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E agora, José?
No meio do caminho
tinha uma pedra. Aliás,
uma pedrada,
que é uma pedra
movimentada.

Dizem que a coisa
foi orquestrada
teleguiada.
Mas, Zé, compreenda:
há muita insatisfação,
e o povo passa fome, arrocho,
precisão.
Você, não.

É preciso se-
parar o joio
do trigo.
Mas onde está o trigo, meu Deus?!
Ele já não é subsidiado
– só o povo continua
subalimentado.

E o povo, já sem razão,
responde
com quatro pedras
na mão.

José, você que é,
que é católico, rezador,
talvez diga que nem só de pão
vive o “home”;
entanto, ouça:
acima da guerra,
há o grito da fome.

José, sabe como é:
o povo se contenta
com pouco.
Boca cheia
não grita.
Bucho vazio
deixa louco.

Sei, não precisa repetir:
atiraram a primeira pedra.
Mas, José, e por que a outra?
Lançada de catapulta,
com destaque em jornal,
apedrejaram o povo com a Lei
de Segurança Nacional.
Lei de Talião,
pagou-se com a mesma moeda.
Ou pedra.
(Mas, José,
duro
com duro
não faz
bom muro).

Não sei, José,
não sei como é.
Tudo serve
de exemplo.
E com pedra também
se constrói
um templo.

Vamos juntar todas essas pedras
e talvez, quem sabe, um dia
com elas terminaremos,
“não mais que de repente”,
o prédio transparente
da democracia.

E aí, povo forte,
Nação em pleno viço,
botaremos uma PEDRA
em cima               disso.

* EDMILSON SANCHES

As dúvidas quanto ao uso dos acentos gráficos ainda não terminaram.

Neste domingo, lembramos mais alguns casos.

Dicas gramaticais
1. SECRETÁRIA ou SECRETARIA?
SECRETÁRIA é a pessoa; SECRETARIA é o lugar.

REGRA:
Acentuam-se as palavras paroxítonas terminadas em ditongo:
SE-CRE-TÁ-RIA, a-é-reo, núp-cias, sé-rie, cá-ries, ób-vio, re-ló-gio, nó-doa, má-goas, á-gua, tá-buas, tê-nue, o-blí-quo, ár-duos, au-tóp-sia, fa-mí-lia, prê-mio, am-bí-guo, lon-gín-quo, en-xá-guas, de-sá-guam, mín-guem, bi-lín-gue...

OBSERVAÇÃO:
Não haverá acento se a palavra terminar em hiato:
SE-CRE-TA-RI-A, ele ma-go-a, ele a-ve-ri-gu-a, a-pa-zi-gu-a, ar-gu-o, que eu ar-gu-a, ele in-flu-en-ci-a, ele no-ti-ci-a, eu pre-mi-o, ma-qui-na-ri-a...

2. RÚBRICA ou RUBRICA?
O certo é RUBRICA.

É uma palavra paroxítona terminada em “a”. Se fosse proparoxítona teria acento.

REGRA:
Todas as palavras proparoxítonas (= sílaba tônica na antepenúltima sílaba) devem receber acento gráfico:
álcool, álibi, amássemos, amávamos,
cágado, científico, depósito, devíamos, êxodo, fôssemos, hábito, ímprobo, ínterim, ômega, pântano, plêiade, protótipo, repórteres, vermífugo...

OBSERVAÇÃO:
Cuidado com algumas palavras que não têm acento gráfico porque verdadeiramente são paroxítonas:
avaro, aziago, ciclope, decano, erudito, filantropo, ibero, inaudito, pudico, refrega, rubrica...

3. APÔIO ou APOIO ou APÓIO?
"APÔIO" e “APÓIO” não existem.
APOIO (ô) é substantivo: “Preciso do seu apoio”.
APOIO (ó) é verbo: “Eu apoio este candidato”.

REGRA:
Acentuam-se as palavras que apresentam ditongos abertos:
ÉU: céu, réu, chapéu, troféus...
ÉI: papéis, pastéis, anéis...
ÓI: dói, herói...

OBSERVAÇÃO 1:
Não se acentuam os ditongos fechados:
EU: seu, ateu, judeu, europeu...
EI: lei, alheio, feia...
OI: boi, coisa, o apoio...

Acrescentando...
“Deficit” e “superavit” tiveram grafia alterada pelo Acordo Ortográfico

“Não estão afastados os riscos de que o país volte a incorrer em grandes ‘deficits’ externos no futuro – e essa possibilidade exige atenção do governo”.

Antes do último Acordo Ortográfico, usávamos as grafias “déficit” e “superávit”, ambas com acento marcando a sua sílaba tônica. As palavras latinas tinham sofrido um aportuguesamento fora do padrão, que foi agora revogado.

Para entender melhor essa questão, convém observar que, na língua portuguesa, não há palavras terminadas em “t” – esse não é o nosso padrão gráfico. Um termo como “superávit” poderia receber o “e” final, adequando-se ao padrão de aportuguesamento, donde resultaria a forma “superávite”.

Ocorre, entretanto, que, com “déficit”, isso não seria possível sem deslocamento da sílaba tônica porque, em português, as palavras são oxítonas, paroxítonas ou proparoxítonas (estas com acento tônico na antepenúltima sílaba). Não há possibilidade, no nosso sistema, de acentuar uma sílaba anterior à antepenúltima. Com o deslocamento, teríamos algo como “defícite”.

Vê-se, assim, que o problema não é fácil de resolver. No sistema ortográfico antigo, optou-se pelas grafias “déficit” e “superávit”, que podiam receber o “s” de plural depois da consoante – mais uma solução fora do padrão ortográfico do português.

Com o novo acordo, essas formas voltaram à sua grafia latina (estão, agora, na lista de estrangeirismos do Volp, documento que registra a grafia oficial das palavras no território brasileiro).

Dessa forma, perderam o acento e passam a ser tratadas como termos latinos. Perdem, portanto, o “s” de plural e passam a ser tratadas como nomes de dois números. Temos, agora, as construções o “deficit”, os “deficit”, o “superavit”, os “superavit” - sem o “s” de plural.

O texto corrigido segundo a ortografia vigente: Não estão afastados os riscos de que o país volte a incorrer em grandes “deficit” externos no futuro – e essa possibilidade exige atenção do governo.

