Com votação recorde pela “internet”, cerca de 57% a mais do que a edição anterior, o Festival de Música da Rádio Nacional revela os finalistas que vão para próxima fase. Foram 319 músicas inscritas, um nível elevado de qualidade e grande participação de novos artistas.
Para o organizador do festival e gerente de programação da Rádio Nacional, Carlos Senna, não foi fácil escolher as melhores músicas. “O trabalho de avaliação e seleção das músicas foi difícil, mas acho que conseguimos chegar a uma lista de finalistas que contempla a diversidade e competência da produção musical de Brasília e do Entorno do Distrito Federal (DF)”.
Veja a relação de finalistas do Festival de Música da Rádio Nacional FM 2020
A Engrenagem – “Era pra ser Relax”
Casacasta – “O Melhor Lugar”
Daniel Rodrigues e Breno Alves – “Aqui Também Tem”
Forró do B – “A Onda que Leva e Traz”
Henrique Neto e Carlos César – “Samba Lenoir”
Ian Coury Trio – “Me Deixa”
Jeninpapo – “Ilha da Madeira”
Júlia Carvalho – “Foice”
Kirá e a Ribanceira – “Dia de Feira”
Mickael Pederiva – “João Ninguém”
Trio Shaloshinno – “Que Mêda”
Zé Krishna e Amigos Eternos – “Ganga River”
Votação
Para conhecer e escolher a música preferida, basta acessar o “site”. A escolha popular de Música Mais Votada pela “internet” vai até o dia 4 de dezembro.
Nesta edição, são sete categorias de premiação: Melhor Música com Letra; Melhor Música Instrumental; Melhor Intérprete Vocal; Melhor Intérprete Instrumental; Melhor Letra; Melhor Arranjo e Música mais votada pela internet.
Presença “on-line”
Este ano, por causa da pandemia do novo coronavírus, o festival passou por adaptações tais como a maior presença “on-line”. Além da inscrição e da votação, os participantes também puderam enviar vídeos com as músicas selecionadas. E, para evitar a aglomeração de pessoas, a tradicional festa da final não contará com a presença do público, mas está prevista uma transmissão ao vivo com o resultado dos vencedores, no dia 4 de dezembro, além de um “show” que será exibido na TV Brasil.
História
Tudo começou em 2009, no Teatro Silvio Barbato, onde também foram realizadas as edições de 2010 e de 2011. Com o sucesso de público e o aumento da participação de concorrentes, a festa passou pelo Teatro Garagem do Sesc (2012), pelo Teatro do CCBB (2013) e pelo Cine Brasília (2014), até chegar ao Teatro da Caixa Cultura, onde o festival é realizado desde 2015.
Ao longo dessas 12 edições, foram mais de 4 mil músicas inscritas, milhares de execuções das músicas classificadas na programação da Nacional FM, acessos e votações recordes no “site” do festival, programas especiais apresentados pela TV Brasil, lançamentos de CDs com as músicas finalistas e a participação vibrante de torcidas nos “shows” das finais.
Creio ser esta a primeira vez que a Academia Maranhense de Letras comemora o seu aniversário de fundação, com a solenidade de posse de um acadêmico. Um ato que se associa a um fato, na coerência com que ambos se atêm à vida da agremiação, em sua renovação e em sua permanência. Tomar posse é simbolicamente fundá-la de novo. O 10 de agosto já é uma data roubada a Gonçalves Dias para ser, no tempo, o marco oficial que introduz a Academia na história literária do Maranhão. Agora é a data de que se serve Paulo Nascimento Moraes para penetrar esta Casa e nela ocupar a Cadeira de nº 16.
Não sei se devo primeiro parabenizar o poeta Paulo, que aqui chega em tão boa hora, ou se devo parabenizar a Academia, que o recebe como um presente que o Maranhão literário lhe dá, nesta noite festiva. Só sei que os dois acontecimentos são, em resumo, homenagens que se acumulam sobre a memória de Gonçalves Dias, núcleo inspirador de onde a Academia tira a sua razão histórica e a força com que se tem mantido cada vez mais viva, mais atuante, ao longo dos seus setenta e quatro anos de existência. A Casa de Antônio Lobo sente-se duplamente em festa, e esta alegria dobrada também se desdobra no tempo e vai tocar o espírito daqueles que, neste mesmo recinto, nesta mesma data, implantaram, em 1908, a imortalidade acadêmica. É em presença deles que aqui estamos, porque assim a nossa memória o diz. E eles estão felizes com a chegada aqui do novo acadêmico pois isso reafirma a concretização do que idealizaram.
Não preciso apresentar o Paulo à Academia nem a Academia ao Paulo. Ambos se conhecem de longa data. Não tenho, pois, necessidade de abrir o presente diante da aniversariante, para que ela assim pudesse alegrar-se, como colhida por uma surpresa agradável. Paulo já era esperado por ela. E a grande alegria está em que, sendo tão esperado, veio. E veio para ficar, como ele próprio já disse. Essa afirmação parece desnecessária, mas é significativa, pois a família Moraes não é estranha a esta Casa. Nem poderia ser. A Academia sempre deu a acolhida que ela merece, a partir do velho Nascimento Moraes, grande jornalista e grande professor, que muito a honrou e que dela foi um digno presidente. E sabe a Academia que nenhum Moraes chegou aqui que não fosse de livre e espontânea vontade.
Mas Paulo não vem simplesmente por ser Moraes. Vem, sobretudo, por ser ele próprio, na força de sua individualidade, no potencial humano e na riqueza de alma com que encarna o espírito coletivo e a maranhensidade legítima de toda urna geração que marcou lugar definitivo na história de nossas letras. Paulo é uma época, um estado de espírito ou a razão viva de uma das inúmeras formas que o maranhense usa para exprimir a sua intelectualidade. Paulo é povo, no que esta palavra tenha de mais autêntico. É gente, no quanto mergulha a reavida pureza daquele substrato maranhense, que é fermento de tempo, mas que nele se transmuda em humana marca de pessoa para quem o patrimônio maior é a amizade sem interesse, a solidariedade sem tropeços. Paulo emerge daquele envolvente universo literário que, por sinal, persiste ainda um pouco entre nós, e onde quase só pontificava a intelectualidade boêmia, através da qual inteligências brilhantes e luminosos talentos se cruzavam em eventos memoráveis, para instantes de fulgurações retóricas que encantavam multidões.
Não se pode esquecer uma certa tendência que o Maranhão sempre teve para o que se poderia chamar de literatura-show, pautada numa espécie de pirotecnia imagística de deslumbrantes efeitos auditivos. A história nos fala dos inesquecíveis saraus, nestes velhos sobradões de São Luís, com a presença de grandes conferencistas, de grandes oradores, de grandes improvisadores, de grandes declamadores e de quantos sabiam eletrizar os ouvintes, pela palavra que lhes caía fácil dos lábios. De posse dessa magia verbal, muitos operaram verdadeiros prodígios, em seu tempo. E tamanho era esse fascínio pela oralidade, que disso resultou que algumas gerações acabassem por nos dar aqueles que hoje conhecemos como escritores sem livros.
Ainda neste século, Coelho Neto, embora escritor de tantos livros, parece ter referendado essa tendência, com sua capacidade de improvisação, que o fazia mestre na arte de usar o circunstancial para uma literatura de efeito rápido, preparada à minuta e transformada em mero espetáculo público, ao gosto da plateia. O Prof. Rubem Almeida deixa bem claro esse aspecto, quando nos fala da segunda visita daquele escritor a São Luís. Diz ele: “Hospedou-se na morada inteira do Largo do Palácio, residência de Manuel Alves de Barros, Manduca Barros, na intimidade, onde, por nosso alvitre, foi colocado um livro de presença. À noite, após o jantar, já era enorme a aglomeração em frente da casa, aos gritos de apelação: – Coelho Neto! Coelho Neto!
Coelho Neto apareceu à janela sob delirantes aplausos.
– Digam, meus amigos, o tema que deseJam.
– Amor! Saudade! Beleza!...
Escolhendo o tema primeiro proposto, Coelho Neto, de improviso, fez belíssima dissertação. Esta cena repetiu-se todas as noites, sempre com temas diversos, propostos pelo povo”.
Entre outros episódios então ocorridos, cita o Prof. Rubem este: “Vinha a romaria da estátua de Gonçalves Dias ao crepúsculo de 31/11/16, tendo à frente Coelho Neto. Ao passar em frente ao Quartel do 25º BC, o oficial e a guarda saíram para a cerimônia do arriar da bandeira. Heitor Belfort, dos maiores entusiastas de Coelho Neto gritou, num grito que era um pedido:
– Hino à Bandeira, Coelho Neto!
