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Zé Acúrcio e Zé Gentil: agora tem mais Zés no céu…*

Dois conterrâneos meus de Caxias (MA), dois Josés, acabam de mudar de vida. Deixaram a transitoriedade que é esse curto viver terreno e foram para um endereço definitivo, para sempre.

Nenhum dos dois esperou a manhã se fazer completa. Trabalhadores, saíram cedinho, com diferença de um dia para o outro.

José Acúrcio de Sousa Queiroz foi à frente. Primeiro, os mais velhos. Zé Acúrcio, como era chamado, tinha 84 anos e fez sua viagem definitiva nas primeiras horas de domingo, 14 de junho de 2020.

José Gentil Rosa, 80 anos, resistiu mais um pouco. O tempo suficiente para o amigo Zé Acúrcio abrir caminho e recebê-lo amistosamente no outro lado. Zé Gentil, como era conhecido, lutando pela continuidade de sua vida em uma UTI, não tinha como ver os primeiros raios de sol e foi amanhecer, sem dor nem sofrimento, em território celeste.

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José Acúrcio de Sousa Queiroz

Lembro-me do José Acúrcio de Sousa Queiroz quando eu fui estagiário do Banco do Brasil, dos 13 aos 17 anos. Menino ainda, eu via Seu Zé Acúrcio na agência. Alto, magro, discreto, quase um “lord” inglês.

Lembro-me da empresa que ele criou nos anos 1970, a Mavel – Maranhão Veículos Ltda., que também se tornou cliente do Banco. Eu era craque na preparação dos talonários de cheques das pessoas físicas e jurídicas, nossas clientes. Assim, fixei o nome do Zé Acúrcio e de muitos outros empresários e empreendedores, entre eles Alderico Jefferson da Silva, Antônio Apolônio de Alencar (que conheci desde que ele vendia a crediário, de porta em porta), Constantino Ferreira de Castro (e sua indústria Francastro), Edmar Gurgel Brasil, Francisco Bezerra (da Casa / Supermercado Bezerra, pai do Paulo, amigo e colega de escola, falecido ainda jovem), Hélio de Sousa Queiroz (irmão do Zé Acúrcio e pai dos amigos Carlos Maurício e João Antônio, colegas do Colégio São José), João da Providência Lima (da farmácia), Olavo Bilac Rego, Jonas Guimarães (e sua indústria Sanharó), Raimundo Nonato Saraiva de Carvalho (Nonato Babá, cuja filha Julieta, com o marido Manoel Rodrigues Neto, me recebeu em almoço em sua residência em Teresina), Raimundo Vilanova Assunção (o Dico Assunção, pai dos gêmeos e amigos João e Joaquim, vizinhos da Rua Afonso Pena), Salvador Moura (de longas conversas pessoais e por telefone), Santino Moreira Caldas (e seu Armazém Nova Aurora)... Tantos...

Se não estou enganado (mudei-me de minha cidade há décadas), Zé Acúrcio morava ou morou em bonita residência de cor branca no Largo de São Benedito (ou Praça Vespasiano Ramos), na continuação da Rua Afonso Pena. Assim, fomos quase vizinhos.

Que José Acúrcio de Sousa Queiroz descanse em paz.

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José Gentil Rosa

Nesta segunda-feira, 15 de junho de 2020, havia exatos 28 dias que José Gentil Rosa completara 80 anos de idade. Nasceu em Caxias, em 18 de maio de 1940, filho de seu Talmir Rosa e Dª Elizabeth Frazão Rosa (que morava ali na área da Rua do Pau d’Água – oficialmente, Rua Manoel Gonçalves). Na árvore genealógica de Zé Gentil, há também a família Farias, do coronel Manoel Farias, irmão de Maria dos Anjos Farias, que se tornou a mulher de Gentil Augusto Frazão, avô de Zé Gentil. .

Com sintomas da doença provocada pelo novo coronavírus e portador de comorbidades como diabetes, hipertensão e doença renal crônica, Zé Gentil foi levado, dia 7 de junho, de Caxias para Teresina (PI), onde resistiu por mais de uma semana até o suspiro final, por parada cardiorrespiratória, às 5h17 (segunda-feira, 15/6), no Hospital da Unimed, no Bairro Primavera, na capital piauiense.

José Gentil foi secretário municipal. A “veia” política veio do avô Gentil Augusto Frazão, proprietário de terras na região do Buriti Corrente, zona rural de Caxias, que foi vereador e presidente da Câmara Municipal de Caxias, além de ter tido um filho, o bioquímico Gentil Frazão Filho, que foi prefeito de Coroatá (MA).

Alguns poderiam dizer que José Gentil Rosa entrou “tarde” na Política, aos 42 anos. Mas já entrou vencedor. Em 1982, elegeu-se vereador de sua terra natal, Caxias, desempenhando seu mandato de 1º de fevereiro de 1983 a 1º de fevereiro de 1987. Nem terminara o mandato e, em 1986, já era eleito deputado estadual, a primeira de uma sucessão de vitórias para a Assembleia Legislativa do Estado do Maranhão. Foi deputado por três mandatos sucessivos, de 1º de fevereiro de 1987 a 1º de fevereiro de 1999, doze anos, correspondentes às eleições de 1986, 1990 e 1994. Em 2018, foi eleito pela quarta vez. O mandato, que iria até 1º de fevereiro de 2023, encerrou-se na segunda-feira, 15, após 16 meses e meio.

