– Precisa-se de alguém que cuide de uma casa e quintal com 1.369 quilômetros quadrados e onde moram 273 mil pessoas.
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Há cidades que não precisam de prefeito. Precisam de mordomo. De alguém que tome conta da casa, que administre o local onde se mora.
Uma pessoa que mostre para a arrumadeira onde está precisando ser arrumado;
que saiba dizer para o jardineiro onde precisa ser ajardinado;
que diga para o cozinheiro onde – e com o que – o povo da residência precisa ser alimentado;
que aponte para a lavadeira e passadeira o que precisa ser lavado e passado;
que instrua à babá para que tenha com as crianças o devido cuidado;
que se assegure com o vigilante que o domicílio estará bem vigiado.
Precisa-se de um mordomo, de alguém que cuide de uma casa e quintal com 1.369 quilômetros quadrados e onde moram 273 mil pessoas. Uma casa que tem gente demais em espaço territorial de menos – portanto, com problemas sociais… Uma lugar onde, por não ter todos trabalhando, tem muitos atrapalhando – e muitos outros esmolando, roubando, matando…
Um mordomo que, com conhecimento e autoridade, energia e sensibilidade, exerça seu papel de ser o maior (“mor”) do domicílio (“domus”) e não permita que se faça com a casa o que se quiser por quem quer que seja.
Em Imperatriz (a “casa” que escolhemos para morar), parece um local sem dono, um domicílio sem mordomo. Quase todos usam e abusam. É casa de mãe Joana.
Mesmo tendo a autoridade da lei e a lei da autoridade a seu favor, o mordomo não toma as providências mínimas para tornar a casa, digamos, mais “habitável”. O pior é que, ante a paralisia da autoridade, ante o tetraplegismo da lei, diversos habitantes dessa casa pintam e bordam, deitam e rolam no vácuo administrativo.
Se até agora, em termos econômicos, não foi possível avançar na questão da promoção do desenvolvimento integrado e sustentável para todos, na geração de emprego e renda, na atração de investimentos e captação de recursos para os agentes econômicos menores, na abertura de frentes de serviços estáveis e rentáveis, era de se esperar que pelo menos em termos administrativos se pusesse um pouco de ordem no caos, isto é, na casa.
À falta disso, pela timidez de ação, o mordomo vai avalizando a sucessão de erros antigos e ilegalidades novas que diariamente surgem na casa Imperatriz. Se não houve condição ou competência para realizar as grandes causas, que se faça pelo menos as pequenas cousas.
Diversas leis, por exemplo, tratam da questão das calçadas. Já falamos deste assunto muitas vezes. Só em Imperatriz, por omissão (quase covardia), é que as calçadas têm “donos”. Em quase 100% dos casos, a calçada é feita como se cada uma estivesse em um planeta diferente. Elas têm alturas diferentes, larguras desiguais, pavimentações discordantes e espaços diferenciados de locomoção dos pedestres. Há armazéns que fazem bem alta a calçada, que é para facilitar o descarregamento de mercadorias! A calçada é do dono do imóvel em frente e pronto! Prefeitura e pedestres que se lixem!
Por causa de horrores urbanos como esses, em Imperatriz é proibido a gestantes, crianças, velhos, cegos e outros portadores de necessidades especiais andarem pelas calçadas. É proibido, porque é impossível. As calçadas são descontínuas, disformes e disconformes. Em apenas um lado da Avenida Getúlio Vargas, no trecho que vai da Rua/Avenida Ceará até o início do Calçadão, existem mais de quarenta níveis diferentes de calçadas.
Além das irregularidades de construção, a problemática da ocupação. Existem restaurantes que, quando abrem, sobretudo à noite, ocupam toda a calçada com mesas e cadeiras, colocam um estrado de madeira para nivelar-se com a rua, ocupam a rua, põem carros… e o pedestre que vá disputar espaço de locomoção pelo meio da rua, com outras pessoas, carros, carroças, motocicletas, bicicletas… Que desrespeito! Imperatriz, por isso, até pode ser cidade, mas será civilidade?
Material antiderrapante é difícil – em nome do “luxo”, do mau-gosto dos donos de imóveis, tacam uns azulejos, ladrilhos ou sei lá o que mais liso que muçum melado de baba de quiabo. Se ficar molhada (pela chuva ou por antiecológicas lavagens), então… é tombo certo. Já vi um senhor carregado de caixas deslizar e levar um tombo daqueles em uma calçada ali na Avenida Dorgival Pinheiro, em um quarteirão próximo à Rua Ceará.
Em outra rua, uma loja afronta e enfrenta a lei fixando, à base de cimento, na calçada, uma enorme placa publicitária, praticamente impedindo a passagem de pedestres pela calçada, bem no centro da cidade. Donos ou funcionários de loja utilizam parte das ruas como estacionamento permanente e gratuito, das 8 da manhã às 8 da noite. Em uma rua, uma calçada foi “rasgada” e transformada em estacionamento tipo “espinha de peixe” para carros de frequentadores, funcionários e/ou proprietários de estabelecimentos comerciais ali vizinhos.
A proibição legal de terrenos urbanos como reserva de valor (“terrenos de engorda”, isto é, imóveis abandonados que ficam ganhando mais e mais valor) não mete medo em ninguém, porque a frouxidão, a negligência (para não dizer outras coisas…) já se legitimaram imoralmente por aqui. Daí o permanecerem terrenos enormes, de grande valor, no centro mais central da cidade e em outras áreas urbanas e suburbanas, abandonados, tornando-se pontos para desovas de objetos roubados, esconderijos de marginais, depósitos de lixo, acumuladores de águas paradas, facilitadores do surgimento de doenças. E não se percebe uma ação “dura”, legal, em cima dos latifundiários urbanos.
Será que esta cidade não se exempla não?
Existe um sem-número de outras cidades iguais a Imperatriz, maiores e menores que Imperatriz, onde a população é educada para cumprir suas obrigações. Afinal, a lei não é apenas um instrumento que deveria ser executado pelo Poder que tem nome para isso: Executivo.
Por mais dura que possa parecer, a lei está em favor da população, que não devia conviver com a feiura urbana, com a doença, com o desconforto e a insegurança pelo mau exemplo das pessoas que, possuidoras de imóveis, os deixam abandonados.
Que se cumpra a lei! Doa no bolso de quem doer.
Uma cidade não deve ter “dono”. Ela é de todos os seus habitantes.
Para administrá-la, elege-se um entre estes.
Deste modo, chame-se o mordomo.
Ou procure-se outro.
* EDMILSON SANCHES