bem-estar físico e literatura. Para aqueles que conheceram o mestre Sálvio não restam dúvidas a respeito da capacidade que ele possuía de nos ensinar através de suas vivências e conhecimento de nossa literatura. // Ele me falou empolgadamente sobre o livro no qual estava trabalhando, cujo lançamento seria/será em breve. Enquanto isso, era possível ouvir, ao fundo, os cantos dos passarinhos, que provinham do belo espaço ao redor de sua casa rodeada de natureza. Rodeada de tranquilidade. E, agora, rodeada de saudade. // Nossa cultura e literatura sempre necessitam de defensor@s para que ganhem o espaço merecido e necessário dentro da sociedade. Aqueles que nesse sentido se dedicaram são merecedores de elogios e reconhecimento, principalmente porque o objetivo final se resume no ato de educar. Educar para a vida. Nesse respeito tivemos o apoio incontestável de Sálvio Dino. // Nossas sinceras condolências à família enlutada e aos amigos que terão que lidar com a saudade”.

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Cada ser humano tem dentro de si seu próprio cemitério. Ali, ele guarda e cultiva seus mortos. Talvez, haja tumbas descuidadas, sepulcros não caiados... Túmulos negligenciados, sepulturas indiferentes, mausoléus desleixados. Como em todo campo santo, também no cemitério de nossa mente e coração há que se ter zelo pelos que se foram, cuidar ou, ao menos, (re)lembrar do legado que, querendo ou não, deixaram por aqui, para os dias sem fim que hão de vir.

Sálvio Dino é desses que lutou por coisas e causas nobres – da História, da Cultura, da Arte, da Literatura... Da boa Política, da correta Administração, do bom Direito, da adequada Justiça.

Meio milênio antes de Cristo, um dos sete sábios da Grécia Antiga, Quílon de Esparta, escreveu, e os latinos adotaram: “De mortuis nil nisi bonum” (“Não se fale nos mortos, a não ser para dizer bem”).

Cordial, cavalheiro, apaziguador, para se falar bem de Sálvio Dino ele não precisava morrer...

Os Céus acabam de ganhar seu mais entusiasmado tribuno...

* EDMILSON SANCHES