Não se fazendo esperar, começou o orador: – “Pavilhão esplendoroso de nossa terra, cujas esferas e estrelas são o próprio céu e as próprias estrelas do Brasil; tu que sempre panejaste altaneira e soberana nos dias de paz e nos dias de guerra, ouve contrita este hino, que mais vale de prece, partido dos lábios de um filho que pelo sangue materno se julga com direito a entoar-te...”
Acrescenta o Prof. Rubem que, “assim nesse fraseado, com o valor da renda caprichosa, Coelho Neto entoou hino formoso à Bandeira Nacional”. O resultado, segundo ainda Rubem, foi que “logo ao início da oração, o oficial deu ordem à guarda de suspender a cerimônia. E comandante, oficialidade, soldadesca, todo o quartel, enfim, veio postar-se em frente do edifício. A ovação recebida foi a maior de todas. E a Bandeira, contra o regulamento, foi arriada às sete horas da noite”.
Está aí uma das características bem maranhenses no que diz respeito ao uso e vulgarização do talento literário. E era isso uma manifestação já tardia da fase áurea do beletrismo calcado na floração verbal que sacudia os salões burgueses, com aquela literatura definida como “o sorriso da sociedade”. Também isso parecia deixar evidente, desde cedo, uma verdade que o tempo veio comprovar: que Coelho Neto era, de fato, mais para ser ouvido do que lido, apesar das dezenas de obras que deixou. Ficou como um símbolo. Era o “show-man” das letras, a queimar-se, consumindo-se, no fogo da oratória, para encantamento de quantos tiveram a felicidade de ouvi-lo.
E vem talvez daí o enorme surto de inúmeros talentos que em São Luís só se fizeram escutar, não se fizeram ler. Confiavam na tradição oral maranhense, aliás tão forte, na verdade, que ainda hoje o que mais algumas pessoas lembram de Gonçalves Dias, por exemplo, não é a “Canção do Exílio”, tantíssimas vezes publicada, mas um poema de circunstância atribuído a ele e que não aparece em nenhuma de suas obras. A memória auditiva supera aqui a memória visual. Temos um povo afeito mais ao ouvido e isso talvez até explique a sua tradicional indiferença pelos arquivos, o seu descuido com relação aos documentos históricos. Já Antônio Lopes, quando escreveu a “História da Imprensa no Maranhão”, dizia o seguinte: “O Maranhão dispõe apenas de dois arquivos desorganizados e que perderam, por via do desleixo dos homens e da ação de traças e cupins, muito mais da metade dos papéis e livros ali amontoados durante mais de quatro séculos”.
Ele devia saber que aqui os estudiosos têm de fazer o milagre de recompor do pó a imagem de um passado que, em certos casos, se sustenta, na memória, mais sob a forma de tenda do que de verdade histórica. É evidente que em nossos dias essa tendência auditiva vem perdendo sua força, até porque a televisão tem contribuído muito para que o mundo se transfira dos ouvidos para os olhos.
Mas Paulo vem ainda de uma geração boêmia, orientada mais para o dizer que para o escrever. Geração de oradores, de conferencistas, de declamadores e daqueles que até se sentiam publicamente envergonhados quando eram obrigados a apresentar um discurso escrito. Primavam pela expressão oral, quando tudo havia de ser som e sonho e num tempo em que a musicalidade dos dias vinha de cada um em particular e não por imposição de máquinas massificadoras como hoje. Dentro da atmosfera literária que, para os boêmios, era sempre festiva, intelectuais e músicos se associavam e construíram assim um mundo vibrátil de que São Luís é ainda hoje a caixa de ressonância. Não é por outra razão que Paulo sente, até agora, ressoar, no tempo e dentro de sua alma, o saxofone de Paulinho Almeida ou de Jofran Moraes, o violino de Lauro Leite, o piano do Madeira, o rebecão do Roque, o violão de Custodinho, de Hildebrando ou de Mundico Pretinho. Todos eles juntos fizeram vibrar a corda lírica de uma época encantada, para a qual o Maranhão tinha uma acústica própria e um sentimento como que feito sob medida. Eles são ainda hoje a música de fundo de uma poesia que no imenso das noites a cidade continua a declamar.
E é daí que Paulo traz essa saudável jovialidade, esse espírito alegre de criança sempre deslumbrada com seu brinquedo, esse ímpeto interior de pujança anímica que ele faz explodir em sua inconfundível gargalhada, como uma reação ao fluxo de tragicidade dos nossos tempos. Paulo extraiu da própria vida o direito de gargalhar. Para ele, rir é pouco. Se lhe perguntarem a razão disso, ele responderá apenas com uma gargalhada. E embora boêmio de velhos tempos, não é, como se podia esperar, um saudosista, pois se comporta, por assim dizer, como o continuador autêntico e alegre de uma São Luís outra, que não parou, porque nele se mantém personificada e viva. Mas é o boêmio fixado no seu espaço histórico, na atmosfera centrada da urbe colonial e aí habituado, a ponto de quase não poder respirar, quando, por acaso, posto na expansão urbanística desses inúmeros conjuntos habitacionais, onde, deixado sozinho, ele se sentirá desorientado e perdido, não sabendo mais voltar. Na sua opinião, esses são lugares onde a gente habita, mas não se habitua.
Fiel à velha cidade, o boêmio dela não se afasta. E a cidade tem nele o testemunho de atos e fatos que a fizeram lírica e romântica, quando não, algumas vezes, épica ou trágica. É o exemplo, hoje raro, do homem na cidade e da cidade no homem, pois São Luís está encarnada nele, tomando-lhe a alma e a pele, para mostrar a força do seu condicionamento histórico e de sua herança étnica. A cidade absorve o boêmio. E o boêmio bebe o espírito da cidade, bebe a alma das ruas e bebe os últimos silêncios enluarados, nas madrugadas de alguns logradouros suburbanos. O boêmio sabe que São Luís é dotada de uma ternura líquida que faz muito bem aos que a bebem para embriagar-se de amor.
Mas os que só veem o boêmio de modo superficial pensam ser ele apenas um poeta que bebe no Bar do Zequinha ou na Base do Cabral, lá onde nunca falta a marca de cerveja de nossa preferência, que não será revelada aqui, para que os maldizentes não fiquem a imaginar que esta posse está sendo patrocinada. Paulo tem ali as ambiências mais constantes do seu beber compromissado com a poesia da vida. Não bebe para curtir frustrações nem para apagar mágoas. Bebe para conter o tempo na dimensão exata do quanto pode esse tempo medir-se em diretrizes existenciais afloradas numa personalidade livre, que nem por isso deixa de ser responsável.
O boêmio sustenta uma linha de tradição da cidade e de coerência com o próprio eu. Parece ser o último senão o único verdadeiro boêmio de São Luís, em nossos dias. Uma individualidade querida, na multiplicidade de suas manifestações, pois nele antigos alunos reconhecem e respeitam o professor rigoroso que falava alto; homens de imprensa acatam e admiram o jornalista; políticos de qualquer partido o festejam e abraçam; admiradores de seu intelecto aproximam-¬se para ouvir as declamações do poeta; grandes e pequenos reverenciam a pessoa humilde e amiga que ele é, em todos os momentos, e foliões já aposentados invejam nele o grande carnavalesco que nunca deixou de ser. E aqui lembro um fato que precisa ficar registrado. Sabe-se que ultimamente o fofão está sendo de novo introduzido em nosso carnaval. Mas a rigor ele nunca deixou de ser presença no período momesco, graças a Paulo que jamais o abandonou na folia e a respeito de quem escrevi certa vez que era ele o único fofão que ainda restava no quadro geral de nossas tradições.
Essa sua integração espiritual com São Luís nunca perdeu a consistência, nem mesmo quando, nele, o jornalista e o boêmio estagiaram juntos no Rio de Janeiro, e ali acabaram ficando durante quase dez anos. Aquele jornalista que trabalhou com Assis Chateaubriand, em “O Jornal”, com Jurandir Pires Ferreira, em “Força da Razão” e com Samuel Wainer, em “Diretrizes”. E aquele boêmio que pontificou na Galeria Cruzeiro, que foi um dos príncipes da Lapa, quando a Lapa ainda tinha nome e onde a razão não tinha força e as diretrizes eram outras. No Rio, o boêmio se tornou amigo de vários intelectuais e de grandes cantores da época, inclusive do monstro sagrado que era o Orlando Silva, tendo ainda registrada, em seu currículo, a proeza de várias vezes haver bebido na mesma mesa com Madame Satã. Viu assim de perto o que o Rio tinha de manso e de violento, e aprendeu onde está o equilíbrio real das tendências humanas. A Lapa era o laboratório onde o jornalista, o boêmio e o poeta pesquisaram a vida em todos os sentidos.
