CULTURA, DIVERSIDADE E INCLUSÃO EM EVENTO NO ARQUIVO NACIONAL
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Posses... Homenagens... Literatura... Palestras... Música... Dança... Gastronomia...
A Academia Pan-americana de Letras e Artes (Apala), do Rio de Janeiro, não tem receio de realizar eventos grandes, de mais de seis horas de duração, incluído o momento de confraternização, “temperado” com requintados comes e bebes.
Das 13h às 20h da quinta-feira passada, 7 de dezembro, a Academia, de 42 anos de existência, realizou evento multicultural no grande auditório do Arquivo Nacional, no antigo prédio da Casa da Moeda do Brasil, na Praça da República, no centro do Rio de Janeiro (RJ).
A mesa de trabalhos foi composta por oito membros: o músico, professor e escritor Newton Nazareth, presidente da Apala; a escritora e professora de dança e línguas Regina Brito, vice-presidente; Vodúngán Kelly de Oyá, sacerdotisa candomblecista, diretora de Comunicação; o jornalista Carlos Alberto Rocha, diretor de Jornalismo; Márcio de Jagun, estudioso da cultura ioruba e professor universitário (UERJ), secretário do Conselho Consultivo; Odilon Campinas Filho, assessor político da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, diretor de Divulgação; o jornalista, escritor e administrador Edmilson Sanches, vice-presidente do Conselho Fiscal; e o acadêmico, escritor e empresário Mauro Pereira de Lima e Camara, da Federação das Câmaras de Comércio Exterior. Também presentes Samara Nunes, vice-presidente do Conselho Consultivo, e Jorge Miguel da Silva, o sambista, cantor e compositor Don Jorge Melodia, bacharel em Direito, especialista em Direito Penal Militar e mestre em Direito Civil, presidente do Conselho Consultivo.
Após a composição da Mesa, o “Evento Comemorativo de Fim de Ano” teve início com a solenidade de posse de novos acadêmicos, mulheres e homens de variados segmentos artístico-culturais. A esse ato, seguiram-se as palestras “Inteligência Artificial: Literatura e Escritos Acadêmicos”, com o psicólogo e professor universitário Carlos Eduardo Medawar, e “A Arte de Escrever Uma Boa História Sem o Chat GPT”, com a escritora Samara Nunes, que, na oportunidade, apresentou sua mais recente obra, o romance “A Matilha” (Editora Hibis, São Paulo-SP).
Música, canto e dança
As apresentações de música, canto e dança, sem trocadilho, tocaram a sensibilidade dos espectadores, os quais, por diversas vezes, sequer esperavam o fim de certas peças musicais para aplaudirem – como ocorreu com o oratório “O Senhor da Luz”, uma grande composição musical, poética, vocal e instrumental, inspirada em doutrina religiosa oriental (especificamente, japonesa).
Compositores
Os compositores de “O Senhor da Luz”, Newton Nazareth e Regina Brito, são também, e respectivamente, presidente e vice-presidente da Academia Pan-americana de Letras e Artes. Newton é arquiteto, por formação, e, por confirmação, músico – músico e além: musicólogo. É pianista, tecladista, arranjador, produtor musical, professor, escritor, gestor cultural. E nem se fale do musicalmente sacrossanto sobrenome “Nazareth”, o qual, na música, designa uma famosa banda de rock escocesa e está presente, no Brasil, em pelo menos três antropônimos musicais: o da cantora maranhense Alcione e seu pai, João Carlos Dias Nazareth, também músico, e de uma das maiores referências musicais brasileiras: o compositor e pianista Ernesto Nazareth (1863-1934), de quem, aliás, Newton Nazaret é sobrinho-bisneto e estudioso de sua obra e, como o tio-bisavô importante e famoso, dedicado também à composição, que, no caso de Newton, tem como foco, sobretudo, obras de grande fôlego, entre elas óperas, oratórios e musicais.
Também compositora e codiretora do oratório “O Senhor da Luz”, Regina Brito é escritora, dançarina e professora de Línguas e Literaturas Portuguesa, Brasileira, Espanhola e Hispano-americana, com aperfeiçoamento na Espanha. Casada com Newton Nazareth, com ele mantém produtiva parceria no desenvolvimento tanto de obras musicais quanto literárias. Também dirigiu os números de dança do evento da Apala no dia 7 passado.