Nem tudo mudou com o Novo Acordo Ortográfico
Na verdade, as mudanças na ortografia do português brasileiro não são tantas como se imaginava. Na prática, muitas palavras mantiveram a grafia anterior. Ocorre, entretanto, que as pessoas, nem sempre familiarizadas com certa terminologia, passaram a ter dúvidas sobre pontos que não foram tratados no Acordo. Do ponto de vista gramatical, o antigo acento de eu “apóio” (que hoje se escreve eu “apoio”) não era um diferencial, mas grande parte dos usuários da língua imagina que sim, que seu emprego servia para distinguir a forma verbal do substantivo. Esse acento deixou de ser usado como todos os ditongos abertos em palavras paroxítonas, independentemente de haver homônimo.

Há quem imagine que os acentos das formas verbais dá (“Ele nunca ‘dá’ esmolas”) e dê (“Espero que ele ‘dê’ atenção ao caso”) sejam diferenciais, pois existe a preposição “de” e a forma “da” (contração da preposição “de” com o artigo “a”), e que, portanto, devem deixar de ser usados. De jeito nenhum. Esses acentos assinalam os monossílabos tônicos terminados em “a”, “e” e “o” (como em “pá”, “chá”, “pé”, “fé”, “pó”, “dó” etc.), regra que não sofreu nenhuma alteração.

Multifuncional, microcirculação, antienvelhecimento, lipoescultura, anticontrabando, por exemplo, não se modificaram. Já arqui-inimigo, autoestima, infraestrutura, antirrugas e anti-idade adaptaram- -se à nova convenção.

Teste da semana:
Assinale a opção que completa, corretamente, a frase abaixo:
“Ela _________ não sabia se as declarações deviam ir ou não ir _________ ao processo".
a) mesma – anexas;
b) mesmo – anexo;
c) mesma – em anexas;
d) mesmo – anexas;
e) mesma – anexo.

Resposta do teste: Letra (a).
A palavra MESMO, quando significa "próprio", é um pronome de reforço e deve concordar com a palavra a que se refere: "Ela mesma". O adjetivo ANEXO deve concordar com o substantivo a que se refere: "as declarações...anexas". Seria aceitável também a forma EM ANEXO, que é invariável.

Os protestos contra a morte de George Floyd tinham acabado de completar sete dias nos Estados Unidos (EUA) – e continuariam levando norte-americanos às ruas em cidades de todo o país por semanas – quando o livro de um autor brasileiro foi lançado. Não era exatamente um lançamento. O autor morreu há 112 anos, e o romance foi lançado em 1879. Resultado: a edição de “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Asssis, lançado, nos EUA, pela Penguin Classics esgotou-se em um dia. Nesta semana, já é possível comprar o livro no “site” da editora, tanto na versão impressa quanto na digital.

O “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, lançado pela Penguin Classics, ou “The Posthumous Memoirs of Brás Cubas”, como ficou a edição norte-americana, foi traduzido pela americana radicada no Brasil Flora Thomson-DeVeaux, que também assinou a introdução e é responsável pelas notas explicativas sobre o clássico de Machado. O livro tem prefácio assinado pelo escritor e editor David Eggers.

Em uma conversa com a Agência Brasil, Flora disse que o prefácio pode ter contribuído para “Memórias Póstumas” ter se esgotado em um dia, nos Estados Unidos, em meio a uma pandemia e a protestos raciais. O prefácio de Eggers foi publicado, antes do lançamento da tradução, na prestigiosa Revista “The New Yorker”, que já teve, entre seus colaboradores, autores como Truman Capote e J.D. Sallinger. Outro fator, na opinião de Flora, também é a vontade do leitor dos Estados Unidos IEUA) em procurar autores não brancos e que não façam parte do cânone norte-americano.

A tradutora também falou sobre a dificuldade de traduzir Machado de Assis e, também, por que aquele que é considerado o maior escritor da literatura brasileira não tem o mesmo reconhecimento no resto do mundo. “Certamente, a demora na tradução não ajudou. Ele chega à língua inglesa com quase 70 anos de atraso”, disse Flora. “A gente está tentando recuperar esse atraso até hoje”.

Agência Brasil
Por qual motivo a senhora acredita que a nova tradução de “Memórias Póstumas”, que foi publicada nos EUA pelo selo Penguim Classics, vendeu tão bem a ponto de se esgotar em um dia?

Flora Thomson DeVeaux
É um mistério que nem eu, nem a editora previmos, porque senão a Penguim teria feito uma primeira tiragem enorme. A gente ainda está tentando entender qual foi a alquimia que fez com que esse livro chegasse até às pessoas. Eu acho que teve dois movimentos, de certa forma complementares, de certa forma contraditórios. O prefácio do David Eggers foi publicado no “site” da “New Yorker”, que tem um alcance enorme, e a maneira como ele descreve o livro tem muita leveza. Ele fala que é um dos livros mais espirituosos jamais escritos, fala do humor, da inventividade e, ao mesmo tempo, foi um momento, enfim ainda estamos neste momento, em que as pessoas estão procurando ler mais autores não brancos, não [fazem parte] do cânone norte-americano. Enfim, tem essa tentativa também da parte de muita gente de se educar, de sair da caixinha em termos de referências. Essa é uma interpretação minha, só analisando o que estava acontecendo naquele dia, mas acho que pode ter muita gente que foi atrás do livro para se distrair, talvez, desse momento tão difícil, e pode ter gente que foi atrás do livro para se educar. Eu acho que existe uma chance de o romance ser recebido de maneiras muito diferentes por tais públicos. Portanto, é um fenômeno que, só com as leituras chegando, a gente vai entender melhor o impacto, entender melhor o que aconteceu.

Agência Brasil
Alguma coisa diferencia a tradução que você fez do “Memórias Póstumas” de outras que foram lançadas anteriormente, nos Estados Unidos?

Flora
Eu estudei, por extenso, as outras traduções. Então, posso apontar maneiras, elementos que diferenciam a minha tradução em termos de estratégia. Eu tive acesso a muitas ferramentas linguísticas e digitais que os outros tradutores não tiveram, porque as outras saíram nos anos 50 e 90, respectivamente, mas acho que essas são sutilezas. Tem algumas coisas que diferenciam a tradução já a partir da embalagem. Dá para dizer que é a primeira tradução anotada em língua inglesa. A Penguin é a primeira editora a apostar que isso seria necessário e interessante para o leitor em língua inglesa. Tem, também, o fato de sair não pela Penguin, mas pela Penguin Classics. É um selo que tem história, que tem um peso, é como se estivesse colocando Machado naquela prateleira da literatura universal. Se a Penguin Classics publica alguma coisa, você pressupõe que deveria conhecer. Eu poderia entrar em mais detalhes, em minúcias que diferenciam a minha tradução das outras, mas acho que é mais para especialistas.