Paulo havia desse modo contrariado a vontade do velho Nascimento, que desejava ver o filho, não em redação de jornal, longe daqui, mas em escritório de advocacia, na sua terra. E, de certo, nunca imaginaria a Lapa como alternativa. Mas acontece que com dois anos que frequentava já a Faculdade de Direito, o boêmio descobriu que estava indo por um caminho torto. Não queria o direito que o pai lhe sugeria, mas o dever de cumprir o que lhe determinava a índole de jovem, que, pensando bem, não deixava de ser o quanto herdara do velho, também jornalista e boêmio. O fato é que era preciso escapar de ser doutor. No fundo, estava a seguir o próprio caminho do pai, mas seguir por si mesmo, dispensando o apoio paternalista que, de certo, o sufocaria.
A relação entre pai e filho tinha de caracterizar-se por uma amizade profunda que sempre perdurou, mas também por um respeitoso sentido de independência entre os dois firmado e que nunca deixou de persistir. Isso ficara, de logo, bem explícito, numa carta que do Rio Paulo fez ao pai, quando este, já o aceitando jornalista, manifestou o desejo de que o filho viesse trabalhar com ele, em São Luís. Dizia Paulo: “Sou seu amigo. Admiro-o muito. Devo-lhe o que sou. Mas quero honrar isso, sendo eu mesmo. Aqui no Rio, posso usar o meu nome. Aí, serei apenas o filho do Nascimento”.
Alguns anos depois, convidado por La Rocque e Neiva Moreira, Paulo veio a São Luís, para cumprir uma tarefa de poucos dias e voltar. Não voltou. O reencontro com a cidade tornou impossível o regresso. Ambos foram apanhados na teia de um velho amor. E eu então conheci o Paulo, no Bar do Castro, ali na Rua do Sol, em 1955. Apresentaram-me, nele, o orador, o professor, o declamador, o jornalista, o poeta, o boêmio. Não me era possível conhecer tudo isso de uma vez. De maneira que tive de começar pelo boêmio, o que estava mais na vista e, ao longo do tempo, nossa amizade se fez grande. E continua maior.
Acho que foi Paulo quem mais me ensinou São Luis. A partir do fato de que São Luís é mais fácil de entender quando a escutamos no meio do povo, como uma ressonância da memória coletiva, na alegre espontaneidade de sua rica expressão folclórica. São Luís sempre me pareceu tornar-se mais autêntica, quando recordada pela boca de seus boêmios, do que quando lembrada pelos escritos dos seus historiadores, onde tudo vem sendo controvertido, e sujeito a discussões intermináveis, desde a fundação da cidade, no século XVII, até a instalação da Alcoa, no governo Castelo. E talvez só uma coisa se conclua de maneira clara e definitiva: é que se a cidade não houvesse sido fundada, e historicamente envolvida por três nações, a Alcoa não estaria aí, multinacionalmente alojada.
Paulo sabe que São Luís é esse eterno debate, mas também sabe que há nela uma coerência, uma harmonia interna e uma razão constante de amor, para os que, não perdendo tempo em discuti-la, ganham esse tempo em vivê-la. Ele não é, portanto, um indiferente, mas um espírito solidário com o destino das coisas e dos homens, numa visão mais ampla, mais abrangente.
Daí sua razão de preferir questionar o mundo lá fora, em seus comentários políticos, porque sabe que assim questiona o mundo em seu todo. Percebeu isso quando se viu obrigado a procurar uma saída para não ter de permanecer calado, pois escrever diretamente sobre a política mais próxima era cadeia na certa. O exemplo se deu em 1964, ano da Revolução, como assim se dizia. Paulo já vinha sendo acompanhado em suas ideias. Até que publicou um artigo intitulado “Revolução não é quartelada”. Procurava definir as duas coisas, à guisa de esclarecimentos. Foi preso, levado, de madrugada, para o 24º BC. Estava aí talvez o modo de lhe mostrarem o que era de fato revolução e para que servia quartel. Isso não mudou o pensamento de Paulo. Desviou-lhe, porém, o enfoque dos problemas políticos, já que, trancafiado, não lhe seria possível falar daqui nem do mundo. E, desde então, vem ele se metendo com as eternas encrencas entre árabes e judeus, tendo, no decorrer do templo, feito algumas pausas apenas para falar em coisas como a guerra do Vietnã, o caso escabroso do Nixon, o golpe do Chile, a maior ou menor importância do peronismo, o conflito do Iraque e Irã, a guerra das Malvinas, etc.
E curioso que um homem assim, preocupado com essa geografia de horrores, seja o mesmo que no Bar do Zequinha se enternece com o Nelson Gonçalves cantando “Apelo” do Vinicius de Moraes. Mal começa a música e ele já está gritando para o Zequinha: é pra repetir! é pra repetir! E a poesia de Vinicius se derrama suplicante – ah, minha amada não te ausentes, pois a dor que agora sentes só se esquece no perdão. E é um boêmio mexendo, sem o saber, com a alma de outro boêmio, que faz coro ao apelar para a amada – eu te peço, não destruas tantas coisas que são tuas por um mal que já paguei. E ante essa amada da canção, que é um símbolo de todas as amadas ou a cristalização musical da amada única, o boêmio, considerando todos os apelos, parece consolar-se espiritualmente, convencido da certeza expressa nos versos que finalizam por dizer – meu amor, tu voltarias e de novo cairias a chorar nos braços meus. Vê-se que a amada, mesmo quando machucada na vida, é humanizada na canção e condescendente na crença do boêmio.
Em momentos assim estamos diante do poeta, do Paulo das “Aquarelas de Luz” e não mais do Paulo das telas escuras, dos quadros de sombras, pintados através de seus comentários, com os sangrentos ataques de Israel e Líbano, e as perspectivas sombrias de ameaças ao mundo inteiro. “Aquarelas de Luz” fala de um outro mundo, claro, alegre, luminoso, que é o mundo íntimo de Paulo. Trata-se de um livro de poemas publicado à revelia do autor, que nunca se preocupou em ser um poeta para ficar, mas apenas em ser um boêmio que faz versos, quase que exclusivamente para o seu próprio consumo.
Não esquecer o que eu disse há pouco, quando falei de gerações que se aplicaram mais ao que é dito do que ao que é escrito. Paulo é um produto disso. E está entre os que produzem poemas só pelo gosto de declamá-los, como os pássaros que apenas cantam e não se interessam em deixar nada registrado, porque parecem saber que sempre haverá pássaros cantando. Ele mesmo fala de seu livro como sendo “minha fuga espiritual, até então no esbanjamento das declamações, uma ilustração permanente das rodas de boêmio da Guanabara, cantigas das impressões mais íntimas, versos que estavam no catecismo do meu eu em prece, sem nenhuma pretensão de os ver, um dia, enfeixados em livro”.
Foi seu irmão José que resolveu, por conta própria, reunir o que pôde e publicar, não havendo nisso a menor interferência do poeta, a não ser a de exclamar: ‘“Aquarelas de Luz’, não te pude guardar como dantes. Agora tu te libertas de mim para a curiosidade dos outros. E eu te ficarei olhando neste bater de asas”. A verdade é que nem olhando ficou, pois a indiferença de Paulo era tamanha que até para o lançamento do livro teve que ser convidado pelo irmão, como se fosse um estranho. Eu que levei o convite.
E só então pude afinal também ver impresso o soneto que eu já estava cansado de ouvir, o soneto que dá nome ao livro, o famoso “Aquarelas de Luz”, feito para ser declamado aos amigos, nas rodas de bar, e que tantas vezes mereceu de mim acompanhamento musical, no tempo em que eu buzinava meu velho saxofone na cidade. Aliás, foi por isso mesmo que o soneto começou a sair de circulação, apesar de continuar solicitado. É que eu reagir contra a mania de declamações em nosso grogue de fim de semana. E tal foi a reação que, depois de algum tempo, Paulo chegou mesmo a não mais se lembrar do soneto todo. Descobriu isso um dia e ficou danado comigo. Eu estava prejudicando a oralidade do poeta. E então, se o próprio poeta já o vinha esquecendo, era conveniente mesmo que fosse publicado o “Aquarelas” em livro.
Eu até imaginava que Paulo tinha apenas aquele soneto. Mas vi, após a publicação, que “Aquarelas de Luz” inicia uma série de outros sonetos, seguida de algumas trovas, na primeira parte do livro. Na segunda parte, o poeta se liberta completamente do metro e da rima e nos mostra o que ele próprio considera “produções jogadas a esmo, uma abertura das minhas horas de estar só, olhando coisas, sentindo coisas”.
