Senhores e senhoras
Eu não deveria estar aqui com a minha palavra, meus pensamentos, abrindo esta amostra de POESIA, inaugurar esta noite de autógrafos do poeta Carlos Cunha, homenagem que lhe é justa, promoção da página literária do JORNAL DO MARANHÃO, dirigida pela romancista Arlete Nogueira da Cruz, vigorosa expressão da intelectualidade maranhense e que conta ainda com a colaboração valiosa do proprietário da GALERIA DOS LIVROS que reflete o dinamismo e vontade determinada deste homem simples, amigo dos intelectuais da terra, Antônio Neves.
Não. Não deveria ser eu e sim um outro com melhor conhecimento do homem, da obra e da vida do homenageado. Entretanto não me pude fugir do convite a mim feito pela escritora Arlete Nogueira da Cruz, um nome já consagrado no cultivo das letras de nossa terra, este Maranhão de ontem, de hoje e de amanhã. Mas, em aqui estando, dirijo-me ao poeta e aos que me ouvem e mais a ele Carlos Cunha que nesta noite realiza o seu festival de arte e de poesia, oficialmente podemos assim dizer, fazendo entrega ao povo do seu primeiro livro de versos, intitulado POESIAS DE ONTEM.
Acredito que o fato marca mais um notável acontecimento no meio intelectual da cidade que tem em Carlos Cunha, sem favor do elogio, uma autêntica expressão desta vivacidade que o identifica como poeta, jornalista e professor na terra pródiga e no meio hostil como uma unidade palpitante de valor mental.
No autor de POESIAS DE ONTEM, há o poeta das divagações, espírito liberto do balofo das academias e pseudo e efêmeras escolinhas literárias, há o enamorado do Belo, alma inquieta no esbanjamento do talento. E se não encontramos nele o material amadurecido, a técnica desta poética submetida a determinadas exigências, o cuidado para as expressões refletidas, a lapidação escorreita, vigilante, nele, encontramos a poesia pura, banhada de luares, dubagem dos seus sentimentos em conflito, estonteamento de luz na paisagem das suas aspirações. Há, também, a selva que alimenta o espírito e que robustece o caráter, identificação de sua formação moral e intelectual. Há, nele, o poeta espontâneo, lírico, simbolista, romântico, mensagem da poesia que eterniza, que se imortaliza no tempo e se agasalha na alma do povo, do povo que gosta do simples, do simples que comove, que contagia, e que enternece e eterniza.
É a poesia sem atavios, é a poesia que traduz sentimentos mais íntimos e provoca emoções. Esta poesia é difícil porque não se submete, mas aflora da alma calcinada, afeita à dureza do tempo, da Vida em sacrifício, em luta, vencendo todas as dificuldades para atingir o aperfeiçoamento. É a poesia que se rebenta em luz, espraia-se e vai crescendo cada vez mais, atraindo, para si, a espontaneidade dos aplausos. Poesia humana, profundamente sentida, filosófica, social, mistura desta sensibilidade que tem poder de envolvimento. É a poesia que fica na alma popular, que se demora nos meios acadêmicos das letras imortais, assinala a sua presença, arranca da crítica sisuda e irreverente a adjetivação árida, imprecisa, às vezes, para logo depois, mais prazenteira, leve, assentar-se definitivamente na galeria delirante desta outra imortalidade onde se perpetua, galvanizando corações, transformando-se em tradição, em corpo e alma da terra.
Esta e não outra a poesia de POESIAS DE ONDEM. São poemas vivos dum poeta impressionista, poeta nato, alma no transbordamento dos sonhos mais lindos, boêmia da Vida do poeta, sua nostalgia, suas revoltas, sua mensagem de paz, de amor numa exaltação sublime de Beleza e de Arte.
Poeta Carlos Cunha, a festa é sua, tome conta da casa, da gente e do povo.
NR – Discurso pronunciado pelo colunista na noite de autógrafos do poeta Carlos Cunha.
* Paulo Nascimento Moraes. “A Volta do Boêmio” (inédito) – “Jornal do Dia”, 27 de maio de 1967 (sábado).