Diferentemente do Brasil, em que a educação para a mídia foi incluída em um documento que traz as diretrizes de abrangência nacional – a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do ensino básico –, os Estados Unidos, por causa do seu sistema federativo descentralizado, dão autonomia aos Estados de terem suas próprias legislações na área educacional. No caso norte-americano, a iniciativa de inserir o tema da educação midiática nos currículos parte, sobretudo, dos Estados e da própria comunidade escolar.
Em Rhode Island, o menor dos Estados norte-americanos, na Costa Leste, a educadora Pam Steager, representante local da Media Literacy Now, organização da sociedade civil de promoção de políticas em alfabetização digital, conta que a lei estadual sobre educação midiática aprovada em 2017 apenas recomenda que o tema seja colocado nos currículos escolares.
“Estamos no processo de trabalhar com o Departamento de Educação de Rhode Island e com as escolas para encorajá-las a colocar os materiais existentes sobre alfabetização midiática nos currículos, e identificando os atores importantes, como administradores de escolas e professores”, disse Pam.
Segundo ela, o ensino para a análise crítica da informação está se tornando importante no país e ganhou impulso após a campanha eleitoral em 2016, que elegeu o presidente Donald Trump. Pam conta que a discussão em torno das “fake News” (notícias falsas) veio à tona com mais intensidade naquele momento.
Para a diretora do Media Education Lab, organização que tem por objetivo expandir a educação em mídia, Renee Hobbs, tem sido “fascinante” perceber o aumento do interesse sobre o tema no mundo. “A questão das “fake News” trouxe a ideia de que educação midiática é parte da solução, e está aumentando o número de professores que estão se capacitando para lidar com o assunto”.
Renee, que é professora da Universidade de Rhode Island, não considera uma desvantagem o fato de os Estados Unidos não terem uma norma federal estabelecendo a educação para a mídia como uma política pública nacional. “Vejo que se esse tema tem o suporte dos movimentos de base, da comunidade local, isso o torna mais forte”, avalia.
A vertente de pesquisa do Media Education Lab é preparar conteúdos sobre o tema para os currículos escolares e para cursos “on-line” de treinamento de professores. “Os professores precisam de materiais para o currículo. Com o tempo, eles começam a modificar e adaptar esses materiais até criar os seus próprios”, diz Renee.
Segundo a educadora, na década de 1990, professores já começaram a usar reportagens de jornais como meio de estimular o pensamento crítico dos estudantes norte-americanos sobre atualidades. Ela avalia que a questão da desinformação ganhou maior relevância no país em 2015, com o início da corrida eleitoral.
“Tem que haver um ambiente propício na comunidade para que apoie o tema. Por isso, é importante alcançar os pais, os formuladores de políticas públicas, a opinião pública”, afirma Renee.
Na opinião do professor da Escola de Comunicação da Universidade de Miami, Alberto Cairo, mais do que ensinar o aluno a usar e criar tecnologias de informação, o sistema educacional deve investir na sólida formação humanística e ética dos alunos.
Projeto na aula de inglês
Na escola pública Albert Einstein, no Estado de Maryland, a professora de inglês Kerri Mauer percebeu a necessidade de dar ferramentas para que seus alunos na faixa dos 14, 15 anos pudessem compreender o que é opinião, fato, propaganda, sátira, conteúdo patrocinado e, principalmente, notícias falsas. Ela lembra que o fenômeno das “fake News” não é algo novo, mas ganhou muita dimensão por causa da “internet”, das redes sociais e dos aplicativos de mensagens.
O projeto de educação midiática na escola surgiu logo após as eleições de 2016 a partir das questões levantadas pela campanha presidencial. “Eles não entendiam o que era desinformação, onde buscar uma fonte confiável de informação, e diziam que usavam as redes sociais como fonte de informação confiável”, conta a professora, que teve a ajuda de uma especialista em mídia para montar o currículo.
Segundo Kerri, a escola usa vídeos informativos, faz seminários e encoraja o debate entre os alunos com exemplos próximos de sua realidade para analisar o conteúdo de diferentes mídias, para ensiná-los a achar fontes confiáveis e a distinguir fato de ficção na “internet”, “onde se posta todo tipo de coisa”.
“Queríamos empoderar os alunos para tomar decisões conscientes, para não serem enganados. Eles têm que aprender a usar seus celulares e as redes sociais de forma segura para ter informações confiáveis”, afirmou Kerri, que envia uma carta aos pais explicando os objetivos do curso.
A aluna Sachi, de 16 anos, que participou do programa piloto, conta que o que aprendeu não é para ser usado apenas na escola e esquecido depois. “É uma habilidade para a vida, de fazer a coisa certa no futuro”.
Atual aluno do projeto, Karl, de 14 anos, disse que a aula o ajuda a discernir o que é errado e certo nas redes sociais e em ter responsabilidade de não espalhar desinformação e boatos.
(Fonte: Agência Brasil)