José Gentil Rosa teve seis filhos de duas uniões. De seu casamento com a professora e servidora pública Maria do Rosário Pereira Rosa foram cinco: Talmir, administrador e servidor público; José Gentil Filho, que morreu jovem, aos 17 anos, e teve seu nome dado ao Complexo Hospitalar Municipal Gentil Filho, o antigo Hospital Geral; Fábio, único dos filhos que conheço, que é engenheiro civil e prefeito de Caxias; Elizabeth, administradora e empresária em São Luís (MA); e a filha do coração Idenilde, graduada em Enfermagem e enfermeira no Serviço Público. Com Dª Auricilene (Auri), pedagoga, Zé Gentil teve um filho, Sebastião – nome do único irmão, falecido, de Zé Gentil.

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Conheci a professora Maria do Rosário Pereira Rosa. Ela foi minha diretora, em escola pública, o Ginásio Duque de Caxias, do Projeto Bandeirantes (projeto iniciado pelo governo maranhense em 1968). Inicialmente, o Duque de Caxias ou Bandeirantes ficava no Morro do Alecrim; depois, foi transferido para um grande prédio na Rua Professora Ana Correia, próximo ao Ginásio de Esportes João Castelo, ao Largo São Sebastião e, mais ao fundo, ao Cemitério Nossa Senhora dos Remédios.

Eu estudava no Duque de Caxias/Bandeirantes quando fui selecionado para ser menor estagiário do Banco do Brasil, aos 13 anos. Era secretária da escola a Márcia Maria Moura, filha do popular Antônio Fazendeiro, amigo de Zé Gentil e que também foi vereador. Na época de estudante, estive algumas vezes na residência de Dª Rosário, lá na Avenida Santos Dumont, logradouro que levava ao antigo aeroporto de Caxias, hoje um conjunto habitacional.

Ligado aos familiares, Zé Gentil emocionou-se muito quando esteve em Fortaleza (CE), em agosto de 2019, e pôde rever dezenas de parentes, no que ficou conhecido como o “Encontro dos Primos” – entre estes a servidora pública Ludce Frazão Machado.

Aliás, foi a Ludce Machado o pivô, com o testemunho do poeta Wybson Carvalho e de meu tio Raimundo João Gama Soares (o J. Gama), do encontro – que seria o último – entre mim e o Zé Gentil.

Foi no primeiro trimestre deste ano de 2020. Eu passava algumas semanas em Caxias. Estávamos em um quase meio-dia de domingo na Praça Vespasiano Ramos, o antigo Largo de São Benedito, na região central caxiense. Fui levado pelo poeta e jornalista Wybson para falar com o Fábio Gentil, prefeito, que também estava na praça. Mais adiante, sentado, com pessoas à mesa, estava o Zé Gentil Rosa, pai do prefeito. Logo ali ao lado, mas um pouco afastado, meu tio me esperava em outra mesa. Wybson, meu tio e eu começamos a conversar. Daí, chega Ludce Machado, fundadora e vice-presidente da Associação da Velha Guarda Caxiense, que me leva à mesa onde está o deputado Zé Gentil. No seu jeito Ludce de ser, Ludce Machado vai logo chamando a atenção de Zé Gentil e apresentando minhas credenciais. Ao final, tasca: “– Zé Gentil, sugere ao Fábio [prefeito] para tirar uns oito secretários e colocar o Sanches no lugar! Este é homem! É o cara! É caxiense dos bons!”

Todos em volta das mesas pareceram se interessar pela resposta de Zé Gentil. Antes disso, falei ao deputado que não se preocupasse e lembrei a ele os tempos em que eu estudava na escola pública (o Bandeirantes) que a mulher dele, à época, dirigia. Trocamos umas poucas e rápidas amenidades e procurei retornar à minha mesa, antes que José Gentil se sentisse obrigado a responder ou comentar assuntos que, evidentemente, poderiam ter tempo e lugar mais adequados para serem tratados – neste caso, nunca foram.

Sendo do chamado grupo de risco e sabedor da agressividade da doença covid-19, José Gentil Rosa mantinha-se em isolamento e tomava todas as precauções possíveis. Não foram suficientes. Aos 80 anos, com vitoriosa carreira na Política e um grande círculo de familiares e amigos, reconhecido por seus conterrâneos, Zé Gentil deixa de fazer leis, falar à tribuna, reunir-se com pessoas para tornar-se referência e verbete permanentes no dicionário político caxiense e maranhense.

A terra de onde ele saiu o recebeu de volta. Apesar das restrições acerca de aglomerações, muitas pessoas, em automóveis e motocicletas, em bicicletas e mesmo a pé, acompanharam o cortejo pelas ruas de Caxias até o repouso definitivo do corpo de José Gentil Rosa no Cemitério de São Benedito, que fica em frente à Praça Dom Luís Marelim, a querida Praça da Chapada, e ao lado da Avenida Santos Dumont, onde, décadas antes, viveu o conhecido parlamentar caxiense.

Com Zé Gentil confirmam-se os paradoxos, estranhezas e surpresas da vida: ele, que já sobrevivera a um acidente de trem e a outro, de avião, não resistiu a algo que sequer se vê a olhos vistos e arregalados. Como se diz, pequenas coisas derrubam grandes pessoas...

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Zé Acúrcio e Zé Gentil vão reforçar o time dos Zés lá por cima. Tem razão de sobra o excelente cantor, compositor e multi-instrumentista paraibano Jackson do Pandeiro (1919-1982), que também era Zé (José Gomes Filho): agora, na feira e nos céus, “tem mais Zé do que coco catolé”, aquele da palmeira anajá ou pindoba.

Depois de mais de 164 anos, somados, de vida e trabalho, os conterrâneos Zé Acúrcio e Zé Gentil mereceram a Paz Eterna...

“Requiescant”.

* EDMILSON SANCHES