Agência Brasil
A tradução de “Memórias Póstumas” chegou em um momento bem “peculiar”. Os Estados Unidos estavam, e estão, passando por uma pandemia e, ao mesmo tempo, vários protestos raciais em razão da morte de George Floyd. Para você, esses dois fatores, mais especificamente os protestos, podem ter influenciado de  alguma maneira no sucesso desta edição de “Memórias Póstumas”?

Flora

Podem, sim. Na verdade, quando eu fui pensando no lançamento, temi que as manifestações ofuscassem completamente o evento, porque, o que se sente muito nestes tempos é a urgência do momento. Uma semana particularmente conturbada. As manifestações pela morte do George Floyd tinham acabado de completar uma semana, estavam pegando fogo pelos Estados Unidos, e as redes sociais eram muito voltadas para organizar tais manifestações. Tinha muita coisa mudando o tempo todo e, nesse contexto, temi que um romance com quase um século e meio de vida ficasse escanteado, não chegasse agarrando as pessoas pela gola. Foi por isso, também, que foi surpreendente [a edição de “Memórias Póstumas” vender tanto], alguma coisa nessa mistura de fatores fez com que tivesse o efeito contrário. Isso é que eu não sei explicar. Eu teria apostado em um efeito contrário.

Agência Brasil
O fato de Machado de Assis ser um autor negro, isso pode ter contribuído de alguma forma?

Flora
Pode, certamente. Isso que eu digo de ter um momento em que as pessoas estão procurando se informar, o movimento de descolonizar o cânone, ler mais autores negros, mas eu não tenho certeza de que esse teria sido o principal motivo de as pessoas procurarem o romance. Quando a pessoa compra, ela não preenche um formulário explicando por que comprou. Está aí um mistério.

Agência Brasil
Qual foi a maior dificuldade em traduzir a obra de Machado de Assis e, mais especificamente, “Memórias Póstumas”?

Flora
É uma coisa muito curiosa. Tem um ensaio sobre Machado em inglês, tem um tradutor que, em determinado momento, disse que o Machado era muito fácil de passar para o inglês, e ele passou mais alguns anos traduzindo Machado, mas, no prefácio que fez de “Dom Casmurro”, falou o contrário, que Machado é traiçoeiro, justamente porque parece fácil de levar para o inglês. E ele não é. Quando você olha para o Machado, eu acho que os leitores da língua portuguesa veem mais normalidade do que a prosa realmente contém. Tem umas estranhezas nas colocações. Eu tentei prestar muita atenção em quando ele usava frases e expressões que me pareciam fora do comum para aquela época e, aí, reproduzir esse desvio no inglês, escolhendo frases e expressões tão obscuras quanto, mas o que se percebe mais do que uma frase, ou uma palavra, é que tem uma ambiguidade em Machado que é muito comentada em termos gerais, que a gente vê se manifestando em fenômenos como a dúvida, entre todas as aspas, sobre a traição da Capitu, mas essa ambiguidade, às vezes, está nos menores detalhes do livro. Quando você é obrigado a traduzir uma frase, você percebe, quando você lê, enquanto leitor, é isso que o Bento Santiago [personagem do livro “Dom Casmurro”, de Machado de Assis] fala dos livros falhos, dos livros em que os leitores são obrigados a preencher [as lacunas] por conta própria. O Machado escrevia assim. Quando você traduz, uma frase que você lê, parece que está tudo normal, mas, quando vai traduzir, percebe que ele não deu todos os detalhes, e aí é que você consegue mapear aquilo que o cérebro do leitor/tradutor está sendo obrigado a preencher. Você vê que ele deixou uma margem estratégica de dúvida. Então, é como preservar isso de uma forma adequada, que, às vezes, no processo de tradução, a gente é obrigado a se definir mais para um lado ou mais para o outro. Mas o que eu acho mais interessante é olhar várias traduções de obras do Machado, porque aí que a gente entende as possibilidades que estavam latentes naquela dúvida. Quando você coloca lado a lado as traduções, elas podem estar relativamente juntas, e aí chega um momento em que alguma descrição de um personagem, ou de um gesto, um aditivo, você percebe que as traduções disparam em sentidos diferentes. Isso é porque o Machado não entrega todas as informações de bandeja. Por mais que a informação não pareça esquisita num nível de inventividade linguística de um Guimarães Rosa, ele está fazendo uma coisa, jogando com a dúvida, com a ambiguidade num nível microscópico. É fascinante, são esses os desafios sutis de se traduzir os romances do Machado.

Agência Brasil
A senhora acha que Machado de Assis tem o reconhecimento merecido fora do Brasil?

Flora
É difícil falar em mérito na literatura. Eu acho que o Machado deveria ser mais conhecido. Ele mereceria mais destaque. Eu também estudei a recepção das traduções de “Memórias Póstumas de Brás Cubas” ao longo do século XX, e o que se vê, a cada ciclo de traduções, são brasileiros e machadianistas comemorando e dizendo: será que agora, finalmente, Machado vai ser reconhecido lá fora? Por isso, eu tenho certo ceticismo, porque, quando vejo a cobertura de hoje, penso no Eugênio Gomes [escritor e crítico literário brasileiro], no Raimundo Magalhães Jr. [jornalista, biógrafo e historiador] no começo dos anos 50 falando exatamente as mesmas coisas.

Agência Brasil
A senhora vê algum motivo para essa falta de reconhecimento de Machado no exterior?

Flora
Certamente, a demora na tradução não ajudou. Ele chega à língua inglesa com quase 70 anos de atraso – temos os primeiros contos traduzidos para o inglês no fim da década de 1910, mas não são divulgados amplamente. Então, Machado de Assis efetivamente chega aos Estados Unidos nos anos 50. Aí já são 70 anos de atraso em relação à publicação de “Memórias Póstumas”, mas ele já chega deslocado, chega como uma curiosidade, e eu acho que isso atrapalha a leitura, atrapalha o reconhecimento. A gente está tentando recuperar esse atraso até hoje. Talvez, este seja um argumento para fazerem mais traduções de literatura brasileira contemporânea, para não descobrirem um grande autor brasileiro só daqui a 70 anos.