O que me pareceu, de logo, interessante e que, mesmo cultivando o soneto em versos alexandrinos – o sonetão – Paulo já reage contra a tirania imposta por aquele tipo de poema, deixando-se levar mais pelas suas emoções quentes do que pela frieza formal que o soneto exige. Não que ele desconheça a técnica, pois o soneto “Aquarelas de Luz” é tecnicamente perfeito. Mas não sei de nenhum outro maranhense que ousasse impor à sisudez de um soneto alexandrino rimas toantes, como “juntos” com “sustos”, “horto” com “corpo”, “virgem” com “ninho”, e de tal modo que o poema em nada perde na sua relação com os outros versos de rima consoante. Quase não se compreende, diante disso, que tenhamos às mãos os versos de um poeta que canta o que quer, sem nenhum compromisso sério com a arte em si mesma, importando só as manifestações imediatas de sua alma de boêmio. E a propósito do seu livro, já eu escrevera, em 1973, que, mesmo com essa despreocupação, com essa indiferença, com esse quase desprezo que tem pela sua obra publicada, o poeta Paulo, posto em confronto com tantos que se dizem laureados ou premiados em festivais de rimas e jogos florais, ganhará por muitos pontos, pelo conteúdo humano de seus versos, pela sensibilidade que deixa transparecer, através deles, e pelo feitio espontâneo dos poemas, reflexo daquele seu jeito pessoal de fazer ou de encarar as coisas, com a filosofia própria de quem nunca olhou o mundo senão com a alegria de uma gargalhada. e verseja tão descompromissado quanto uma criança que brinca.
Naquele ano, também eu dizia que “Paulo Moraes, como homem sensível, de espírito boêmio, indiferente às glórias, tanto as de fora como as de dentro da Academia, é um poeta que continua na dele: nem pretendeu fazer uma obra imortal nem tem intenções de com ela arrombar os portões da imortalidade”. Lá isso era verdade. Mas eu não tinha nada que tocar num assunto desse. O caso é que, nesse tempo, não me achava ainda também na Academia, e nunca me era possível adivinhar que eu mesmo teria de mais tarde receber aqui o poeta com as aquarelas e tudo.
Mas deixemos isso de lado e vejamos um pouco de sua obra. Em “Aquarelas de Luz”, na sua primeira parte, ou melhor, nos versos da “década de 50”, como o livro indica, o poeta está voltado quase que inteiramente para o amor carnal. A mulher é cantada em todos os sentidos, e há mesmo um soneto em que o poeta chega à aleluia da carne, fazendo batismos de beijos e outras coisas mais. Poderíamos, de início, considerar uma poesia gratuita, com todos os defeitos dos inúmeros românticos que puseram o seu lirismo a serviço da alcova.
Mas há em Paulo Nascimento Moraes um esforço para sublimar liricamente a carne, já que se pressente em sua poética um predomínio de luz e som a envolver tudo, como se o sensualismo dos seus versos tivesse que irromper através de clarões e sonoridades. O primeiro soneto aponta logo esse binômio, como um apoio imagístico de que se utiliza o poeta: – Aquarelas de luz numa tarde de agosto!... / E bem junto de nós a canção das cigarras... / E, no azul deste céu, o agitar das fanfarras / Destes ventos do sul, a beijar o Sol-Posto!
Mesmo quando a tarde se finda e já não há mais luz, ficando apenas o mar com seus sons de guitarras, o poeta encontrou meios de iluminar o rosto da amada, tirando claridades até da aflição. Veja-se, no mesmo soneto: – Fim de tarde a cair, sem o mal de um desgosto!... / E este mar a gemer como sons de guitarras... / E este amor a morrer, a quebrar as amarras / Dessa grande aflição que ilumina o teu rosto!...
Nessa ânsia de claridades e sons, até as cartas de amor Paulo define como filigranas sonoras da vida / com cenários de luz. Nuns olhos de virgem, ele percebe ao mesmo tempo luares de amor e cantigas de amor. Sempre a luz e o som de mãos dadas, diante do poeta para quem até a dor tem teclado, no qual ele esbraveja. E, depois de afirmar que o recalque de todos os desejos reluz sinistramente em relampejos que em gritos se transmudam, faz questão de lembrar-nos a revolta dos arpejos de Mozart.
Às vezes se vê sozinho coberto de luz, como neste verso: E me deixo banhar pelo sol de outras vidas, ou acompanhado, como nestes: E nós, ambos os dois, chegaremos um dia / retoucados de luz à alvorada dos sonhos. Mas também inundados de sons: Nosso amor viverá, pois que assim nós queremos / como um hino de paz, de sonhos e saudades.
Desse poeta que vê o desejo reluzir em relampejos e tais relampejos se transmudarem em gritos, teria que sair este quarteto que constitui um quadro do mais puro impressionismo, onde a tônica luz-sonoridade impõe uma força plástico-poética verdadeiramente impressionante: Luminuras de Sol, clareando a ramagem! / Refulgência de luz esbatendo os caminhos! / Inundado de Fé, deixo longe a miragem / Dos meus sonhos de amor no balanço dos ninhos! Nem é preciso dizer que aí, em meio a tantas “iluminuras”, a música aparece apenas sugerida pelo balanço dos ninhos, e por isso nos atinge mais do que quando o poeta fala diretamente nela.
O binômio luz-som transparece ainda mais forte neste verso em que ele faz alusão aos olhos da amada, afirmando que neles brilha a fé dos poemas risonhos. Vê-se que aí a luz espiritual se confunde com o cantar profano dos versos em sua alegria de rimas, para um equilíbrio entre o divino e o humano, que é o quanto busca a poesia em seu objetivo maior.¬
Mas, como eu disse há pouco, Paulo Moraes, mesmo com essa forte tendência de iluminação e musicalidade, não se incomoda de tratar os elementos de sua poética com a exata despreocupação de uma criança diante de seus brinquedos. Perdida para ele a graça lúdica, deixa os versos de lado, alguns até quebrados, tal como o garoto que só se acha satisfeito quando aquilo que encantou o seu mundo de menino ficou destroçado ou defeituoso.
E vejamos o que acontece quando esse menino grande brinca de erotismo. Não se vai poder afirmar que grandes contribuições para o nosso lirismo tenha trazido a poesia de “Aquarelas de Luz”, em sua excursão pelo mundo lúbrico das alcovas. Já ficou mais do que provado que a intenção de Paulo Nascimento Moraes não é a de querer enriquecer a poesia, mas de servir-se desta para enriquecer as emoções de seus momentos íntimos, reais ou imaginários, pouco importa, e levá-los apenas ao nível das declamações, para uma ilustração permanente das rodas de boêmio da Guanabara, como ele mesmo diz.
Pode-se imaginar que leitos e que alcovas teria o boêmio frequentado, na sua fase de jornalista, lançado ao noturno mundo pecaminoso da Cidade Maravilhosa, onde em geral se pensa em tudo, menos em levar aos outros a poesia que dali é possível extrair. Mas lá onde o repórter buscava notícias para as colunas policiais, o poeta encontrava motivos para os sonetos que o boêmio declamava depois, nas rodas de amigos. Era ele sozinho num trabalho de equipe.
E esteja ou não incluído dentro dessa faixa de inspiração um tanto suspeita, há um soneto intitulado “Neste leito de amor...”, em que Paulo consegue com apenas dois versos dar-nos uma descrição perfeita do campo amoroso, após a batalha dos corpos, impondo dignidade literária aos versos e fazendo uma excelente síntese poética, o que não é comum aos que, na mesma linha, gostam de mostrar em versos os seus pruridos sexuais, numa pura e simples masturbação de rimas.
Vejamos o poeta a dizer que no leito há a marca brutal dos sonhos que sonhamos / E a desarrumação dos abraços e beijos. Está aí lembrada a pacífica violência do sonho amoroso, e o segundo verso transfigura, de modo admirável, o desarranjo, a desordem de uma cama, coisa sempre muito prosaica, ainda que tal desordem seja provocada pelo amor. Nesse mesmo soneto, há também um verso que pode sugerir várias ideias em torno de uma informação única: há flagrantes de nós na brancura do linho...
Ainda que não possa fugir aos lugares-comuns da poesia erótica, largamente explorada e não raro prostituída por quantos a corromperam, fazendo-a descer, às vezes, ao plano da pornografia, ainda assim o poeta Paulo Moraes, com aquele poder de iluminar e sonorizar as coisas, obtém bons momentos de poesia superior, em seus sonetos cheios de sensualismo, alguns dos quais ele nem se importa que acabem tão desarrumados quanto um leito de amor.
