Para longe, os comentários políticos. Que Costa e Silva resolva sozinho os seus problemas administrativos. Sim, que o gaúcho enfrente, corajosamente, tudo isso que aí está desordenado, provocando decepções e afastando o governo da popularidade, da confiança do povo. Sim, que tudo fique rodando nas limitações das intransigências, das conveniências etc. Que o custo de vida suba mais, suba até fixar-se no teto e provocar o desabamento da Casa Grande. É problema dele, dele “Seu Artur”. Sim, vamos sair do “cerco” e olhamos este domingo de Sol, de luz na abundância, no esbanjamento. Olhar este Sol que nos dá vida e calor. Olhar este verde lindo que está nas folhas, nas frondes das árvores seculares e dos arbustos que ficam na rebentação do desenvolvimento. Da vida em silêncio parindo raízes e produzindo flores e frutos. Sim, deixemos que tudo seja DOMINGO. Um DOMINGO eterno, eternamente iluminado. Nas praias, os banhistas, os não banhistas, um mundo de gente na “fofoca” dos divertimentos, das distrações. E, em tudo, uma paz, uma tranquilidade, a fuga das preocupações, dos compromissos. A fuga das tristezas e das decepções. Tudo tão romântico, tão bom, tão lindo, tão encantador. A Vida na vida de todos, nos sonhos de todos, na alegria de todos. Tudo assim tão íntimo, tão generoso.
E lá adiante o MAR. O MAR em golfadas d’água sobre a areia, sobre os banhistas que ficam no leito da terra molhada, com cheiro de sal.
O MAR crescendo em ondas, em fúria, quebrando-se em ondas, abrindo brechas, avançando em urros, em gritos, em espumas mansas, cheias de carícia. O MAR subindo em águas, cavalgando ondas que se partem em ondas, abrindo caminhos e que se avolumam querendo apossar-se de tudo: da gente, da Natureza, da paisagem, da Ilha no abandono de si mesma.
Tudo assim. E assim por toda a parte. Um céu azul, límpido, azul, vestido de promessas e que poderá ser alterado pelas nuvens escuras, pardas, pretas, ameaçadoras. Tudo isto assim, encantadoramente assim. As crianças jogadas nas ruas, nos parques de diversões, largadas fora, nas praças, nas ruas fazendo travessuras, criando dificuldades para toda a gente.
Tudo diferente hoje, hoje neste DOMINGO de Sol. Tudo tão feliz, tão tranquilo. Ali, na mesa, um poeta no silêncio de si mesmo, olhando o BAR, a freguesia, imaginando coisas. Tudo assim, assim fascinante, atraente, festivo, vestido de alegria. Tudo assim, a gente assim olhando a cidade, olhando as tradições, olhando o Passado e sentindo este Presente de renovações. Tudo bem, tudo tão feliz, tão encantador.
Tudo assim. Assim sem Costa e Silva e sem Delfim Neto. Tudo assim, democraticamente assim: assim tão feliz neste DOMINGO DE SOL.
E o poeta lá, lá consigo mesmo, no silêncio de si mesmo, recitando, em prece, um poema de Fernando Braga ou de Nascimento Moraes Filho ou, então, de outro poeta:
Um Sol em agonia
sombreia-se
de tristeza.
Há a vibração
das coisas esquecidas.
Tudo assim, encantadoramente assim
neste DOMINGO DE SOL.
* Paulo Nascimento Moraes. “A Volta do Boêmio” (inédito) – “Jornal do Dia”, 7 de janeiro de 1968.