Agência Brasil
O Machado de Assis aqui no Brasil é estudado no ensino médio, e não é uma leitura muito querida pelos estudantes. Por que a senhora acha que as obras de Machado, inclusive os contos, não são tão apreciadas pelos estudantes?

Flora
Eu não sei. Eu tenho quase vontade de sentar em uma sala de ensino médio e observar as aulas, o professor passando “Memórias Póstumas”, porque eu encontrei o romance aos 19 anos, li por conta própria no meio da faculdade e achei incrível, muito divertido. E fico me perguntando: se eu tive um encontro tão marcante com o livro justamente porque eu não era obrigada a ler. Talvez, tenha a ver com a maneira com que essas obras são apresentadas. Se o Machado de Assis já chega como uma grande imposição, engessada, em vez de ser uma leitura divertida, uma crítica social feroz, um modelo de escrita. Eu realmente não sei se tem algo que poderia ser feito para suavizar esse encontro, porque eu me recuso a acreditar que o problema esteja no livro. Eu li adolescente, e eu me encantei.

Agência Brasil
A senhora conhece outros exemplos de resistência dos jovens a autores clássicos?

Flora
Eu posso pensar na minha própria resistência no ensino médio a obras clássicas. “A Letra Escarlate” [clássico de Nathaniel Hawthorne publicado em 1850], por exemplo, que eu fui obrigada a ler. Eu acho que é fácil você encarar essas leituras como imposição, e não como uma descoberta. Não quero minimizar em nada o trabalho que um professor de ensino médio tem para animar os alunos a encarar a obra com mais boa vontade, mas eu consigo me identificar com esse aluno de ensino médio que está meio emburrado, que acha esse livro velho e chato. Só que, tendo lido muitas vezes, [vejo que] o Machado tem uma leveza de estilo, até comparando com contemporâneos. O Machado envelheceu muito bem. Quando eu ouço as pessoas falando em fazer uma versão simplificada, modernizada, penso que vai massacrar, não tem a menor necessidade. Não estamos falando de um texto medieval. O Machado, inclusive, tem elementos do português coloquial que consegue incorporar no ritmo da prosa – é uma das inovações dele.

Agência Brasil
Após esse sucesso de “Memórias Póstumas”, você tem planos de traduzir outras obras de Machado?

Flora
Muito provavelmente não vai ser do Machado, por um simples motivo: ressaca de doutorado. Todo mundo fica com vontade de respirar ares diferentes, tanto que, assim que defendi minha tese, eu me joguei na pesquisa para um “podcast” narrativo, que vai sair ainda este ano, sobre o caso da Ângela Diniz [socialite brasileira assassinada pelo companheiro, o empreiteiro Doca Street, em 1976, em Búzios, no Rio de Janeiro, em um caso de grande repercussão nacional]. São categorias completamente diferentes. Na minha próxima tradução, gostaria de fazer algo de um período diferente, de uma época diferente. Estou conversando, avaliando algumas possibilidades, mas nunca estive na posição de uma editora já se interessar por uma nova tradução – eu sempre fazia no meu tempo e, quando chegava a hora, botava embaixo do braço e saia batendo em portas. Então, é uma situação nova. De qualquer forma, ainda vai demorar, eu não tenho nada exatamente no forno.

Agência Brasil
Como é o “podcast” sobre a Ângela Diniz em que você está trabalhando?

Flora
Desde o começo do ano passado, estou trabalhando na Rádio Novelo, que é uma produtora de “podcast” aqui no Rio. É uma coisa circular. No primeiro ano de faculdade, eu comecei a estudar português e, também, jornalismo em áudio. Rádio sempre foi uma paixão, cheguei a estagiar em uma emissora de rádio pública nos Estados Unidos. Então, está sendo um reencontro com essa paixão a possibilidade de trabalhar com histórias em áudio.

Agência Brasil
E sobre o “podcast”?

Flora
Não posso adiantar muita coisa. É uma nova leitura desse caso, que teve um grande impacto nos anos 70 e, de certa forma, inspirou o movimento “Quem Ama não Mata”. A gente passou um ano e meio fazendo dezenas de entrevistas. É quase um documentário em áudio. Serão oito episódios. Estamos colocando os pingos nos is. Ele vai ser lançado nos próximos meses, não posso cravar a data ainda, mas não vai demorar muito.

(Fonte: Agência Brasil)

Balanço divulgado neste sábado (11) pelo Ministério da Educação (MEC) contabilizou 814.476 inscrições para o Sistema de Seleção Unificada (Sisu) do segundo semestre. As inscrições dos estudantes que participaram da edição de 2019 do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) foram encerradas nessa sexta-feira (10).

O MEC informou que 424.991 candidatos inscritos disputam 51.924 vagas ofertadas em 57 instituições públicas de educação superior do país. O resultado da primeira chamada do Sisu será divulgado na próxima terça-feira (14).

Em nota, o secretário de Educação Superior, Wagner Vilas Boas, disse que é “ gratificante poder encerrar esse ciclo e ver, nas redes sociais, as manifestações de satisfação dos candidatos ao conseguirem realizar suas inscrições com sucesso”.

Pela primeira vez, além dos cursos de graduação presenciais, o Sisu vai ofertar vagas na modalidade a distância (EaD). Além de ter feito o Enem de 2019, os interessados não podem ter zerado a redação. Estudantes que fizeram o exame na condição de treineiros não podem participar.

Segundo o Ministério da Educação, o Sisu foi desenvolvido para selecionar os candidatos às vagas das instituições públicas de ensino superior que usarão a nota do Enem como única fase de seu processo seletivo. A seleção é feita pelo sistema com base na nota obtida no Enem.

De acordo com o edital do Sisu, a ordem dos critérios para a classificação de candidatos é a seguinte: maior nota na redação, maior nota na prova de linguagens, códigos e suas tecnologias; maior nota na prova de matemática e suas tecnologias; maior nota na prova de ciências da natureza e suas tecnologias e maior nota na prova de ciências humanas e suas tecnologias.

Cronograma

Conforme cronograma divulgado pelo MEC, o resultado da primeira chamada do Sisu será divulgado no dia 14 de julho. O candidato que não for selecionado em uma das duas opções, em primeira chamada, deverá manifestar interesse em participar da lista de espera, por meio da página do Sisu na “internet”, entre os dias 14 e 21 de julho.