Nem sempre, porém, o poeta, na primeira parte de seu livro, fala só de amores imediatos, que exigem soluções simples de alcovas, e estamos conversados. Há também amores difíceis, condenados a uma espera indefinida, embora os corpos ardam e o poeta fale à amada na descrença de nós e de nossas vontades, ou se queixe de que nossas vidas têm sido um agitar de esperanças, para terminar afirmando que viveremos assim com o corpo em desejos / esperando que a dor deixe em paz nossas vidas / para nós nesse amor nos fundirmos em beijos.
Mas ocorre que, enquanto o poeta espera que a dor o deixe em paz, o boêmio não espera nada, e como um Pigmalião menos angustiado, esculpe o seu “Modelo”, título de um soneto em que o corpo nu da mulher é uma estátua de carne, pedindo meus abraços, clamando por meus beijos. E ei-lo indo mais longe, em suas arrancadas eróticas, exclamando diante da estátua viva: Deslumbrado de ti e em êxtase... Perplexo, / me ajoelho a teus pés, e sem pensar nos receios, / vou com beijos vestindo a nudez do teu sexo. Nota-se que o poeta, quando passa a escultor, fica mais afoito, e deixa de ser aquela criança que brinca com aquarelas, embora não vá além de um fortuito Pigmalião ante uma estátua de rimas.
Do erotismo boêmio que em Paulo Moraes parece só caber em versos de tamanho alexandrino, passa-se, em “Aquarelas de Luz”, logo em seguida, para a perplexidade do poeta diante da vida e da morte. Mas já esse problema transcendental e eterno cabe em versos de sete sílabas. As trovas do poeta são cheias de preocupações e queixas. A morte, a saudade, os olhos da amada são aí os elementos de que ele faz uso constante. Mas Paulo demora pouco nas redondilhas, onde consegue dizer que a saudade é a adubagem da ausência, que sua mãe só não é Nossa Senhora / por não ser mãe de Jesus, que viu a santa passando na procissão do Senhor, e viu nos olhos da santa o pranto da sua dor.
Dito isso, encontramo-lo, em seguida, a mostrar-nos os poemas da “década de 60”, onde o vemos completamente livre, tanto nos versos, como nas ideias, confessando-se, antes de mais nada, cheio de Marias. Talvez ele seja, na paróquia, o mais mariano dos poetas que conhecemos. Começa por dizer: Na minha vida já tive muitas Marias... / E de algumas me lembro: / das Dores... / dos Remédios... / da Consolação... O poeta parecia haver compreendido que, sem precisar sair do mundo das Marias, todos os problemas podiam ser resolvidos. Se encontrava uma das dores, vinha em seguida uma dos remédios, ou, quando nada, uma da consolação.
E não é só isso. Continua ele no poema: E ainda tive outras Marias... / da Piedade... / das Flores... / Maria Rosa... Foi então que resolveu fazer logo o seu canteiro, e daí o verso: Eu plantei Maria no meu coração. A que mais o poeta amou – doidamente, alucinadamente – foi Maria dos Prazeres. Talvez seja por isso que algo desastroso aconteceu no jardim do boêmio e o levou a confessar esta desgraça: Mas depois / na tormenta das minhas ilusões, / perdi todas as Marias! É bem verdade que um dia nasceu ainda uma Maria, a do Arrependimento. O poeta continuava, porém, a esperar a sua Maria verdadeira, insistindo no refrão: Maria vai chegar / na representação de Verônica... ou Maria vai chegar com os cabelos mais brancos, iluminados de lembranças...
Sabe hoje ele que quem chegou, de fato, para ficar na dedicação, no afeto, no carinho, no permanente companheirismo, com respaldo no amor paciente e sincero, ocultou até o nome de Maria, para chamar-se só Emília.
Ainda em “Aquarelas de Luz”, esse poeta das perdidas Marias, canta também outras coisas do mundo e da vida. Era menino / quando saí / da noite iluminada / para o exercício mental / das minhas divagações. E fala desse menino travesso e descontrolado que declara: Esbanjei riquezas... / Perdulário, / gastei fortunas, comprando corpos e estragando desejos! Tal menino se solidariza hoje com o menino morto, atropelado na rua e que ficou pregado nas noras / marcando os minutos do tempo perdido. Também compreende o destino do menino que cresceu nas ruas, e das latas de lixo fez o supermercado / para a compra do alimento.
Nessa segunda parte de “Aquarelas de Luz”, o poeta está assim aberto às alheias angústias humanas. Contudo é nos poemas intimistas que Paulo melhor se realiza em sua arte. “Meus cabelos brancos”, canção em tom de embalo é, de certo, um dos mais altos momentos poéticos do livro. E muito bom é também aquele trecho do último poema, em que o poeta fala de seus próprios versos: Um nome de mulher / na oferta dos motivos, / um nome de planta / num vermelho de rosas / acordes de violão / soluçando ternura, / uma canção perdida / no anonimato de uma voz.
É como se para ele toda a poesia se concentrasse ai: um nome de mulher, um vermelho de rosas, um acorde de violão, uma canção perdida, numa voz anônima. Dentro desse esquema se enquadra o Paulo, na universalidade de seus sentimentos, na cosmovisão de sua alma boêmia, na autenticidade da pureza humana com que olha o mundo. E assim está ele aqui, cercado de seus sonhos, de seus familiares, de seus amigos, de seus admiradores. Uma ausência, porém, poderia ser lembrada nesta noite. Mas seria mesmo uma ausência? É a de Nadir Adelaide Moraes, a irmã, a quase mãe, a amiga incondicional de todas as horas. Tão amiga que é impossível não se encontre aqui, espiritualmente, aplaudindo também o poeta, iluminando-lhe a alma, abençoando-lhe a alegria humana de ser.
De igual modo, e redivivo, através de nossa recordação, se acha aqui o velho pai, que sempre tendo respeitado e honrado a Academia a que pertenceu, soergue-se, por cima do silêncio que o afasta de nós, a exclamar como o velho Tupi, no poema de Gonçalves Dias: este, sim, é o meu filho bem amado. Bem amado – explicará ele – porque solidário comigo em tudo na vida, e solidário comigo também na imortalidade acadêmica. Para o velho Nascimento, Paulo não é somente aquele que hoje aqui chega. É também, de algum modo, um membro da família acadêmica que regressa. E o que me resta dizer, em nome de todos os meus pares, é que fique muito à vontade o filho, na casa que já foi do pai.
* Discurso de recepção, pelo acadêmico JOSÉ CHAGAS; 10/8/82.
Um dia de festa para a garotada do Projeto Educação e Esporte – Escolinha de Futebol, iniciativa patrocinada pelas Drogarias Globo e pelo governo do Estado. No último sábado (21), os participantes do projeto tiveram uma manhã diferente proporcionada pela realização do Torneio Interno, na Associação dos Médicos.
Em campo, os 60 meninos beneficiados pelo Educação e Esporte puderam mostrar os resultados dos treinamentos. Lances bonitos, jogadas de efeito, muita alegria e, claro, muitos gols, marcaram a competição para a felicidade dos pais que foram prestigiar os futuros craques.
Uma das crianças beneficiadas é o Vinícius Conceição, que foi um dos destaques do Torneio Interno do último fim de semana marcando gols e dando várias assistências. “É uma sensação muito boa participar do projeto. Aqui, estudamos e jogamos bola. É muito legal quando a gente participa de torneios porque vale medalha e troféu”, explicou.
Nessa edição do torneio, todas as crianças foram premiadas com medalhas e troféus. Houve, ainda, premiações individuais de Melhor Jogador, Melhor Goleiro e Artilheiro.
“É gratificante proporcionar a essas crianças momentos como este, onde elas se divertem jogando futebol. A comunidade da Vila Conceição é carente e precisa de projetos dessa natureza. Só temos a agradecer às Drogarias Globo e ao governo do Estado por acreditarem no projeto”, afirmou o coordenador do projeto, Kléber Muniz.
O projeto
Em execução desde 2016, o projeto já atendeu mais de 100 crianças. Ao chegar em sua quarta edição, o Projeto Educação e Esporte – Escolinha de Futebol se consolidou como referência em todo o Estado. O grande diferencial dessa iniciativa é justamente conseguir levar educação e esporte para as crianças.
Durante o período de execução do projeto, semanalmente, as crianças participam dos treinos de futebol acompanhados por profissionais de educação física. Paralelamente ao trabalho desenvolvido em campo, a garotada recebe acompanhamento educacional, com aulas que servem como uma espécie de reforço escolar.