Intérpretes
Neste ano de 2023, Marcela Mangabeira completou 25 anos como uma das mais completas cantoras brasileiras, 20 anos de sua mudança para o Rio de Janeiro e a maioridade (18 anos) de lançamento de seu primeiro disco, intitulado “Simples”, inicialmente lançado no Japão. Se abriu os olhos em Recife, terra natal, a virginiana Marcela, musicalmente, abriu a boca foi em Cuiabá (MT), segundo ela, “sua cidade do coração”, onde morou dos 10 aos 21 anos e onde, em 1998, deu início à sua carreira artística. A bela, segura e talentosa mezzo-soprano há muito vem se destacando no circuito: mais ou menos meio milhão de pessoas a ouvem no Spotify, que é apenas um, mas o mais popular em todo o mundo, dos vários serviços de transmissão de conteúdos “on-line”, chamados “streaming”. Com as músicas que (en)canta e os álbuns que grava, ela já ganhou prêmios e já excursionou por diversos países, entre os quais Alemanha, Dinamarca, Espanha, França, País de Gales (Reino Unido)...
Fazendo par com Marcela Mangabeira, está José B. Júnior, ou simplesmente sSimo (assim mesmo, com a dobradinha de “s” minúsculo e maiúsculo). Ele já se assinou “Simô” no conjunto BR6, o pioneiro em cantar e gravar sem instrumentos, utilizando-se tão só da voz como recurso instrumental (“a capella”). No BR6, sSimo e seus outros cinco colegas estiveram pela Europa e Ásia e tiveram o merecido destaque e premiações internacionais para tão complexa e apurada forma de apresentar-se musicalmente.
O tipo de voz de sSimo é o baixo, a mais grave e a mais rara voz masculina. Ele tem habilitação em Música pela Universidade do Rio de Janeiro (UniRio) e é ainda violonista, arranjador, compositor, professor de violão e dublador em filmes da Disney e da DreamWorks. Com tantas virtudes musicais assim, não é de estranhar, portanto, que grandes nomes da música brasileira – Carlos Lyra, Emilio Santiago, Gilson Peranzzetta, Joana, Moraes Moreira e Toquinho, entre outros – tenham tido em seus trabalhos a participação vocal de sSimo.
Dança e improvisos
Stefânio Vieira, de raízes nordestinas, bailarino, ator, modelo, artista circense e professor entregou-se a três momentos em que brilharam sua sólida formação técnica e sua rica experiência no mundo da dança: foi o bailarino solitário que, com hábil manuseio de véus, ora parecia ser uma das imagens que se projetavam no grande telão do auditório do Arquivo Nacional e se movimentavam grácil e holograficamente pelo palco. Stefânio acertou da cabeça aos pés e mãos, com o cabelo amarrado à maneira samurai, as vestes largas que nem um samurai, e os dois véus, que nem espadas de pano, se transformavam, brandidos pelo hábil bailarino, em extensões de braços ajardinando o ar.
Nos outros dois momentos, Stefânio Vieira apresentou-nos sua “partner”, a superadora e súper Bebel Rodrigues, que, mãe, avó, cadeirante e dançarina, soube corresponder às exigências da música e aos passos e passes do parceiro, como também, em algumas situações, Bebel soube se despojar dos calçados e da própria cadeira, para um momento de mais ousadia rítmica de seu corpo e, com educação e estilo, fora da cadeira de rodas, curvando-se com as mesuras de praxe, agradecer ao público que se levantou para aplaudir a “performance” de Bebel e de Stefânio.
O terceiro momento novamente contou om Bebel Rodrigues e Stefânio Vieira, agora livres, leves e fluidos, em momento de dança e música carregado de envolventes improvisos das cordas do guitarrista André Duby e do saxofonista Diego Santos, ambos também membros da Academia Pan-americana. André e Diego souberam “desenhar” com naturalidade seus improvisos, e Stefânio e Bebel souberam (cor)responder, com igual naturalidade, àqueles instantes melodicamente lúdicos e lúcidos, instantes de improvisos e imprevistos domesticados pelos talentos cinestésicos e sonométricos dos quatro artistas domadores de espaços e de sons...
E depois de aplausos e assobios e falas e reconhecimentos, Edmilson Sanches ao microfone (re)cita Carlos Drummond de Andrade, antes que as bocas e as línguas de todos fossem ter outros usos, nas conversas e nos comes e bebes que dali a pouco seriam (com)partilhados na “Cave”, espaço semissubterrâneo do Arquivo Nacional, adaptado à condição de “buffet”. E os versos drummondianos ecoaram já sob o signo de 2024, o ano próximo – próximo, inclusive, da esperança sem comodismo, da continuação sem continuísmo e do servir sem servilismo:
“O último dia do ano
não é o último dia do tempo.
Outros dias virão
e novas coxas e ventres te comunicarão o calor da vida.
(...)
O último dia do tempo
não é o último dia de tudo.
(...)
Recebe com simplicidade este presente do acaso.
Mereceste viver mais um ano.
(...)
Ainda uma vez estás vivo.
e de copo na mão
esperas amanhecer.
(...)
* EDMILSON SANCHES
Fotos:
O evento da Academia Pan-americana, em diversos momentos.