A partir daí, basta acompanhar as convocações feitas pelas instituições para preenchimento das vagas em lista de espera, observando prazos, procedimentos e documentos exigidos para matrícula ou para registro acadêmico, estabelecidos em edital próprio da instituição, inclusive horários e locais de atendimento por ela definidos.

(Fonte: Agência Brasil)

O presidente Jair Bolsonaro anunciou, nessa sexta-feira (10), a indicação do professor Milton Ribeiro para ministro da Educação. Ribeiro é doutor em Educação pela Universidade de São Paulo (USP), mestre em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e graduado em Direito e Teologia. Desde maio do ano passado, integra a Comissão de Ética da Presidência da República. O decreto de nomeação foi publicado em edição extra do “Diário Oficial da União”.

O cargo estava vago desde a semana passada, quando a nomeação de Carlos Alberto Decotelli foi revogada, sem que ele tivesse tomado posse, depois de várias inconsistências curriculares terem vindo à tona.

Ribeiro é o quarto ministro da Educação do governo Bolsonaro. Em declarações recentes, o presidente disse que estava buscando um nome de perfil “conciliador” para a função.

Milton Ribeiro tem uma trajetória ligada à Universidade Presbiteriana Mackenzie, onde foi reitor em exercício, vice-reitor e superintendente da pós-graduação “lato sensu”. Ele também fez parte do Conselho Deliberativo do Instituto Presbiteriano Mackenzie e da Comissão de Ética e Compliance da mesma instituição.

O currículo de Ribeiro informa que ele já atuou como representante da Universidade Mackenzie na Conferência New Frontiers in the Figth Against Corruption in Brazil at Columbia Law School, nos Estados Unidos, e como diretor-administrativo da Luz Para o Caminho, agência de produção de mídias da Igreja Presbiteriana do Brasil.

(Fonte: Agência Brasil)

É bom completar um trabalho, uma tarefa, uma missão.

É bom estar e sentir-se bem.

Ser movido a desafios, e não a dinheiro.

Estar na sede do poder, mas não ter sede dele.

Não prejudicar, se não puder ajudar.

Não roubar. Não chantagear. Não iludir.

Abraçar, não apunhalar.

Estender as mãos para auxiliar, não para extorquir.

Elevar, ao invés de fazer cair.

Não buscar fora, no mundo, o que só se acha dentro do próprio ser.

Sobreviver após a vida e, ao ser lembrado, sê-lo com a lágrima, não com o cuspe. Com reconhecimento, não com desmerecimento.

Ser lembrado com saudade. Uma saudade que até possa ser brindada com um sorriso que imortaliza, não com o só riso que ironiza. Uma saudade que diga que valeu a pena a nossa existência.

Assumir, doce e espontaneamente, a ingenuidade. E não se conformar com a esperteza, a malícia, a corrupção, a violência, o preconceito, o desrespeito, que só escavam para si côvados de cova.

Que bom enfrentar as dificuldades – e que ótimo não criá-las para os outros.

Ser bom. Se possível, ser com.

Ser humilde, mas não humilhado.

Ousado, não usado.

Incomodar-se, mas não se acomodar.

Ser um ser de esperança; portanto, um ser de inquietudes e angústias sadias.

Ser fúria e ser forte ante a violência menor; mas ser manso e criança ante o Mistério Maior.

Silenciar, quando estratégico; mas gritar, bramir, bradar, rugir, quando indispensável.

Reconhecer-se feito à imagem e à semelhança de Quem o fez, embora sem a perfeição do Bem/Feitor. Ter consciência de que é filho de Deus, não o próprio Deus.

Lembra-te, ó, ser humano: Tu não te tornarás pó – tu ÉS pó. És berro, és borra, és barro.

És pá, és pé, és pó.

A terra que violentas é tua mãe. O solo que pisas é teu irmão. Tu és homem, tu és húmus.

Entretanto, o essencial de ti não veio com o barro. Veio com o toque cálido dos lábios soprando o sopro vívido de Deus.

Tu és a tua alma. E ela é só o que tu tens – para, espera-se, devolvê-la, ao final de tudo, a Deus.

Adeus.

Bom fim de semana.

* EDMILSON SANCHES

O presidente Jair Bolsonaro editou medida provisória (MP) que abre crédito extraordinário de R$ 3 bilhões a Estados, municípios e ao Distrito Federal para o pagamento do auxílio financeiro ao setor cultural. A MP nº 990/2020 foi publicada hoje (10), no “Diário Oficial da União”.

A Lei nº 14.017/2020, que instituiu o auxílio, chamada de Lei Aldir Blanc, foi sancionada por Bolsonaro no fim do mês passado. As atividades do setor – cinemas, museus, “shows” musicais e teatrais, entre outros – foram uma das primeiras a parar, como medida de prevenção à disseminação do novo coronavírus no país.

O texto da lei prevê o pagamento de três parcelas de um auxílio emergencial de R$ 600 mensais para os trabalhadores da área cultural, além de um subsídio para manutenção de espaços artísticos e culturais, microempresas e pequenas empresas culturais, cooperativas e organizações comunitárias. Os Estados, municípios e o Distrito Federal serão os responsáveis pela distribuição dos recursos, de acordo com os critérios definidos na lei.

De acordo com a MP publicada hoje, os recursos serão liberados a partir da contratação de operação de crédito interna (contratos ou emissão de títulos da dívida pública). A MP tem força de lei a partir de sua publicação, mas ainda depende de aprovação do Congresso Nacional.

(Fonte: Agência Brasil)

Estudantes que participaram da edição de 2019 do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) podem se inscrever até esta sexta-feira (10), para o Sistema de Seleção Unificada (Sisu) do meio do ano. Serão oferecidas mais de 51 mil vagas em instituições de ensino superior do país.

Pela primeira vez, além dos cursos de graduação presenciais, o Sisu 2020.2 vai ofertar vagas na modalidade a distância (EaD). Além de ter feito o Enem de 2019, os interessados não podem ter zerado a redação. Estudantes que fizeram o exame na condição de treineiros não podem participar.

Inscrição

Por meio do “site” do Ministério da Educação (MEC), na tela “Minha inscrição”, o candidato poderá escolher até duas opções de cursos, por prioridade, na mesma instituição ou em universidades diferentes. Para fazer a primeira escolha, basta clicar em “Fazer inscrição na 1ª opção”. A pesquisa de vagas pode ser feita por nome do município, instituição ou curso. Após selecionar a opção, basta clicar em “Escolher este curso” para continuar.