Paulo de Tarso Moraes, que organiza esta página comemorativa, é filho de Paulo Augusto Nascimento Moraes. Sou amigo do pai e do filho e vejo o cuidado e o carinho com que o filho procura tratar a memória do pai. Mas, pensando bem, podemos, antes de tudo, afirmar que ambos estão vivos, pois nenhum pai morre, se fica na lembrança de um filho, nem morre na recordação ou na saudade dos amigos. A data de hoje, 23 de novembro, é a de aniversário do pai, que completa noventa e um anos de nascido. Paulo Nascimento Moraes, como se vê, já traz o nascimento no próprio nome. Mas os que gostam de assassinar as pessoas, até no campo da memória, diriam logo: completaria noventa e um anos, “se vivo fosse”. E eu gostaria de perguntar a esses o que eles entendem por “estar vivo”. Eis uma questão aparentemente banal, mas de profunda motivação para os que têm uma ideia do que seja verdadeiramente viver.
Há pouco se lia e se ouvia, repetidamente, nos meios de comunicação, quando se comemorava o centenário de nascimento de Ary Barroso, que aquele compositor faria, agora em 2003, cem anos, se vivo fosse. Não é curioso que se demonstre todo o empenho de festejar o centenário de nascimento de uma pessoa, mas esclarecendo que ela só faria os cem anos, se estivesse viva? E qual a importância que tem o tempo, nesse caso? Ninguém vive tempo. Ora, estavam falando exatamente do que ele, por sinal, tem de mais vivo, de mais evidente em sua perenidade, que é seu espírito, sua capacidade criativa, expressa nas suas obras, comprovando que sua presença espiritual está agora não só no plano sobrenatural como definitivamente entre nós. Do contrário ninguém estaria sequer tendo lembrança dele. E, a essa altura, que sentido têm para nós os seus restos mortais, já transformados em pó, se podemos contar com a totalidade de sua vivência e com todo o brilho de seu talento, para sempre? Ele está mais vivo hoje do que muitos que o festejaram e que, a rigor, nem sabiam o que estavam festejando.
Entender que alguém só está vivo enquanto fisicamente presente, isto é, em corpo, em esqueleto, ou investido de uma carcaça destinada ao apodrecimento, convenhamos em que é coisa de uma burrice mortal. Não há estupidez maior do que imaginar que a vida consiste apenas na substância palpável do lixo ou do entulho que carregamos, durante nossa passagem na Terra. A matéria existe, a matéria não vive. Há, porém, os que acham que sua vida é isso. Tanto que muitos nem percebem o paradoxo a que se expõem, sempre que falam de vida e morte. Quando empregam a expressão – se vivo fosse – em relação a uma pessoa fisicamente ausente e a quem se pretende homenagear, asseguram, com isso, que ela está morta. E o que é então que passam a homenagear? Já pensaram, por exemplo, no caso de um católico, desses bem fervorosos, dizendo, agora pelo Natal, que Cristo faria 2003 anos, se vivo fosse?
Bem, eu não estou aqui para falar de Ary Barroso nem de Cristo, mas do aniversário do meu amigo Paulo Nascimento Moraes, pai do meu também amigo Paulo de Tarso Moraes. O filho em nome do pai, o pai em nome do filho, vidas que se continuam, que se integram, que vão além da memória, com os sonhos de um a crescerem na lembrança do outro. E Paulo, o pai, é também presença em mim, como um parente legitimado pela amizade de longos anos. Um irmão de alma. Não é outra a razão por que o filho me procurou para comunicar o seu trabalho de pesquisa, no levantamento das atividades do pai, em livros, jornais, revistas e por meio de depoimentos de pessoas amigas.
Ele busca o pai professor, o pai jornalista, o pai poeta, o pai imortal, não apenas por haver pertencido à Academia de Letras, mas pela sua específica individualidade de senhor de si mesmo. Busca também o pai que figurou como um dos últimos componentes de uma geração de boêmios, mas de salutares boêmios que encheram a cidade de alegres histórias, que a povoaram de sonhos impossíveis e de uma leve poesia que estava mais nos gestos do que nas palavras. Em verdade, lembrar Paulo é lembrar muitas outras figuras de seu tempo e, por consequência, todo o patrimônio sentimental de uma São Luís, diluída já hoje na sua história e na sua geografia. Mas uma São Luís que renasce também, nesta data, por força do espírito de quem a amou, com a mais profunda ternura, e pela nossa memória estende o seu exemplo, como uma esteira de clara vivacidade humana, rastros que iluminam a caminhada do filho. Meus parabéns a ambos, tão vivo um quanto o outro.
* José Chagas, jornalista, poeta... e nosso amigo. Texto publicado no Jornal “O Imparcial” (nov. 2003).
No duelo entre as duas melhores equipes de beach-soccer do país na atualidade, Sampaio Corrêa e Vasco da Gama (RJ) realizaram uma grande final na edição deste ano do Campeonato Brasileiro de Beach-Soccer. A expectativa de uma partida equilibrada se concretizou desde os minutos iniciais. Em jogos assim, os detalhes fazem toda a diferença. Após empate por 1 a 1 no tempo normal e igualdade na prorrogação, o Vasco levou a melhor na disputa dos pênaltis, venceu por 3 a 2 e conquistou o bicampeonato brasileiro. Apesar do revés, o Sampaio, que ficou com o vice-campeonato, sai da competição ainda mais fortalecido com uma equipe aguerrida e valente, além de revelar alguns bons jogadores para as próximas temporadas.
O jogo
A final deste domingo (22/11), na arena montada no Parque Olímpico da Barra, no Rio de Janeiro, foi um duelo tático e de bastante equilíbrio. Com marcações bem encaixadas e com atuações incríveis dos goleiros, o 0 a 0 persistiu durante todo o primeiro tempo.
No segundo período, o Vasco esteve melhor e criou algumas chances de abrir o marcador. No entanto, o time vascaíno parou em Bobô, que segurava o empate. O Sampaio estava bem postado na defesa, e seus jogadores cumpriam, com perfeição, suas funções defensivas. Quando o empate parecia que persistiria, Datinha cobrou falta no minuto final do período. A bola tocou na areia e encobriu Rafa Padilha: 1 a 0 para o Sampaio.
Os últimos 12 minutos do tempo regulamentar foram eletrizantes. O Vasco pressionou em busca do gol e conseguiu empatar com Rafinha, aproveitando chute de Rafa Padilha: 1 a 1. O empate levou a decisão para a prorrogação.
No tempo extra, Luquinhas virou para o Vasco em uma cobrança de falta perfeita. Em desvantagem no placar, o Sampaio teve de se expor mais. Restando 17 segundos para o fim do jogo, Datinha tentou uma bicicleta e foi derrubado por Catarino perto da grande área. Com muita categoria, o camisa 10 mandou a bola no ângulo, sem chances de defesa ao goleiro vascaíno: 2 a 2 no placar e disputa de pênaltis à vista.
Como os detalhes fazem a diferença em uma partida tão equilibrada, o Vasco aproveitou tarde inspirada de seu goleiro Rafa Padilha para vencer o Sampaio. O arqueiro vascaíno defendeu a cobrança de Edinho e colocau o atual campeão nacional em vantagem. Coube, então, a Jordan deslocar Bobô, fazer 3 a 2 e confirmar título ao Vasco.
Premiações individuais
O Sampaio Corrêa ainda dominou as premiações individuais. O time maranhense conquistou três dos quatro prêmios. O craque Datinha foi eleito o melhor jogador da competição e ainda dividiu a artilharia ao lado de Lucão, do Vasco da Gama: ambos fizeram 11 gols no Campeonato Brasileiro de Beach-Soccer. Já o tricolor Gerlan foi escolhido o jogador revelação do torneio. O arqueiro do Vasco, Rafa Padilha, levou o prêmio de Melhor Goleiro.
Mais sobre o Campeonato Brasileiro de Beach-Soccer está disponível nas redes sociais da Federação Maranhense de Beach-Soccer (FMBS): @beachsoccerma.
A semana de 22 a 28 de novembro é marcada por dias de conscientização, datas históricas e pelos nascimentos e mortes de figuras notáveis no campo da cultura. O dia 23 de novembro é o Dia Nacional de Combate ao Câncer Infantil. No ano passado, o programa “Sintonia Nacional”, da Rádio Nacional, falou sobre o assunto.
Acesse a tabela com os fatos e datas da semana.
O dia 25 é o Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as Mulheres. A data foi instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1999 e é mais um dia para refletirmos sobre a questão. Em 2019, o “Tarde Nacional” abordou o tema.
No dia 25, faz 105 anos que Albert Einstein apresentou as equações de campo da relatividade geral para a Academia de Ciências da Prússia. No dia 27, a segunda chegada do cometa Halley na Terra completa 35 anos.
Nascimentos e mortes no campo das artes
No dia 22, a morte do pianista, compositor, violinista e gaitista Newton Mendonça completa 60 anos. Ele morreu aos 33 anos, pouco tempo depois de, com nomes como Tom Jobim, ser um dos precursores da Bossa Nova. Em 2018, a EBC fez um especial contando a história do movimento.
