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BANDEIRAS DESFRALDADAS, PESSOAS DEFRAUDADAS*

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– Enroladas ou desfraldadas, as bandeiras eleitoreiras, mais que mostrar candidatos, revelam a situação dos seres humanos que as carregam e o modo como permanecerão: ENROLADOS pelos políticos e DEFRAUDADOS pela ação deles.

– É o lenhador sendo forçado a fazer as pontas da estaca que o empalará.
É o afiador afiando o machado que o decapitará.
É o cordoeiro fazendo a corda que o enforcará.
São eleitores carentes contribuindo para eleger os que vão mantê-los no estado de carência.

– Um sanduíche de enganações é periodicamente servido aos eleitores.

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Uma história que se repete.

O sol na cidade está de rachar. Sob ele, pedestres caminham apressados e, como mariposas que buscam a luz, as pessoas procuram uma réstia de sombra próximo a paredes e muros de edificações e terrenos.

Estamos em época de campanha eleitoral. Eleições. No meio da paisagem humana, um grupo de mulheres – sobretudo mulheres – e homens mantém-se estático, parado, por força de um emprego sazonal, estacional, bianual, quadrienal, eleitoral: agitadores de bandeira de candidatos.

Mas aqueles homens e mulheres ali, expostos ao sol como carne seca, não são agitadores de bandeiras. No máximo, são portadores de bandeira. Porque a bandeira de material sintético muitas das vezes está sendo utilizada é para encobrir a cabeça. Ainda assim, o estandarte é instrumento sólido e incerto para substituir a ação de um protetor solar certo e líquido.

Quem tem olhos de ver e sentimentos de sentir poderá perceber o que há de triste, trágico e desolador naquelas pessoas expostas ao sol: mais do que uma bandeira, o que está sendo exposto explicitamente ou subliminarmente é uma realidade social, a carência econômica de uma farta porção da população.

A inclemência do clima não faz acordos com a malandragem desse espécime danoso à natureza humana: o político safado, malandro, egoísta e egocentrista, que, malbaratador de desculpas, equilibrista de justificativas, contorcionista de palavras, é desapossado de sensibilidade social verdadeira, profunda, carnal-mental – essa sensibilidade é só recheio retórico, para formar o sanduíche de enganações que periodicamente é servido a eleitores.

As bandeiras são desfraldadas por pessoas que foram defraudadas...

Um dos significados do substantivo "defraudação" é “tirar algo de alguém”. Outro significado: “subterfúgio para enganar”.

Quem tem olhos de enxergar e sentimentos de sentir estenderá a visão do pelotão de porta-bandeiras eleitorais para além das calçadas superensoladas das ruas e avenidas e praças e esquinas da grande cidade.

Com visão de raios-X, sem precisar ser super-herói de histórias em quadrinhos, o que se revela ali, após as camadas de superficialidades, são pessoas vitimizadas pela pouca ação, inação, omissão, enganação e esculhambação dos detentores de mandatos que os próprios portadores de bandeira ajudaram a visibilizar e eleger.

São eleitores carentes contribuindo para eleger os que vão mantê-los no estado de carência.

É o lenhador sendo forçado a fazer as pontas da estaca que o empalará.

É o afiador afiando o machado que o decapitará.

É o cordoeiro fazendo a corda que o enforcará.

Como certa vez, em minha residência, disse, à época, o juiz Márlon Reis, um dos responsáveis pela Lei da Ficha Limpa: candidato cujas bandeiras só são agitadas pelo pagamento de dinheiro e não pelo convencimento das propostas, esse deveria sair da política.

Mas, como se sabe, esses políticos malandros não são, nunca foram e jamais serão altruístas a ponto de fazerem esse benefício à humanidade, humanidade que seria melhor se pudesse ver-se livre deles no exercício do cargo público e na administração da coisa pública.

Como corvos humanos, assumem cores diversas e deixam sua cor original – preta – para a situação social que encontra, que os realimenta e que se negrita ainda mais com a eleição, manutenção, permanência desses malas,... desses malandros...

A miséria que pagam a essas pessoas, prevalecendo-se da falta de condições econômicas e, às vezes, de escolaridade e consciência crítica, é um ato de subjugação dos fracos pelos fortes.

Enroladas ou desfraldadas, as bandeiras eleitoreiras, mais que mostrarem candidatos, revelam a situação dos seres humanos que as carregam e o modo como permanecerão:...

... ENROLADOS pelos políticos...

... e DEFRAUDADOS pela ação deles.

* EDMILSON SANCHES

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Foto meramente ilustrativa (em Santa Catarina, 2018).