Nesta fase, o candidato deverá indicar se irá participar do Sisu pelas vagas de ampla concorrência, pela Lei de Cotas (Lei nº 12.711/2012) ou pelas políticas afirmativas das instituições. No caso das universidades e dos institutos federais, os alunos de escola pública que se candidatarem às vagas reservadas serão divididos em grupo e subgrupo, conforme renda familiar e raça. Clique em “Escolher esta modalidade” para continuar.

Critérios

De acordo com o edital do Sisu, a ordem dos critérios para a classificação de candidatos é a seguinte: maior nota na redação, maior nota na prova de linguagens, códigos e suas tecnologias; maior nota na prova de matemática e suas tecnologias; maior nota na prova de ciências da natureza e suas tecnologias e maior nota na prova de ciências humanas e suas tecnologias.

Lista de espera

Segundo cronograma divulgado pelo MEC, o resultado da primeira chamada do Sisu será divulgado no dia 14 de julho. O candidato que não foi selecionado em uma das duas opções, em primeira chamada, deverá manifestar seu interesse em participar da lista de espera, por meio da página do Sisu na “internet”, entre os dias 14 e 21 de julho. A partir daí, basta acompanhar as convocações feitas pelas instituições para preenchimento das vagas em lista de espera, observando prazos, procedimentos e documentos exigidos para matrícula ou para registro acadêmico, estabelecidos em edital próprio da instituição, inclusive horários e locais de atendimento por ela definidos.

(Fonte: Agência Brasil)

Durante a pandemia de covid-19, os dispositivos eletrônicos com acesso à “internet” se tornaram um elemento fundamental na vida de muitas crianças brasileiras. Os “tablets”, celulares, “smart” TVs (televisor com acesso à “internet”) e os “videogames” se tornaram o único passatempo de muitas crianças e adolescentes, que estão confinados em casa há mais de 100 dias.

Para construir uma relação saudável, criativa e segura das crianças com o mundo digital, as famílias têm papel fundamental, diz a pesquisadora do programa Criança e Natureza, do Instituto Alana, Maria Isabel Amando de Barros. Segundo ela, para começar, pais, mães e responsáveis também precisam rever os hábitos digitais.

“Somos um verdadeiro espelho para as crianças. Nesse sentido, é muito bom compartilhar com elas que vários desafios estão postos também para nós: sentimos que a “internet” "rouba" tempo de outras atividades como sono, alimentação, atividade física e lazer. Muitas vezes, não temos clareza sobre os pensamentos, sentimentos ou impulsos que nos levam a pegar o celular e temos muito a aprender para, de fato, usar a tecnologia a nosso favor”.

É assim que a consultora imobiliária Carla Christiane de Carvalho Pereira procura orientar seu filho Caio, de 10 anos, e a filha Clara, de 8. “Oriento a pesquisar sobre significado das coisas, manuais, configuração da televisão, do celular, dos eletrodomésticos. Acho importante, já que eles têm essa facilidade com a tecnologia”.

Carla diz que faz acertos com eles e direciona os conteúdos a serem vistos, sempre com muito diálogo. Para jogos e navegação, eles só podem ficar até as 21h. “Não tenho muita regra de quantidade de horas, mas não pode usar nenhum tipo de tecnologia durante as refeições, durante as lições, não podem levar para o banheiro. São pequenas restrições, para educação mesmo. O restante do dia é liberado”.

Ela conta que sabe o que eles acessam e, quando tem algo que não acha adequado, conversa com eles. “O YouTube deles é monitorado. Sei o que consomem. O Caio vê muito tutorial de ‘vídeogame’, já a Clara vê músicas e desafios. As crianças nasceram preparadas para essa era digital, a preparação que a gente tem que fazer é na absorção de conteúdo. Quando o Caio vê um vídeo que tem muito palavrão, ou linguagem e conteúdo impróprios, converso com ele. Quantos aos canais da Clara, verifico quem a está seguindo e digo que só pode segui-la quem tem até 12 anos. Então, ela mesma fica atenta. Acho que a vigilância existe, mas é adaptável. Então, eu trabalho a questão do discernimento ao receber esses conteúdos, sempre com muito diálogo”.

Segundo a pesquisadora do Instituto Alana, os responsáveis devem seguir esse caminho, o do diálogo. “As pesquisas mostram que a principal estratégia para ajudar as crianças a terem bons hábitos é mediar sua relação com o mundo digital de forma construtiva, ou seja, mostrando os desafios e analisando como suas ferramentas podem nos ajudar a ter experiências ‘on-line’ onde prevaleçam as conexões significativas, os aprendizados com sentido e a diversão saudável”.

Maria Isabel explica que essa mediação ativa é diferente para cada faixa etária e deve ser adequada a cada criança, de acordo com sua individualidade e interesses. Deve, também, ser baseada no diálogo, na escuta e reflexão com a própria criança sobre a forma como ela se apropria das tecnologias.

“Há que se avaliar qual caminho faz mais sentido em cada fase da infância: dosar o tempo, considerar a qualidade do conteúdo, combinar onde e como os dispositivos podem ser acessados e, acima de tudo, fazer do mundo digital uma experiência compartilhada entre crianças e adultos, pais, mães e filhos, educadores e estudantes”, diz a pesquisadora. Para ela, “há outro aspecto importante: a construção de um sólido repertório de interesses, habilidades e rotinas ‘off-line’, que, certamente, irão ajudar a criança a desenvolver a autorregulação em relação ao uso do ambiente digital”.

Dessa forma, a consultora financeira Luciana Flávia Bonsembiante busca conduzir o filho Enzo, de 6 anos, no mundo digital. “Digo para ele ver conteúdos educativos, como os aplicativos de leitura, jogos voltados para a idade dele. Incentivo também para a criatividade. Ele adora gravar vídeo e tem um canal no YouTube. Então, eu procuro incentivar essa parte também”.

Quanto ao tempo, ela diz que há horários determinados para usar as telas. “Cerca de uma hora durante a manhã e mais uma hora à noite. A tarde é voltada para o estudo e algum tipo de educação física. A gente orienta sobre os conteúdos inadequados, sobre conversas com estranhos e, graças a Deus, nunca tivemos nenhum tipo de contratempo em relação a ele conversar com qualquer tipo de pessoa. Ficamos muito atentos porque é um perigo na época de hoje. Fora de casa, a utilização é muito esporádica, ele tem o próprio celular, mas, geralmente, evito que ele saia de casa com o aparelho”.