No dia 25, o nascimento do escritor português Eça de Queiroz completa 175 anos. No dia 27, há 80 anos, nascia o lutador e ator Bruce Lee. Já no dia 28, a morte do escritor gaúcho Érico Veríssimo completa 45 anos. Em 2016, o programa “Conhecendo Museus” contou a história do escritor de “O Tempo e o Vento” e tantas outras obras notáveis.
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Morte do pianista, compositor, violinista e gaitista fluminense Newton Mendonça (60 anos) – foi um dos mais importantes letristas da bossa nova. Seu modo de escrever, usando substantivos até então raramente usados em letras de músicas brasileiras, foi fundamental para chamar a atenção das pessoas para a Bossa Nova, especialmente os jovens. Injustiçado historicamente, um dos grandes responsáveis pelo início da bossa nova
Marinheiros a bordo dos navios de guerra do Brasil, incluindo o Minas Geraes, São Paulo e Bahia, se rebelam violentamente, iniciando o movimento conhecido como Revolta da Chibata (110 anos)
Dia Internacional do Músico – comemoração internacional, que está oficializada no Brasil como Dia da Música, em louvor à Santa Cecília, que, desde o século XV, é considerada padroeira da música sacra e, consequentemente também, tida na conta de Padroeira dos músicos, pois, segundo consta, cantou para Deus quando ela estava morrendo
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Início da Intentona Comunista no Brasil (85 anos)
Dia Nacional de Combate ao Câncer Infantil
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Dia do Rio
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Nascimento do escritor português Eça de Queiroz (175 anos)
Nascimento do general e ditador chileno Augusto Pinochet (105 anos)
Albert Einstein apresenta as equações de campo da relatividade geral para a Academia de Ciências da Prússia (105 anos)
Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as Mulheres – comemoração internacional que está ratificada pela ONU na sua Resolução A/RES 54/134 de 17 de dezembro de 1999
Dia Nacional da Baiana de Acarajé – comemoração criada pela Lei nº 12.206 de 19 de janeiro de 2010, pela qual se tornou nacional uma celebração inicialmente apenas da capital do Estado brasileiro da Bahia
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Criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio (90 anos)
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Nascimento do escritor paulista Raduan Nassar (85 anos) – galardoado com o Prêmio Camões em 2016
Nascimento do lutador de artes marciais, ator e cineasta sino-americano Lee Jun-fan, o Bruce Lee (80 anos)
O cometa Halley chegou ao Planeta Terra (35 anos)
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Morte do escritor gaúcho Érico Veríssimo (45 anos)
“É muito emocionante ver uma pessoa que não tem nada e também não se contenta com esse nada. E tudo que é oferecido também não basta”. É assim que a escritora Conceição Evaristo (foto) define a resiliência de Carolina Maria de Jesus. Para o “Caminhos da Reportagem”, Conceição também conta como Carolina inspirou ela própria, e sua família, a “não aceitar a pequenez da vida”.
Carolina nasceu em Sacramento, Minas Gerais, e, ainda jovem, migrou para São Paulo. Morou na favela do Canindé, criou sozinha três filhos catando papel. E escreveu, escreveu muito. Sua obra de maior sucesso “Quarto de Despejo”, que faz 60 anos este ano, foi traduzida para mais de uma dúzia de idiomas, trouxe fama e reconhecimento para a autora que dizia que seu sonho era escrever. Com o sucesso, um estigma: o de ser a escritora ex-favelada, só falava de pobreza e fome.
É essa imagem que pesquisadores e novos escritores negros têm tentado mudar nos últimos anos. “É sempre uma imagem marcada pela subalternidade. Carolina era vaidosa, gostava de se arrumar, usar pérolas e, quando tinha agenciamento sobre si, ela escolhia sempre pela vaidade. Hoje, a gente tem a felicidade em ver que estamos procurando outras imagens de Carolina”, diz Raquel Barreto, historiadora e curadora da exposição promovida pelo Instituto Moreira Sales com o objetivo de desconstruir o estereótipo de Carolina, favelada e sempre com o lenço na cabeça.
Também para celebrar a escritora, vamos conhecer um pouco de suas obras inéditas, que serão publicadas em edição especial pela Companhia das Letras. A doutora em letras, Fernanda Miranda, fala da importância de se ter um conselho curador composto só por mulheres negras para resgatar a essência de Carolina. Livros, peças de teatro, provérbios, e diários inéditos serão publicados sem cortes. “Nós entendemos que essa publicação estabelece um divisor de águas na obra de Carolina, porque não vamos interferir no texto dela. “Quarto de Despejo” e “Casa de Alvenaria” vão ser lidos pela primeira vez em sua totalidade”, diz Fernanda.
Carolina morreu há mais de quarenta anos e, ainda hoje, influencia escritores como Rainha do Verso, poeta, atriz e camelô no Rio de Janeiro. E é essa Carolina que você vai ver no “Caminhos da Reportagem” desta semana.
A íntegra de “Caminhos da Reportagem” fica disponível no “site” do programa.
Ficha técnica
Reportagem: Bianca Vasconcellos, Pollyane Marques
Produção: Bianca Vasconcellos, Deise Machado, Pollyane Marques, Éverton Siqueira (estagiário), Henrique Mathias (estagiário)
Apoio à produção (RJ): Aline Beckstein, Elisabete Pinto, José Victal, Felipe Messina
Imagens: João Marcos Barboza, Bianca Vasconcellos
Auxílio técnico: Caio Araujo
Edição de imagens e finalização:Maikon Matuyama
Roteiro e direção: Bianca Vasconcellos
Em 2004, cientistas da agência espacial norte-americana (Nasa, na sigla em inglês) que trabalhavam com a Galaxy Evolution Explorer (Galex) – uma sonda espacial com telescópio ultravioleta cujo objetivo era medir a luz oriunda da formação de estrelas no universo desde o Big Bang – se depararam com um estranho fenômeno: uma bolha de gás que parecia ter uma estrela ao centro. Pelos registros da Galex, a bolha de gás parecia ser azul, apesar de não ser visível aos olhos humanos. Após análises detalhadas, descobriu-se a existência de dois anéis de luz no centro do astro, algo que fugia à compreensão na época.
Chamada de Nebulosa de Anel Azul, a estrutura espacial foi estudada nos últimos 16 anos, com múltiplos telescópios a partir da Terra. Mas nenhuma explicação plausível sobre a origem dos anéis ou a razão do fenômeno foi proposta.
Neste ano, um grupo de cientistas da Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, finalmente foi capaz de resolver o mistério da nebulosa.
“Estávamos observando uma noite com um espectrógrafo (aparelho que analisa o comprimento de ondas de luz por meio de imagens) que havíamos acabado de construir, quando recebemos a mensagem de colegas que estavam estudando um objeto peculiar, composto de uma nebulosa gasosa em expansão rápida a partir de uma estrela central”, afirmou Guomundur Stefansson, cientista coautor do artigo científico sobre a descoberta.”Como ele se formou? Quais são as propriedades da estrela no centro? Ficamos empolgados para resolver o mistério”, afirmou.
Segundo a pesquisa, a Nebulosa de Anel Azul é uma fusão de um sistema binário (composto por apenas duas estrelas) onde um sol, de massa maior, atraiu uma estrela de massa menor para o seu interior após tornar-se um supergigante. Os anéis azuis característicos seriam o material de formação da estrela menor, sendo expelido em formato de cone, em direções opostas ao centro gravitacional, para o espaço. A força da fusão faz com que as duas extremidades dos cones flutuem ao redor do objeto central.
... 15 COCA/COCAÍNA
Coca é a planta; e cocaína, a droga: “Mastigava folhas de coca”; “Era viciado em cocaína”.
16 COMERCIALIZAR
É mais do que simplesmente “vender”: “A empregada doméstica resolveu vender (e não “comercializar”) o carro importado que ganhou no sorteio do supermercado”. Quem comercializa um produto pode vender, comprar, trocar, alugar, financiar…
17 CONFISCAR
Não é sinônimo de “desapropriar”: “Os judeus tiveram seus bens confiscados durante a segunda grande guerra”. Se houver “indenização”, é desapropriação, e não confisco: “Para a reforma agrária, muitas terras foram desapropriadas”.
18 CONFLITO
Usado para designar “confusão”: “Na praça, houve um conflito generalizado”.
19 CONFRONTO
Só se houver “enfrentamento”: “Após o jogo, houve um confronto entre as torcidas do Sampaio e do Moto Club”. Se houver apenas “confusão”, é melhor usar “conflito”.
