
Neste janeiro de 2025, Edmar Gonçalves de Alencar superou seu ano de nascimento. Dia 10, completou 63 anos, um a mais do que a dezena do ano em que nasceu, 62 (1962).
Conheci o Edmar em Fortaleza ali logo no início dos anos 1990. Eu vivia me imiscuindo, espontaneamente, fortuitamente ou “a pedidos”, pelo meio de alguns nomes representantes da talentosa e produtiva, farta, fértil e forte classe artística do Ceará. Daqueles antanho, lembro-me do Calé Alencar (“Um Pé em Cada Porto”, de 1990, e “Estação do Trem Imaginário”, 1992), Acauã (“Desafio”, de 1990; “Pastagens de Virgulino”, 1993; e “Cabeças do Sertão”), Pingo de Fortaleza [João Wanderley Roberto Militão] (“Centauros e Canudos” e “Lendas e Contendas”); Bernardo Neto (“O Saco”, de 1987, com “Sumaré”, “Cora Coralina” e outras), Lucinha Menezes (“Divina Comédia Humana”), Fátima Goulart (“Nordestinados”), o humorista e ventríloquo Augusto Bonequeiro (Augusto César Barreto Oliveira, um cearense nascido em Pernambuco). Tenho – e mantenho, com zelo – diversos e dedicados discos, pinturas, livros e outras produções literário-musicais, artístico-culturais, desse imenso clã da família das Artes, que não esmorece ou ao menos não se entrega. Heróis da resistência cultural.

Para de longe “homenagear” o Edmar Gonçalves, escutei à exaustão, mas sem (me) cansar, a canção "Boi Magia", uma música-que é ela mesma uma homenagem do artista cearense ao Maranhão. Edmar Gonçalves é cantor, músico e compositor, artista plástico com uma “marca” particular que são rostos “guerreiros”. Tenho alguns trabalhos dele, com dedicatória no verso, para mim e minha mulher, na época.
O Edmar pintor é o artista sensível que vai da linha reta, geométrica, à geometria das curvas, humanas. Nus vivos e natureza morta. As casinhas do interior... Óleos e acrílicos em tela e em papel. Nanquim. Lápis. Xilogravura. O abstrato e o figurativo. O trabalho edmariano percorre o realismo, o surrealismo e o hiper-realismo. O abstrato e o figurativo, o pontilhismo e o cubismo, dentre outros.
Mas aniversários pedem som, canção, música – “Música, maestro!”. Escolhi maranhensamente a composição "Boi Magia" que é a primeira faixa do disco inaugural "Aprendiz". Afora "Isadora" (feita para sua filha, única), “Boi Magia” é a única das dez canções com dedicatória a alguém, e de certa forma marca os dias que passou na “Atenas Brasileira” capital e interior.

Como dito, Edmar dedica “Boi Magia” "ao Maranhão", e também ao músico maranhense Papete e a outros maranhenses, amigos comuns especiais – de Edmar e meus –, que nem Luiz Brasília (meu colega jornalista, produtor de TV e ativista cultural de Imperatriz) e Neném Bragança (a grande e premiadíssima voz de Imperatriz e região), ambos já falecidos; Carlinhos Veloz (recifense que quase nasceu em Caxias, onde foi gerado, e a quem, por meio da Câmara Municipal, dei o título de Cidadão Imperatrizense, por seu ativismo musical na região e por ser autor, entre muitas, da canção que é quase um segundo hino da segunda maior cidade do Estado – "Imperador Tocantins"), e Erasmo Dibel, o elogiadíssimo cantor músico e compositor nascido gente em Carolina, renascido músico em Imperatriz e reconhecido artista pelo Brasil.
Edmar Gonçalves de Alencar, apesar do grande talento, é "avis rara", não é assim tão aparecedor em termos de lançar suas músicas: em mais de trinta anos, de 1993 para cá, fez apenas três lançamentos: 1) o LP ("long-playing") de estreia "Aprendiz", de dez músicas; 2) o CD "Bússola", de 1999, com treze faixas; e 3) o álbum "Em Cima do Tempo", de 2017, com 14 canções.
Ao seu inaugural trabalho, “Aprendiz”, além dos artistas e técnicos da gravação e outros nomes da Música e da Cultura, “compareceram” em letras e músicas, imagens e agradecimentos gentes boas como meu amigo e tio de Edmar o Calé Alencar (excepcional músico, cantor, compositor e ativista cultural), Mano Alencar (também da família), Alceu Valença, Paulinho Pedra Azul (que elogiou Edmar em “show” público), Manassés, Caetano Veloso, Belchior (que deu aquela palhinha...).
Lembro-me de nossas idas à residência de cada um, ora Edmar indo ver meus livros e ouvir leriados, ora eu indo ao apartamento dele para ver e ouvir as obras de artes dele -- pintadas e cantadas. Há um tempo fui a Fortaleza, a convite de meu amigo e conterrâneo Gildomar Marinho, cantor, músico, compositor, gestor cultural e ativista musical. Fiz questão de descobrir onde agora “se escondia” o Edmar e o visitamos. Ali, em baita edifício próximo à beira-mar, nós três conversamos com muita alegria e saudades, que é o que ocorre quando uma espécie de cambo ou fieira atravessa, reúne e une a guelra ou goela dos espíritos que têm em comum a Arte...

Edmar Gonçalves de Alencar, até no nome involuntariamente reúne a expressão simbólica da grande cultura maranhense e cearense: “Gonçalves”, de Gonçalves Dias, o poeta maior da brasilidade, e “Alencar”, de José de Alencar, o grande romancista. Ambos, poeta maranhense e romancista cearense, eram contemporâneos e amigos e, juntos, no verso e na prosa, tornaram-se os “pais” do Indianismo e legaram ao País uma das mais genuínas marcas de sua... brasilidade; de sua identidade -- que está em seu povo, nos indígenas e tudo o que são, no território e nas florestas, nos animais e nas aves, em cantos e encantos...
Na sexta-feira, 24/01/2025, Edmar teve sua preciosa atenção dirigida a um texto meu, sobre o Elias do Boi, maranhense já falecido, cantador de toadas e dançador de boi com seu pequeno pandeiro. Elias do Boi – um personagem da cultura imperatrizense que foi carinhosa e doce inspiração pelas ruas da cidade e que tornava mais humana e saudavelmente ingênua e criança a Imperatriz que se tornava mais crescente e adulta. Edmar escreveu: “Boa tarde, meu amigo! // Lendo sua matéria sobre Elias. // Lembrei-me de quando uma das poucas vezes que estive em Imperatriz conheci o Elias com um pequeno boi tipo brinquedo que dançava na mesa do bar ao som de um pandeiro e toadas lindas. // Quando canto a música ‘Minha Cidade’, de Erasmo [Dibel] sempre me lembro dele e da História que você resgatou agora. // Forte abraço poeta.”
"Boi Magia", pequena grande obra do amigo cearense, é para ouvir e agradecer – porque é boa música e porque se deixou tocar e inspirar por nosso Maranhão também tão musical... Eis o “link” de “Boi Magia”: https://www.youtube.com/watch?v=WPuuJRCN78w .
Escutemos, prazerosa e agradecidamente, “Boi Magia”.
Pois, nessa música”, o “boi” é do grande Maranhão.
E a “magia”, é do grande mar... Edmar.
* EDMILSON SANCHES
Fotos:
O músico e artista plástico cearense Edmar Gonçalves, seu primeiro disco e algumas de suas pinturas.