Sabia que você estava acamado. Que uma doença pertinaz mantinha-o no leito, que o afastara, temporariamente, do exercício das suas obrigações, sua presença de quando em quando no Tribunal de Justiça, na conversa simples e, por vezes, picante com os seus colegas e amigos desembargadores. Sua presença na Casa de Antônio Lobo. Na palestra literária com os seus colegas acadêmicos. Na Praça João Lisboa, em paradas rápidas para demorar-se com algum amigo, para olhar o antigo Largo do Carmo da sua mocidade, da sua vida acadêmica, do jornalista que vivia em você, vibrante, escrevendo as suas notícias, seus comentários. Você na imprensa ao lado de Nascimento Moraes, de Ribamar Pinheiro, de Sousa Bispo, tantos outros que fizeram jornalismo sob a orientação do mestre Nascimento Moraes. E como você era amigo do Nascimento!
Sabia, Isaac, que você estava adoentado. E comigo no íntimo uma vontade encantadora: visitar você, conversar com o amigo, exigir de você a publicação do seu livro de versos. Relembraria esta insistência: “Isaac, publica o livro. Não vá deixar que cupim ‘acadêmico’ danifique seus versos, sua poesia romântica, parnasiana, impressionista”.
Com a sua poesia, a mensagem de tantas coisas, de tantos sentimentos, o descritivo em versos magistrais, alma no esbanjamento das emoções.
Mas não fui uma só vez lhe visitar! Olhá-lo no seu leito de enfermo, o corpo na prostração, todo você, certamente, uma vibração de vida sentindo, aos poucos, o desfalecimento das suas energias construtivas. Sua vida em luta, em resistência.
Revendo a sua infância, a sua mocidade, menino pobre vindo do interior do Estado, da sua Barra do Corda, onde você iniciou sua vida intelectual. Não pude, Isaac, uma só vez, visitá-lo, reviver para você um muito da sua valiosa participação no jornalismo local, escrevendo no vespertino “A Hora”, com Nascimento Moraes no comando, sustentando campanhas memoráveis. O “caboclo Isaac”, andar pesado, calado, encolhido no mundo das suas mais íntimas reflexões.
Mas, com você, uma “grande força de vontade, a tenacidade, a firmeza de resoluções inabaláveis”. Com você, a fulguração intelectual. Brilhante. Poesia humana, batismo de magia e de encanto. Com você, o estudioso. Formou-se em Direito. E firmou-se no Magistério Público. E, daí por diante, a conquista das promoções. E você realizava-se na vida pública deste nosso Maranhão. De longe, Isaac acompanhava seus passos. Seu lar. Sua família, seus filhos.
Isaac, não fui vê-lo um só momento. E, já na quarta-feira, recebia a notícia do seu falecimento, do seu enterro. Não sei, Isaac, se chorei. Sei, meu amigo, que muito tempo fiquei olhando você na vida, na luta, no trabalho. Um pensamento fixo em você, o poeta das coisas belas, o intelectual primoroso: talento e cultura.
Nem seu corpo na imobilidade meus olhos puderam ver. Nada, Isaac. Mas estou escrevendo para você. E você, acredito, está lendo esta página. Simples. Iluminada de recordações. Homenagens do Paulo Augusto, este Paulo Augusto que você viu criança, estudante do Liceu, ao lado do Nascimento, nas redações dos jornais. E você dizia, referindo-se a mim, para o mestre – “Nascimento, este menino vai longe”.
Não, Isaac. Não consegui ir muito longe. Mas também não fiquei muito perto. Hoje, pode você sentir melhor estas coisas: a Vida, a luta, a resistência para não sucumbir de todo, principalmente quando se é filho de intelectual. Mas, Isaac, aqui está a minha mensagem de saudade e de lembrança.
Você continuará vivo no coração de seus amigos e presente nas tradições de cultura de nossa terra. Vivo no coração de seus filhos, da esposa. Vivo nas ruas desta São Luís que você tanto amou.
E desculpe, Isaac, a minha ausência.
* Paulo Nascimento Moraes. “A Volta do Boêmio” (inédito) – “Jornal do Dia”, 8 de abril de 1967 (sábado).