20 CONTAMINADO
Contaminação é mais que poluição. Água com muita sujeira está poluída; com vírus, bactérias, agentes químicos… está contaminada.
21 DE ENCONTRO A
Significa “contra”: “O carro foi violentamente de encontro ao poste”; “A decisão do governo vai de encontro aos (= contra) anseios dos aposentados”. Não confunda com AO ENCONTRO DE, que é igual a “em apoio de”.
22 DEFICIENTE
É quando há “falta”: “Era um deficiente físico”.
23 DEFICITÁRIO
É o que sofreu “deficit”: “Foi uma campanha deficitária” (= deu prejuízo).
24 DENUNCIAR
Rigorosamente, só o Ministério Público (= um promotor) pode apresentar uma denúncia. Hoje em dia, no meio jornalístico, é aceitável o uso de denúncia como uma “revelação”: “… como foi denunciado ontem, aqui no ‘Jornal Nacional’”. Devemos, entretanto, usar com cuidado e moderação. Exemplo inaceitável: “O ‘Jornal Nacional’ denunciou (= mostrou), ontem, a última viagem de um caminhão roubado no Paraná” (= nesse caso, não há nenhuma denúncia).
25 DESCOLAMENTO
É o “ato de descolar, desgrudar”: “Sofreu o descolamento da retina”.
26 DESINFETAR
Não é sinônimo de “esterilizar”. “Desinfetar” é “limpar”; “esterilizar” é “tornar estéril, matar bactérias, vírus”: “É necessário desinfetar os banheiros e a cozinha”; “Todo dentista é obrigado a esterilizar seus instrumentos”.
27 DESLOCAMENTO
É o “ato de deslocar, mudar de lugar”: “Há a necessidade do deslocamento de todos os soldados que estão na região”.
28 DESPENCAR
No sentido de “cair, diminuir, descer”, só usar se houver ideia de “repentino ou queda muito grande”: “As bolsas europeias despencaram (= queda muito acentuada)”; “Ele despencou para o oitavo lugar (= repentinamente ele caiu, por exemplo, do segundo para o oitavo lugar)”.
29 DISPARAR
No sentido de “subir ou crescer”, apresenta uma carga muito forte. É melhor usar subir ou crescer: “Ele começa a disparar (subir ou crescer) nas pesquisas de opinião” (= há subjetividade, uma carga perigosa). Deve ser evitado no sentido de “dizer”: “Ele é covarde”, disparou a atriz.
30 DIVISA
Usamos para Estados: “Na divisa do Maranhão com o Piauí”.
31 DIZIMAR
Vem de “dízimo”, ou seja, a décima parte. Originariamente, é a matança de um soldado em cada grupo de dez. Portanto, seria incoerente dizermos que uma raça foi “totalmente dizimada”. É melhor usar o verbo “exterminar”.
32 DUBLÊ
É um “substituto”. Não devemos usar para quem exerce “dupla função”: “O baiano Lindoberto, por exemplo, é um dublê de zagueiro e pescador”. Além de ser um lugar-comum, a palavra “dublê” apresenta uma clara carga depreciativa, pejorativa.
Teste da semana
Que opção completa, corretamente, a frase a seguir?
“Os ideais __________ aspiramos são muitos, mas os recursos __________ dispomos são ínfimos”.
(a) que / dos quais;
(b) aos quais / com que;
(c) a que / que;
(d) que / que;
(e) a que / de que.
Resposta do teste: letra (e).
O verbo ASPIRAR, com o sentido de “desejar, almejar”, é transitivo indireto (aspirar A). Em razão disso, “os ideais a que (ou aos quais) aspiramos são muitos”. O verbo DISPOR também é transitivo indireto (dispor DE): “… os recursos de que (ou dos quais) dispomos são ínfimos”.
GUANABARA – 14 – Com cinco horas de voo, chegamos e, diante de nós, a cidade histórica de São Sebastião na iluminação da noite. E lá em cima, no alto do Corcovado, a imagem do Cristo Redentor. E tudo o mais tinha, para nós, a festa do encantamento do Espírito e, dentro de nós, um mundo de pensamentos que desfilavam numa sequência de recordações a fixar, para nós, todo um tempo que aqui passamos, vivendo na “terra estranha”, lutando desesperadamente para garantir a sobrevivência. Mas, para que estar recordando tantas coisas que ficaram tão distantes e que, só para nós, tem a valorização do nosso sentir e a força sentimental de recordar, de reviver tudo que vivíamos aqui no exercício da nossa profissão, dentro das redações de jornais, escrevendo notícias, comentários e redigindo reportagens? Para quê? Interessa, agora, é estarmos aqui, aqui na Guanabara, aqui neste Rio de Janeiro, olhando e sentindo este seu PRESENTE, este HOJE que tem um muito de realizações e de trabalhos edificantes. Interessa estarmos aqui vendo tudo que o Carlos Lacerda está fazendo, fazendo de verdade, fazendo de fato, embora esteja, com reprovações de muitos, dos seus adversários, utilizando uma “terrível política”, a dos impostos. Mas mesmo assim a opinião geral, do povo, é que Lacerda é “um grande administrador”. O certo é que há por toda a parte a presença de realizações que denunciam a coragem cívica do governador e o sentido profundo da sua grande capacidade de trabalho.
Em toda a cidade, há a presença de obras que marcam de maneira inconfundível esta verdadeira “batalha de realizações” comandadas que estão sendo pelo governador Carlos Lacerda. Até mesmo os seus adversários, reconhecem esta “frente de luta” do governador da Guanabara. E dentre tudo que tem feito, que está fazendo, uma obra se destaca e seria, talvez, o bastante para justificar a presença de Lacerda no Executivo do Estado da Guanabara – o problema da educação. Hoje, não há crianças sem escola. E estas se multiplicaram. Problema resolvido. Caso liquidado. Este realismo dá ao governador uma grande percentagem de “grandeza e de ação administrativa”.
E o político que há em Carlos Lacerda encontra, agora, na apreciação de muitos, discordâncias, mas estas têm o conteúdo dos interesses políticos e partidários de cada um. Ajudando a fazer a chamada “Revolução Democrática”, o líder udenista, com os seus impulsos, suas determinações, forçou uma UDN desfigurada, sem unidade partidária a oficializar a sua candidatura à Presidência da República. Essa posição lacerdista dividiu mais a UDN e deu à política nacional, ao que nos parece, novos rumos, alimentando a esperança de que haverá, em 65, a realização das eleições. Empurrando Magalhães Pinto para a cerca das “inconveniências”, deslocando o governador de Minas para uma posição incômoda, o governador Lacerda (opinião de muitos políticos das cúpulas partidárias) firmou uma posição de destaque e atraiu, para si, as atenções doutras “alas” partidárias, conseguindo uma apreciável ajuda, visando assegurar, de logo, uma melhor situação e impondo uma orientação mais definida.
Entretanto, tais aspectos sofreram modificações sensíveis, oriundas dos “atritos” que surgiram entre o governador da Guanabara e os doutros do Supremo Tribunal Federal. E, logo a seguir, os ataques dirigidos pelo líder udenista contra a política financeira do presidente Castelo Branco. Tal atitude provocou reações por parte do presidente da República e encontrou resistência do lado dos setores atingidos. E, já agora, para o ministro da Guerra, general Costa e Silva, o governador Lacerda “rompeu com a tal revolução de 1º de abril ou 31 de março”, conforme o “apetite” dos historiadores revolucionários.
De qualquer maneira, Lacerda está na luta. E nos parece que não poderia ele tomar outro caminho, defendendo esta política desastrosa do ministro da Fazenda. Nenhum candidato contará com o apoio popular, com o apoio das classes produtoras, achando que esta situação financeira que aí está é, pelo menos, ótima. Nada. Há, em progresso, o esquema inflacionário. Há, em desenvolvimento, o alto custo de vida. Há, em crescimento, todo um estado de desordem administrativa neste intricado mundo das finanças. E Lacerda, candidato, não poderia deixar de atacar esta brutal realidade que aí se depara e que está a exigir de Castelo Branco outra “ordem de serviços’ para conter a inflação e dá ao povo, sem mais demora, um padrão de vida mais recompensador. Lacerda, agora, arrefeceu a sua campanha, e seus assessores dizem que, em março de 65, ele voltará mais impetuoso. É que o momento, informam alguns de seus auxiliares, requer uma melhor prudência.
E aí temos estes aspectos da política nacional. Outros escrevendo e, em todos, procurando dar um informativo exato desta confusa política revolucionária com uma “linha dura” atuando preponderantemente e pressionando a todos e o próprio presidente da República.
* Paulo Nascimento Moraes. “A Volta do Boêmio” (inédito) – “Jornal do Dia”, 19 de dezembro de 1964 (sábado).