O Brasil se vestiu de LUTO: o BRASIL-POVO, o BRASIL-POLÍTICO, o BRASIL-LETRA, o BRASIL-DIREITO. Morreu San Tiago Dantas. Era uma das mais fortes expressões da intelectualidade brasileira. O mestre do DIREITO. Uma unidade de forças mentais extraordinárias que o colocava na liderança das altas e honrosas funções da vida pública do país. Da tribuna da Câmara, quando iluminava com a sua presença, era o artífice da palavra, o orador fluente, o analista por excelência, a declinar o VERBO com o fascínio das argumentações irrefutáveis. Então, nele, revelava-se a grandiosidade de uma cultura sólida, profundamente humanista, dando de si a melhor e a mais rica contribuição para, examinando os problemas nacionais, dar ao país a valorização exata da sua posição política no confronto com os demais países do mundo. Da cátedra sobressaía o mestre insigne do Direito, na exploração justa dos altos princípios jurídicos.
Uma vida em luta constante na ascensão perene dos que vieram para a vida ungidos de sabedoria pela harmonia das conquistas imperecíveis. Toda uma existência no exercício de várias funções públicas, conquista natural da sua formação moral, política e intelectual. Um símbolo de energias construtivas, em bem da Pátria. Em bem do povo, das nossas relações diplomáticas. Lá fora, no exterior, em serviço dos interesses do Brasil, era um Rui com outras dimensões numa época de constante evolução de mudanças totais na fulguração de um século em marcha acelerada para a conquista de novas concepções políticas, sociais e econômicas.
Um símbolo de patriotismo. Das suas convicções. Havia, no mestre insigne, várias facetas de sua personalidade do homem público, acadêmico, homem de partido, homem de luta. E o aperfeiçoamento da sua composição no setor da política nacional está, justamente, não se ter fixado no amadorismo das ideias esdrúxulas, no estreitíssimo dos pensamentos convencionais, no aprisionamento de um sistema político retrógrado que não mais comportava a sua evolução cultural a que dele já exigia os arremessos de atitudes mais amplas, mais definidas, integradas dentro das coordenadas políticas e sociais que se vêm libertando dos grilhões, rompendo as barragens para se colocar na convulsão do momento nacional, tão valorosamente evoluído, acomodando-se plenamente, e com êxito, dentro da caminhada histórica da evolução em todos os sentidos que hoje, domina e arrebata todos os povos para assegurar, com mais profundidade, o fortalecimento do regime democrático.
E foi aí, por esta atitude de independência, que contra ele se abateram a fúria de todas as incompreensões de seus adversários, dos que ainda não quiseram sentir, no todo, a trepidante realidade que aí está empolgando todos os povos em luta por uma melhor condição de vida: uma Democracia evoluída, libertando-se do “congelamento” duma política divorcista e inadequada.
San Tiago Dantas rompia com o PASSADO para, mais fortalecido, viver no PRESENTE. Mais idealista, mais humano, mais independente. Era a reação natural que se fazem sentir e que encontra hoje, nos Estados Unidos (com a iniciativa de Kennedy), marcas indeléveis de grandes modificações no trato das relações diplomáticas.
Mas, morreu San Tiago Dantas. Uma lacuna aberta e de difícil preenchimento. Todo o Brasil no drama do Calvário de brasileiro ilustre. Toda uma Pátria no velório da consternação, da irreparável perda. Todo um povo na homenagem do patrício que soube morrer como viver soube, sem angústias e sem desesperos. Mas, na resistência, na luta, dando o exemplo da coragem cívica, na imolação da MORTE. E, dela, não se atemorizou. Sentia-a perto de si, sabia de sua presença no corpo, debastando-lhe as energias, esgotando-lhe as reações para garantir mais alguns momentos de vida. Enfrentou-a com serenidade e bravura. Tinha a noção exata da FATALIDADE tremenda. Inexorável. E, enquanto pôde, por si, tentava afastar-se do irremediável – a MORTE!
E certamente, em plena lucidez, que nunca perdeu, reexaminou todos os estágios vividos na vida pública: o professor, o escritor, o político, o ministro, sua vida em constante vibração de intelectualidade, de deveres. Rememorou os últimos instantes. E, certamente, mais uma vez, viu-se magnificamente realizado. Da Pátria teria recebido, no silêncio de seu quarto de doente, no Hospital Samaritano, o agradecimento pelo muito que fez por honrá-la, dignificá-la. Ali, até a ele chegou, acreditamos, os raios do SOL, num poente maravilhoso de um quadro de aquarelas – era a despedida da TERRA. Da Terra que deixava a sua condição de berço para, instantes depois, ser o túmulo, a “última morada”.
E seus olhos se fecharam. Seu corpo se imobilizou. Dantas deixava de viver, de existir. O Brasil inteiro perdia um dos seus filhos mais ilustres.
Daqui, mestre San Tiago Dantas, a homenagem simples, mas sincera, da imprensa maranhense por meio de um dos seus colaboradores. E, no Azul, uma estrela a mais na iluminação da NOITE. É o prêmio da Eternidade. É a imortalidade, mestre San Tiago Dantas.
* Paulo Nascimento Moraes. “A Volta do Boêmio” (inédito) – “Jornal do Dia”, 11 de setembro de 1964 (sexta-feira).