Ela conta que, às vezes, o filho quer ficar mais um pouco com o celular, mas aí ela o chama para outras atividades. “Gosto muito de brincar com ele de quebra-cabeça, lego. Ele adora montar e desmontar coisas e, assim, vai. É muito disciplinado e é bem obediente”.

Tempo de exposição às telas

No caso de crianças até 2 anos, a Sociedade Brasileira de Pediatria recomenda evitar exposição às telas. Para crianças de 2 a 5 anos, a recomendação é de até uma hora por dia, sempre com supervisão. Esse tempo pode ser estendido até duas horas por dia para crianças de 6 a 10 anos. Já crianças e adolescentes entre 11 e 18 anos devem limitar seu tempo “on-line” a duas ou três horas por dia.

“Entretanto, as pesquisas também mostram que o tempo de tela não é a medida mais relevante ou a única variável a ser considerada quando pensamos em cuidar da relação que as crianças estabelecem com o mundo digital. Afinal de contas, passar uma hora assistindo sozinho a filmes violentos, permeados por mensagens publicitárias, é completamente diferente de assistir em família a um documentário sobre música ou vida selvagem”, pondera a pesquisadora.

Maria Isabel acrescenta que é fundamental avaliar e refletir a intenção do tempo de tela: por que a criança vai ter essa experiência, o que ela vai aprender ou vivenciar com ela, a qualidade do conteúdo acessado e ainda se esse tempo de tela está impedindo que a criança realize atividades importantes como dormir, se alimentar, brincar ao ar livre e interagir com outras crianças e adultos.

Dieta digital

A pesquisadora Maria Isabel considera que uma forma de avaliar se um conteúdo digital é bom é semelhante a quando escolhemos o que vamos comer. “Numa boa dieta digital prevalecem conteúdos sem violência gratuita, conteúdos publicitários, notícias falsas, mensagens discriminatórias e desafios perigosos”.

Ela orienta que bons conteúdos são aqueles em que há respeito à privacidade e à identidade “on-line”. “São aqueles vinculados aos produtos e plataformas que respeitam nossa capacidade de desconectar e nos ajudam a encontrar espaço e oportunidades para brincar, criar, ler, desenhar, jogar, entre inúmeras possibilidades de encontros significativos conosco e com o outro. Em suma, bons conteúdos digitais são aqueles que trazem mais autoria - em oposição àqueles de uso mais passivo –, são acessados com intenção e nos fazem bem”.

Responsabilidade

Na visão da pesquisadora, a responsabilidade com o ambiente digital não é apenas do usuário. “É muito importante também percebermos – e compartilharmos esse aspecto com as crianças – que a responsabilidade por uma relação saudável, criativa e segura com o ambiente digital não é apenas do usuário. É também do governo, das empresas e das plataformas de tecnologia. É fundamental advogarmos por um ambiente digital mais humano, que proteja nossa privacidade, resguarde nossa capacidade de desconectar e fortaleça nossos laços sociais”, defende Maria Isabel.

Para contribuir com esse debate, o Instituto Alana, com o apoio do Nic.Br, da Safernet Brasil e do portal Lunetas, está realizando o evento “Ser Criança no Mundo Digital – série de conversas ‘on-line’”. Os diálogos serão transmitidos pelo Instituto Alana. A estreia da série de conversas foi no dia 26 de junho, e os dois primeiros episódios podem ser acessados em Episódio 1 e Episódio 2.

(Fonte: Agência Brasil)

Uma vida curta não é, necessariamente, uma vida pequena. A grandeza de uma existência não é expressa pela quantidade de dias decorridos entre a certidão de nascimento e o atestado de óbito.

Grandeza tem a ver com qualidade, intensidade. Dedicação. Grandiosidade.

No dia 1º de julho de 2020, completaram-se 100 anos de nascimento do poeta, declamador, jornalista e radialista Rogaciano Bezerra Leite.

Do município de São José do Egito, mais exatamente no Sitio Cacimba Nova, Povoado Umburanas, hoje território de Itapetim, em Pernambuco, onde nasceu em 1920, numa quinta-feira, até o Rio de Janeiro (RJ), em uma terça-feira, 7 de outubro de 1969, quando o coração do homem não aguentou a intensidade do artista, Rogaciano Leite caminhou caminhos nunca dantes caminhados pela maioria de seus conterrâneos nordestinos. Nesse itinerário de vida e ofício, Rogaciano, jornalista, escreveu reportagens premiadas; poeta, escreveu versos declamados; compositor, escreveu canções gravadas; declamador, recitou e interpretou poemas aplaudidos.

Os caminhos que Rogaciano caminhou levaram-no, no Brasil, de Norte a Sul do país, sendo destacado e distinguido tanto em Manaus, capital do Amazonas, referência da maior floresta tropical do mundo, quanto em Santos, em São Paulo, referência do maior porto da América Latina.

Os caminhos que Rogaciano caminhou, os ares por onde voou e os mares que atravessou levaram-no a países da Europa (Portugal, França e Espanha), de onde tirou fotos, informações e inspiração para escrever reportagens e outros textos.

O filho dos agricultores Manoel Francisco Bezerra e Dª Maria Rita Serqueira Leite, o marido da aracatiense Maria José Ramos Cavalcante, o pai de Rogaciano Leite Filho, Anita Garibaldi, Roberto Lincoln, Helena Roraima, Rosana Cristina e Ricardo Wagner, era um peripatético, andarilho, “globe-trotter”, em igual tempo sertanejo e cosmopolita, andando e ensinando, escrevendo e emocionando. Um homem homenageado. Conhecido e reconhecido.

Talento tão singular quanto plural – a ponto de ser Rogaciano um incomum caso de estudante a ingressar em uma Faculdade (de Filosofia do Ceará, em Fortaleza) para um curso superior (Letras Clássicas) apresentando uma obra sua (“Acorda, Castro Alves!”) e fazendo a prova vestibular de Latim em versos... mas versos alexandrinos, de 12 sílabas e outros que tais, e ainda evocando Cícero e Ovídio, consagrados escritores e poetas clássicos romanos dos séculos I e II antes de Cristo. Mereceu nota dez. Além disso, com sua atividade de jornalista e poeta o levando para muito além da capital cearense, onde estava a Faculdade, Rogaciano foi liberado da presença nas aulas e só comparecia nos dias de prova. Formou-se – tendo sido “o primeiro Cantador a alcançar um grau tão elevado”, como atestam os igualmente cantadores Francisco Linhares e Otacílio Batista, em sua “Antologia Ilustrada dos Cantadores”, obra publicada em 1976, com segunda edição em 1982.

