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Lembrando o dizer horaciano do primeiro século antes de Cristo, não é sem razão que as guerras são abominadas pelas mães. Claro, as guerras matam os filhos e filhas delas – e os irmãos uns dos outros, amigos, conhecidos e, sobretudo, desconhecidos, mas todos que nem nós, com direito a viver uma vida em paz e positiva.
Os números de guerra são assuntos com que trabalham, mais, estatísticos e belicistas. São números tão grandes que o escritor russo Ivan Bunin (1870-1953) arriscou-se a prever: “Milhões de homens tomam parte nas guerras atuais; daqui a pouco toda a Europa será povoada apenas de assassinos”.
Resta aos familiares e amigos dos mortos a dor, o choro, o luto, a saudade, a irresignação; e resta-nos a nós humanistas também dor solidária, a perplexidade, a não concordância, a indignação – e, quase sempre, a impotência, a incapacidade senão a impossibilidade de fazer algo que não seja a expressão de não aceitação da bestialidade humana, a não tolerância, transposta pela voz e pela escrita e por sadios atos de inconformação e rebeldia.
E, já que toda vida importa, independentemente da origem do conflito, do país estimulador ou invasor, ou se é guerra covarde, declarada, ou impensada, civil, vamos juntar os quase QUATROCENTOS MIL sírios. Vamos somar os africanos. Sim, os africanos; quem se lembra deles?
De 1995 a 2015, em “apenas” vinte anos de conflitos, na África só crianças mortas foram CINCO MILHÕES todas elas com, no máximo, CINCO anos de idade, e TRÊS MILHÕES delas com, no máximo, UM ANO de idade. É um morticínio, genocídio, são assassinatos e outros crimes sem fim, com violências que vão dos massacres, extermínio de comunidades e estupros em massa, seres humanos barbarizados e mortos com machados e facões, além da formação de exércitos de crianças, que mal podem com a arma que carregam. Só em um ano (2008), na chamada segunda Guerra do Congo, morreram, pelo menos, CINCO MILHÕES E QUATROCENTAS MIL pessoas, grande parte, senão a maior parte, da fome que os conflitos acentuam ainda mais. Em Ruanda, em três meses (abril, maio e junho) de 1994, foram mortas nada menos de OITOCENTAS MIL pessoas. Em Darfur, região do país Sudão, outros QUATROCENTOS MIL seres humanos foram mortos desde 2003. A África, mãe de todos os povos, é o ambiente de uma das mais sangrentas, violentas mortandades do planeta, as quais não despertam semelhante preocupação e furor na comunidade internacional, ante a menor importância econômica e geopolítica mundial de suas 54 nações.
O vale de lágrimas e sangue e pedaços de carnes e ossos das guerras já trucidaram de DUZENTOS E SESSENTA E DOIS MILHÕES, no mínimo, a SEISCENTOS E SESSENTA E CINCO MILHÕES, no limite, em apenas TRINTA guerras e conflitos entre nações ou internas, fratricidas – a guerra civil, lembrando o Marquês de Maricá, é quando uma nação inteira comete suicídio.
A diferença de ataques chamados terroristas para situações de guerra é que, com o horror que ambas as situações despertam em pessoas e delas se apossam, o primeiro caso tem como elemento de distinção a surpresa, o inesperado, o imprevisível. No estado de guerra, há uma previsibilidade, um anúncio, espécie de “permissão” para que tudo possa acontecer, inclusive com civis, por mais desiguais e covardes que sejam os atos dos diversos lados (citando apenas Pearl Habor, pelos japoneses; Hiroshima e Nagasaki, pelos norte-americanos).
Ao final de contas, repito o que escrevi há anos em meu livro “Do Incontido Orgulho de Ser Caxiense”:
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– “Não se sintam desconfortáveis nem olhem para os lados, mas em volta de cada um de vocês gravitam 16 fantasmas.
É essa exatamente, segundo estudos demográficos internacionais acreditados, a quantidade de pessoas que já morreram para cada um dos 6 bilhões e 700 milhões [atualmente, segundo o WorldMeter, 7 bilhões 811 milhões] de seres humanos ainda vivos na face da Terra – entre os quais, nós. Já existiram cerca de 107 bilhões de pessoas no planeta [atualizando: já morreram 125 bilhões de seres humanos].
Cabe-me, senão por obrigação formal ao menos por praxe institucional, cabe-me, aqui, agora, dar visibilidade a um desses fantasmas, dar contorno a um grande espírito, falar de uma venturosa e aventureira alma. Evidentemente, nada a ver com sessão mediúnica ou tambores e terreiros – todos estes e tudo isto respeitadas manifestações de religião enquanto religação com os mundos etéreos, com os universos multidimensionais que nós, enquanto seres humanos, a eles ora buscamos (para superar a ignorância que é incompletude de conhecimento) ou deles ora desdenhamos – em nossa ignorância que é grosseria, egoísmo, incivilidade de sentimento”,
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Triste, mais, é confirmar-se que, muitas das vezes, senão quase sempre, a origem primeira, a causa e coisa inicial de um conflito mortal está ligada a PODER e DINHEIRO (“Follow the Money”, dizem os promotores de Justiça americanos). Padre Antônio Vieira, atual, afirmava ser “a guerra aquele monstro que se sustenta das fazendas, do sangue, das vidas, e quanto mais come e consome, tanto menos se farta”.
E pensar que, no estourar dos morteiros (para citar só o armamento que desde o nome leva morte com ele), uma guerra quase sempre é decisão de só duas pessoas...
Uma lástima que, se a vida é curta demais para ser miúda, os belicistas escolham ou aplaudam exatamente a forma mais destruidora e desumana de todas para amiudá-la ainda mais.
Humanos, lobos – vorazes – de humanos...
Hobbes, citando Plauto, tem razão...
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“Deve o mortal sensato detestar a guerra;
se ela todavia for inevitável,
os louros não serão de quem morrer lutando
por causa ignóbil, que afinal só traz desonra”.
(Eurípedes, século V antes de Cristo).
Aos mortos, Eurípedes, até os louros se lhes negam...
Aos mortos, as lágrimas.
Pelo menos.
Antes que nos sequemos todos...
* EDMILSON SANCHES
Foto do Museu de Imagens (Brasil): “Jan Rose Kasmir, uma jovem norte-americana, confronta a Guarda Nacional do lado de fora do Pentágono com uma flor nas mãos, durante uma marcha contrária à Guerra do Vietnã em 1967. Esse ato ajudou a colocar a opinião pública em desfavor da intervenção americana no Vietnã”.