Talento destacado também por seus pares. Foi amigo do poeta Manuel Bandeira, pernambucano que nem ele. O romancista baiano Jorge Amado que escreveu e o elogiou pelo poema a Castro Alves. Câmara Cascudo, o notável antropólogo, advogado, historiador e jornalista potiguar, fez a apresentação da principal obra rogacianiana, “Carne e Alma”, publicada por Irmãos Pongetti Editores, do Rio de Janeiro, em 1950. Na música, “monstros sagrados” da MPB clássica como Francisco Petrônio, Nélson Gonçalves e Sílvio Caldas, entre outros, gravaram composições de Rogaciano. Foi ele quem destravou as portas do tradicional e à época elitizado Theatro José de Alencar, na capital cearense, para os cantadores, os repentistas, os cordelistas, os agentes, fazedores e admiradores da rica cultura popular nordestina. Como jornalista, Rogaciano ganhou, em diversas categorias, nada menos que dois prêmios Esso de Jornalismo, além de uma menção honrosa. Não é pouco...

Em 1947, Rogaciano Leite veio ao Maranhão – esteve em São Luís e em Caxias. Intelectual, poeta e declamador, apresentou-se, por obra e graça dos amigos ludovicenses, no Teatro Artur Azevedo. Desse tempo, sobrevivem memórias em seus colegas escritores que o conheceram naqueles idos, entre os quais o advogado, ex-deputado e acadêmico Sálvio Dino e o advogado, poeta e crítico literário Fernando Braga.

Em Caxias, Rogaciano apresentou-se em noite concorrida no Cine Rex. Lembranças dessa apresentação ainda se mantêm presentes, por exemplo, em Arthur Almada Lima Filho, desembargador, escritor, acadêmico, e Frederico José Ribeiro Brandão, advogado, escritor, ex-deputado federal por São Paulo, que participaram do evento – ambos caxienses e meus confrades no Instituto Histórico e Geográfico de Caxias e na Academia Caxiense de Letras.

Conheci dois dos filhos de Rogaciano Leite: o Roga Filho, como alguns o chamavam, também jornalista e escritor, conheci-o em Fortaleza e até o homenageei em um poema, “Estoril”, sobre um bar e restaurante dos intelectuais e boêmios da noite fortalezense; e Helena Roraima Iracema Cavalcante Leite, engenheira civil, com estudos superiores em Economia Política e Social pela pela Universidade Complutense de Madrid, conheci-a em Brasília (DF). Rogaciano Filho faleceu em 5 de março de 1992, em São Paulo (SP). Helena Roraima, que mora há anos na capital da Espanha, conheci-a na Capital Federal, onde por anos foi minha colega, na assessoria da presidência da maior instituição financeira federal de desenvolvimento regional da América Latina.

É Helena Roraima que, com as limitações ditadas pela atual pandemia mundial, desenvolve, com competência e carinho, um esforço enorme para juntar os ecos, repercussões e ressonâncias de e sobre seu pai, documentados em matérias de jornais, fotografias de amigos, depoimentos de admiradores, enfim, tudo o que, espalhado na materialidade dos documentos físicos ou na digitalidade do universo virtual, possa (re)constituir um pouco dos muitos passos dados por Rogaciano Leite Brasil adentro e mundo afora.

Procurado por Helena Roraima décadas depois de nossas atividades em Brasília, juntei-me aos esforços da filha e, também, saí em busca de informações e pessoas que pudessem enriquecer e ampliar, ainda mais, o acervo que está sendo montado, para exposição em futuro evento pós-pandemia – o que também o farão as prefeituras de São José do Egito e de Itapetim, que já haviam elaborado grande – e adiada “sine die” – programação em homenagem ao ilustre filho pernambucano.

Por enquanto, um dos principais suportes de documentação e divulgação do acervo rogacianiano está no endereço eletrônico https://www.facebook.com/centenariorogaciano.leite.1 . Este “link” leva a uma página da rede social Facebook, criada e administrada por Helena Roraima. Nesse espaço, estão desde versos escritos até áudios, imagens, depoimentos etc. da breve vida e vasto mundo do poeta Rogaciano Leite.

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Não seria pedir muito que o centenário de Rogaciano Leite fosse comemorado com ele aqui presente, em carne, osso, alma e talento. Já não se estranha o completar-se um século de vida – até porque a Ciência anda aí anunciando que o homem bicentenário já está entre nós, ou seja, corre-se o saudável risco de um bebê que nasceu por estes dias ter festa de aniversário vivinho da silva em 2220.

Assim, especialmente hoje, morrer aos 49 anos parece uma afronta, uma indignidade ao ser humano, única criatura feita à imagem e semelhança do Criador... Dá para imaginar o quanto de potencialidades ainda flamejavam no íntimo mental de Rogaciano Leite. Mas, segundo os velhos latinos, “aquele a quem os deuses estimam, morre jovem” – ou, no idioma do antigo Lácio, que tão bem Rogaciano dominava: “Quem dil diligunt, adolescens moritur”. É frase de Titus Maccius Plautus, o dramaturgo romano Plauto, que viveu ali entre o segundo e o terceiro séculos antes de Cristo e que se teria abeberado em obra do grego Ménandros, o autor original da oração.

A valer essa máxima greco-latina, pode-se dizer que os deuses têm lá seus momentos de bom gosto: já cansados de bobos, truões e bufões em sua corte divina, nada como os deuses “pescarem”, no grande oceano da vida humana, alguém muito bom, que os pudesse deleitar com récitas ou recitais, canções e composições e, ainda, de quebra, pudesse escrever-lhes os perfis e seu cotidiano eterno.

Talvez Rogaciano Leite, sabendo dessa sentença, tenha imprimido um ritmo tão intenso na arte de escrever, fazer e viver em sua vida de 49 anos, 3 meses e 1 semana. Foram pouco mais de 49 anos que bem parecem cem.

Pois ele sabia: os bons, quando os deuses querem, correm o risco de partirem mais cedo...

Viva Rogaciano.

* EDMILSON SANCHES